Leonor Beleza: “Sou, sempre fui, também feminista”

Leonor Beleza
Leonor Beleza no terraço do Instituto Champalimaud, a que preside.

Leonor Beleza, antiga governante e agora presidente da Fundação Champalimaud traçou esta sexta-feira, 17 de setembro, ao ser-lhe atribuído o grau de doutor ‘honoris causa’, o percurso de vida, recordou pessoas e fez agradecimentos e concluiu afirmando que é e sempre foi feminista.

Num discurso de mais de meia hora na reitoria da Universidade de Lisboa, que lhe atribuiu o grau, Leonor Beleza deixou os últimos minutos para referir uma causa que, disse, a acompanhou ao longo da vida, a igualdade entre homens e mulheres.

E lembrou a sua entrada para a Faculdade de Direito daquela Universidade, no mesmo dia que o atual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, hoje também presente e que lhe fez o elogio. Lembrou para dizer que na altura eram poucas as mulheres a estudar Direito, e ainda assim ouvindo sugestões de que deviam estar antes na Faculdade de Letras.

Nessa altura as mulheres nem podiam ser magistradas, referiu, para dizer depois que, sendo otimista, reconhece o “enorme percurso que vai entre esses tempos e atualidade”. Mas acrescentou: “O caminho ainda está a ser percorrido. Aqui em Portugal ainda reclamamos pouco que as mulheres partilhem efetivamente o poder”.

Depois, citando um artigo publicado esta semana numa revista, referiu o “efeito civilizador da presença e da influência das mulheres”, disse que a sua ausência “é fonte de pobreza, de atraso, de regimes não democráticos”, e que a presença das mulheres é “muito mais do que o da simples satisfação de direitos”.

Nesta matéria defendeu “uma nova maneira de estar e de partilhar, “mas não tornar indiferente se se nasce homem ou mulher. Não é “interiorizar que somos todos iguais ou que somos todos indiferentemente diferentes”.

“Estamos ainda longe de consumar a aprendizagem da igualdade, do lugar que queremos, que não se baseia numa hierarquia de sexo e não depende dele”, disse, acrescentando: em Portugal já ninguém estranha que uma mulher desempenhe qualquer cargo, mas ainda não somos capazes de clamar quando as mulheres não estão presentes.

Mesmo no final da intervenção disse acreditar que se pode mudar para melhor. “Mas só o faremos se as mulheres estivermos dispostas a partilhar a iniciativa das mudanças. A isto eu chamo feminismo. E sou, sempre fui, também feminista”.

Leonor Beleza já tinha lembrado que aos 30 anos trabalhou em questões de igualdade entre mulheres e homens, um comité especializado do Conselho da Europa, e que foi uma privilegiada porque na sua família a educação superior das mulheres não era discutível sequer. Aliás, lembrou, a bisavó era médica e a mãe jurista.

Mas lembrou também a entrada para a Faculdade há 55 anos, com o seu hoje amigo, e a quem diz muito dever, Marcelo Rebelo de Sousa, a formação que fez dela uma eterna jurista, o trabalho na revisão do Código Civil ou mesmo o programa que fazia na RTP, “É sempre bom saber”, sobre os direitos das mulheres.

Mas também o 25 de Abril, o surgimento do PSD, a ida para o Governo aos 33 anos, com o primeiro-ministro Pinto Balsemão, ser deputada na Assembleia da República, depois de novo o Governo (com o primeiro-ministro Cavaco Silva), na Segurança Social, onde gostou de estar, e na Saúde, que nem tanto, um cargo “difícil” e “duro”, mas sobre o qual ainda hoje é conhecida (ex-ministra da Saúde).

E depois, recordou, a saída da Assembleia da República em 1994 e seis anos depois, a 28 de abril de 2000, o telefonema de António Champalimaud a dizer-lhe que ia criar uma fundação e que a queria como presidente. “A passagem pela Saúde que eu tinha feito para esquecer voltou também em força”, disse.

Os últimos anos foram os da Fundação, hoje com mais de mil colaboradores e que recebe 900 doentes por dia, e os de presidente do Conselho Geral da Universidade de Lisboa.

“A investigação científica é absolutamente fascinante”, referiu, sem esquecer os “profissionais altamente qualificados” da Fundação, sem esquecer também ao longo do discurso outros nomes de pessoas que lhe foram ou são importantes.

Algumas delas hoje presentes na cerimónia, como os antigos Presidentes da República Ramalho Eanes e Cavaco Silva. E na aula magna da Reitoria estiveram muitos outras personalidades também, como o presidente da Assembleia da República, a procuradora-geral da República, os presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal de Contas e a Provedora de Justiça.

E ainda o reitor da Universidade de Lisboa, António Cruz Serra (substituído em breve por Luís Ferreira), que no final da cerimónia disse que este doutoramento de Leonor Beleza foi o único que propôs.