Kim Cattrall: “Emily é bastante feminista para a sua época”

Mistério, romance e… feminismo chegam, este domingo, 14 de julho, às 22 horas, aos ecrãs da FOX Crime. Em Testemunha de Acusação, a atriz Kim Cattrall, 62 anos, coloca-se na pele de uma das muitas ‘vítimas’ de Agatha Christie e dá vida a socialite Emily na minissérie britânica feita originalmente para a estação britânica BBC One. Uma mulher rica que sonha viver um amor excitante, escapando aos dítames da sociedade em que a sua personagem vive.

Uma produção que chega agora a Portugal, mas que trouxe a sempiterna Samantha Jones de O Sexo e a Cidade de volta à sua terra natal, Liverpool, a trabalho e para filmar.

Como descreve a sua personagem Emily French?

É uma mulher muito rica que se casa nova com um homem muito mais velho. A relação entre eles baseava-se mais no carinho do que na paixão, e nesse sentido não é um grande amor. Vejo a Emily como incrivelmente idealista no amor, como muitas mulheres eram naquela época. O mundo em que vivia começou a sufocá-la e ela começa a sonhar um belo romance com alguém muito diferente dela.

“Vejo a Emily como incrivelmente idealista no amor, como muitas mulheres eram naquela época”

Quem são as pessoas que rodeiam Emily?

O advogado do marido dela, Starling (Andrew Havill), cuida das suas questões financeiras e Janet McIntyre (Monica Dolan), a empregada, não só cuida dela como quase se tornam irmãs em alguns aspetos. A relação entre ambas é muito mais complexa, sobretudo quando conhece Leonard Vole (Billy Howle) numa altura em que Emily procura alguém com quem se divertir e com quem possa ter aventuras.

Mas ela está à procura de mais do que apenas um bom momento?

Não, não acho que ela esteja em busca de uma relação. Ela não está interessada em ter uma que corresponda aos dítames definidos pela sociedade. Ela não está interessada em conhecer um homem que seja aborrecido, que não seja sexy ou excitante.

Que tipo de homem é que ela procura quando repara em Vole?

Emily é bastante feminista para a sua época e para a sua idade. Primeiro, sai à noite com a esperança de encontrar parceiros excitantes e novos amigos. Esta história situa-se no rescaldo da Primeira Guerra Mundial, num conflito em que se perdeu uma geração inteira de homens, na qual é difícil encontrar um, e numa altura em que sobram apenas os muito novos ou os muito velhos. Quando ela conhece este jovem lindo e vulnerável, percebe que ele é diferente de todas as pessoas que existem em torno dela, e aí nasce o interesse. Não se trata apenas de uma mulher mais velha em busca de um homem mais novo, é mais do que a sua gratificação. Ela quer uma aventura.

Como olhou para a Inglaterra dos anos 20 do século passado? Viveria confortavelmente nesse período?

Acho que nasci na época certa. Muitas mulheres incríveis chegaram antes de mim e definiram um caminho de liberdade, o que me permite viver a minha vida, fazer com o que o meu voto conte e tenha uma voz. Tenho muita sorte, especialmente na minha idade, por beneficiar das causas pelas quais elas lutaram e através das quais continuam a educar as mulheres jovens. Creio que é o que Sarah Phelps [realizadora desta minissérie emitida na BBC One] diz de forma clara ao relacionar esta história com as mulheres de hoje. Essencialmente, Emily French está a viver a vida dela de acordo com os seus próprios termos, e adoro interpretar mulheres assim. Apesar de tudo o que acontece à personagem nesta história, Sarah inclui elementos de feminismo e de força, mas também de vulnerabilidade.

“Nasci na época certa. Muitas mulheres incríveis chegaram antes de mim e definiram um caminho de liberdade”

Conhecia a obra original?

Estava familiarizada com a obra Testemunha de Acusação por ter participado num workshop de teatro para uma peça em Nova Iorque. Queríamos levá-la para a Broadway, mas os produtores arrependeram-se e retiraram-na no final. Ao mesmo tempo, conhecia o filme original protagonizado por Charles Laughton e Marlene Dietrich, no qual eu fazia o papel de Romaine [que nesta série é desempenhada por Andrea Riseborough] no workshop. No livro, ela era uma mulher um pouco mais velha do que Leonard Vole, era uma alemã que se sentiu muito ostracizada na Grã-Bretanha do pós-Guerra.

Muitas pessoas crescem com as peças e os livros de Agatha Christie. A Kim foi uma delas?

Sempre adorei Agatha Christie e mistérios que giram em torno de crimes. A minha mãe sempre foi uma amante do género e sempre houve Alfred Hitchcook e Agatha Christie em casa. Sempre adorei os grandes filmes da década de 40 do século passado bem como os mestres deste género. Nunca pensei que seria uma das vítimas da Christie!

“Nunca pensei que seria uma das vítimas da Christie!”

Porque é que Agatha é, ainda hoje, uma autora que ressoa globalmente?

Acho que ela escreveu sempre personagens muito complexas e conseguiu estar, como escritora e dramaturga, um passo à frente do seu público. E se se está na dianteira deles, então captou-lhes a atenção. Quando se está sentado ao lado, a pensar ‘quem fez isto e porquê’, então sinto-me envolvida. Gosto de fazer parte quando as pessoas pensam:’oh, é uma daquelas’. Estamos a fazer parte da história ao mesmo tempo que somos fiéis à extraordinária escritora que criou partes terríveis para as mulheres, quando isso não estava tão na moda. Por isso: ‘Boa, Agatha!’

Nem toda a gente conhece as suas ligações ao Reino Unido e, em particular, a Liverpool. Quão foi especial foi regressar a casa e gravar na sua terra natal?

Nasci em Liverpool, mas fui para o Canadá quando ainda era bebé, mas foi maravilhoso voltar e filmar na cidade. Voltei a Liverpool no final dos anos 60 para viver como uma adolescente, e foi um capítulo muito emocionante da minha vida. Então, voltar estes anos depois e trabalhar, pela primeira vez, como atriz na minha cidade natal foi emocionante. Foi bom estar em casa.

Entrevista feita e cedida pela FOX Crime

Imagem de destaque: Divulgação

Kim Cattrall não foi mãe por causa de “O Sexo e a Cidade”