Publicidade Continue a leitura a seguir

Lingerie transgénero. “Foi um grito de liberdade”, diz designer Giovanna Tavares

[Fotografia: DR]

Publicidade Continue a leitura a seguir

A empresária brasileira tinha 14 anos quando se assumiu como mulher transgénero. Oito anos depois chegou a Portugal à procura de melhores condições de vida e de se lançar no empreendedorismo, com o intuito de melhorar a vida de pessoas como ela. Foi essa a razão que a impulsionou a criar a primeira coleção de lingerie trans portuguesa ‘Tlovet’ e a apresentá-la na 60ª edição da ModaLisboa, no Lisboa Social Mitra.

Ao contrário de outros designers, que procuravam mostrar as inovações das suas coleções nos desfiles, o objetivo de Giovanna era que o público não desse conta das peças apresentadas. Uma finalidade que conseguiu atingir com sucesso. Ainda que quem tenha assistido ao evento não tenha percebido, as peças foram usadas em três modelos: Ariel del Arco, Ivvi Romão e Mica, nos desfiles de Nuno Baltazar, Luís Carvalho, Valentim Quaresma, Molly 98 e Çal Pfungst.

Em conversa com o Delas.pt, Giovanna Tavares falou sobre a falta de peças para pessoas trans, do preconceito que ainda é associado à comunidade e da forma como esta coleção representou para si “um grito de liberdade”.

Leia a entrevista abaixo.

Qual foi a sua intenção ao criar um desfile com uma coleção que não fosse detetável?

Não existia nada parecido no mercado. Sempre fomos [mulheres trans] obrigadas a usar peças que não se adequavam ao nosso corpo. Diante desta necessidade pessoal, criei esta primeira coleção portuguesa de lingerie desenhada para o corpo das mulheres transgénero, a pensar na autoestima e na confiança delas. Lançar a coleção no primeiro desfile que não seria visto era o que mais poderia fazer jus ao intuito desta lingerie.

Existe uma imagem deturpada daquilo que é ser trans. O grande objetivo foi que ninguém olhasse para nós [mulheres trans] com preconceito, sabendo que sofremos com o mesmo diariamente. Foi um lançamento que ninguém viu, mas que toda a gente aplaudiu. Acima de tudo, queríamos passar uma mensagem, porque, afinal de contas, somos todas Mulheres. É necessário combater o estigma da marginalidade associado à comunidade trans. A inclusão de todas as pessoas, seja qual for a sua identidade de género, deve ser algo natural e constante.

Uma vez que ninguém percebeu que eram peças desenhadas para pessoas trans, que reações provocou ao revelar a novidade? Considera que conseguiu abrir mentalidades?

Ao revelar a novidade, as pessoas ficaram impactadas, até porque ninguém tinha noção dessa falta ao público transgender. Está a ser um sucesso.

[Fotografia: DR]
[Fotografia: DR]
Em que medida esta lingerie difere das outras em termos de material, modelagem?

A lingerie Tlovet é revestida com o tecido neoprene para ajudar na blindagem do órgão genital. Por ser um tecido isotérmico não mantém a concentração de calor na zona íntima. É feita com um recorte anatómico, que permite maior conforto na parte inferior da peça e com alças reguláveis para ajustar a vários tipos de corpos sem causar desconforto.

Visto que tem sido tendência usar pouca roupa e deixar o corpo mais despido como a tendência das transparências, por exemplo. Em que medida esta lingerie também pode ter esse uso das tendências?

Usar uma roupa transparente para uma pessoa trans não resignada pode ser um grande problema. Mas com a Tlovet ficou mais fácil para as mulheres trans conseguirem usufruir das tendências de moda.

Inspirou-se na Victoria’s Secret para a criação das peças. Por que se inspirou numa marca que, apesar de se ter redimido pelos comentários pejorativos que fez sobre modelos trans, se revelou homofóbica inicialmente?

A Victoria’s Secret sempre foi uma marca que me inspirou, pois fazia-me sonhar em ter aquela lingerie e sentir-me sensual. Depois das falas transfóbicas em relação às modelos trans, fiquei dececionada com a marca, mas despertou em mim uma chama para lutar e mostrar às indústrias de lingerie, que nós, as pessoas trans, temos direito ao nosso espaço e à nossa representatividade. Montar a marca Tlovet foi, para mim, um grito de liberdade.