Legislativas: “A vítima não é muito bem tratada nos programas eleitorais”

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Com a violência cada vez mais na ordem do dia, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) olhou para os programas eleitorais das Legislativas, elencou medidas propostas, comparou-as e está a debatê-las com representantes dos partidos políticos que seguem em pré-campanha para o sufrágio de 6 de outubro.

Da violência doméstica e a políticas sobre casas de abrigo aos crimes sexuais ao bullying, passando pelas questões LGBTI, a APAV coloca as forças partidárias frente-a-frente esta tarde de quinta-feira, 12 de setembro, num encontro que decorre na sede da instituição, em Lisboa.

A primeira análise não traz, segundo João Lázaro, presidente da Associação, boas notícias. “A vítima não é muito bem tratada nos programas eleitorais e há, por vezes, algum desconhecimento das próprias dimensões dos crimes“. Para o responsável, “há um grande focar apenas em algum tipo de vítimas, designadamente as vítimas de violência doméstica”, referiu Lázaro.

O presidente da APAV fala em medidas e propostas eleitorais que não têm depois consequências no domínio prático. “Em termos muito gerais, há considerações relativamente à violência e sem haver depois, nos programas eleitorais, consequências e medidas políticas de enfrentamento e apoio a esse diagnóstico”, refere Lázaro, que lamenta que “não se tenha avançado mais” na última legislatura.

Em debate estão representantes dos partidos com assento parlamentar. Miguel Romão, pelo PS, junta-se a Rita Rato, deputada e candidata no círculo eleitoral da Europa do PCP, a Cláudia Madeira, de Os Verdes, e a Sandra Cunha, deputada e segunda candidata pelo círculo de Setúbal pelo Bloco de Esquerda. Ana Conduto apresenta-se pelo PSD, Miguel Arrobas pelo CDS-PP e Inês de Sousa Real, do partido Pessoas-Animais-Natureza.

Vítimas: APAV chumba programa de governo

Numa confirmação de medidas apresentadas e relativas ao Programa de Governo, apresentado em 2015, a APAV faz um balanço negativo como oito propostas por cumprir, quatro parcialmente completadas e uma, apenas uma, realizada: “o aprofundamento da prevenção e do combate à violência de género e doméstica”. De fora e por cumprir, analisa a instituição, ficaram a reforma da Comissão de Proteção às Vítimas de Crimes. a criação de espaços seguros para visitas assistidas e entregas de crianças ou, entre outras, a simplificação da linguagem judicial.

“Acho que a exigência da APAV a nível do que foi feito, foi muito exigente”, reage o socialista Miguel Romão. E destaca: “Na legislatura que agora termina, houve uma proposta submetida à Assembleia da República para alteração do modelo e reforço de proteção de vítimas de crimes, foi aprovada na generalidade por unanimidade, baixou à comissão e não teve depois sequência”, justificou Romão.

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Admite que “há trabalho a fazer do ponto de vista social, do ponto de vista de funcionamento dos serviços públicos, de como deem funcionar”. Há ideias, sim, que são necessárias por em prática. É preciso saber o como.

Justiça, educação, investimento público

Implementar ideias no terreno. Como? “Com mais investimento público”, reage a deputada comunista Rita Rato. Apoios que devem ser aplicado “desde ao Serviço Nacional de Saúde, à escola pública, as equipas multidisciplinares nos tribunais, na Segurança Social, a atribuição do estatuto da vítima, o Estado tem obrigação de proteger as vítimas”, reitera a deputada do PCP, que critica a análise da APAV dos programas eleitorais.

Uma avaliação feita com base na pesquisa de três palavras “vítima/vítimas, crime e violência” nos programas eleitorais e tendo em vista medidas direcionada. “Não se pode aplicar apenas um find nos programas”, responde a deputada do PCP.

“As propostas analisadas estão incompletas”, afirma a bloquista Sandra Cunha, que elenca “medidas que constam do programa como a proteção no trabalho, na saúde, na habitação nos crimes de violência doméstica” ou “as várias propostas na área da Justiça” e que não estão na pesquisa feita pela associação.

É na proteção e na justiça – mesmo as que estão esquecidas pelo Estado como as vítimas de terrorismo – que os sociais democratas concentram propostas. O PSD pede reforço e apoio especializado: “Mais apoio técnico e parcerias entre entidades científicas e tribunais e menos comissões”, afirmou Ana Conduto. A social-democrata pede mais “articulação” entre as várias entidades envolvidas em processos desta natureza, uma “maior celeridade nos crimes de violência doméstica”, uma “definição de um novo protocolo no acesso às casas de abrigo – que “devem ter caráter excecional e temporário”.

Para o CDS, “apesar de haver legislação – e que vai chegando a reboque do que vai acontecendo -, tal não resolve tudo, é preciso que os tribunais sejam céleres, eficazes e tenham uma maior preocupação com a vítima”, diz Miguel Arrobas, vincando que “todos têm direitos iguais, mas muitas vezes os agressores são colocados em liberdade, reincidem e cometem crimes”. A educação surge também como prioridade dos centristas, sendo necessária uma maior “sensibilização e prevenção nas escolas”, com especial atenção na violência no namoro, prevenindo aí “aqueles que podem vir a ser, no futuro, os agressores e violadores”. Pedem combate à “violência contra as mulheres – com números assustadores em crescimento -, sendo também necessário olhar para violência contra os homens”.

Secretaria para a Terceira Idade e quotas para vítimas de violência doméstica

Formação e prevenção do “ensino básico até todas as outras fases da vida”, pede o PAN, que concentra esforços e alarga-os a outras vítimas, pedindo extensão de apoios a, entre outros, para as vítimas de agressão sexual. O partido fala mesmo na criação de “uma secretaria de Estado para a Terceira Idade ou para a Pessoa Idosa”, refere Inês Sousa Real, e olhando para a “exclusão e a solidão”. “Há depois um conjunto de propostas ao nível da violência doméstica”, de “igualdade nas resposta sociais”, do “fim dos esterótipos” e pela criação de reformas quer no sistema de justiça, quer na educação”, elencando “apoio psicológico alargado a profissionais e não apenas para vítimas”. O PAN reclama também a “criação de salas para as vítimas de todos os tipos de crime” nas instituições que lidam diretamente com elas, estando as esquadras – mas não só – no topo desta proposta.

“Valorização das mulheres no mercado de trabalho uma vez que a independência económica é muito importante para a sua emancipação”, reafirma Cláudia Madeira, pelo Os Verdes (PEV). O partido, que na análise da APAV, menos propostas eleitorais direcionadas apresenta, reitera “o estabelecimento de quotas na administração púbica para vítimas de violência doméstica, em que para cada cinco lugares um deles possa ser para uma pessoa nessas circunstâncias”. Medidas a que se juntam a propostas na formação e “avaliação regular” do sistema para “perceber e identificar falhas”.

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