Matt Preston é uma das imagens de marca de Masterchef Austrália desde que, há onze anos, aceitou o convite do canal australiano Chanel 10 para integrar a equipa de jurados, juntamente com Gary Mehigan e George Calombaris. A longa aventura na TV acabou recentemente, com o trio a assumir que não tinha sido possível chegar a acordo com o canal para a 12.ª temporada de um dos formatos de Masterchef mais famosos do mundo.

Mas os três prometem continuar juntos – e até já criaram uma produtora. Enquanto não se voltam a juntar no pequeno ecrã, aproveitam a pausa para se dedicar a projetos pessoais. No caso de Matt Preston foi a apresentação do seu recente livro Delicioso, Fácil, Rápido, editado pela Leya, que o trouxe a Portugal para dar a conhecer 127 receitas feitas em pouco mais de 30 minutos.

O crítico gastronómico britânico aproveitou a viagem para conhecer o país do sul ao centro, do Algarve a Lisboa, com uma paragem pelo Alentejo, onde se deixou encantar pelas migas e açorda, já depois de se ter apaixonado pelo peixe da costa algarvia. Em entrevista ao Delas.pt, Matt Preston recordou alguns dos momentos memoráveis da sua passagem por Portugal, falou sobre a presença feminina na alta cozinha e ainda sobre o seu guarda-roupa, onde cabem 120 fatos, 400 lenços e 70 pares de botas.

Tem partilhado as suas aventuras pelo Algarve, Alentejo e Lisboa no Instagram. Porque decidiu chegar uma semana antes da apresentação do livro a Portugal?
Acho que sempre que viajamos é muito importante tentar compreender o país. Não poderíamos conversar sobre o linguado, arroz de marisco, o pastel de Tentúgal ou migas se eu tivesse chegado da Australia a dizer que queria comer sardinhas, conhecer o Ronaldo e cantar fado, os três grandes clichés portugueses.

O que o surpreendeu mais sobre Portugal?
Descobri que os portugueses são apaixonados pela comida e as suas origens. Há uns dias, quando estava a sair de Beja, recebi um comentário no Instagram a dizer: “Tem de ir ali, há um aldeia, procure um edifício branco, bata na porta, peça o guisado de coelho”. Isto para mim, enquanto escritor gastronómico e alguém que adora autenticidade, é o céu. Prefiro ter isso do que ver o mesmo café em Lisboa, no Porto, Setúbal, Algarve, Faro. Isso não me diz nada, quero ver comida cozinhada por pessoas que vivem lá. Descobri que se mantém a alma e a herança na cozinha e que a pessoas aqui são muito cool, muito educadas, moderadas.

No seu recente livro Delicioso, Fácil, Rápido dá muitas dicas sobre a melhor forma de fazer compras num supermercado. Quem faz compras de forma mais eficiente, os homens ou as mulheres?
Os homens são muito maus a fazer compras, parecem crianças numa loja de brinquedos. Falo por mim, quero levar isto e aquilo. Da minha experiência, as mulheres são mais práticas, querem comprar e voltar para casa. Mas acho que está a mudar, com cada vez mais homens a cozinhar. Durante esta viagem conheci muitos homens portugueses que são o cozinheiro principal lá em casa. O que acho mais importante, no entanto, é tentarmos todos minimizar o que compramos para reduzir o desperdício. Na Austrália, as pessoas vão ao supermercado três vezes por semana e, não sei como é aqui, mas lá deitamos fora 1/3 da comida que compramos, é uma loucura.

O chef Marco Pierre White (com quem o Matt trabalhou no Masterchef Austrália) deu recentemente uma entrevista polémica, dizendo que as mulheres são muito emocionais na cozinha e não lidam bem com a pressão. Ainda existem muitos estereótipos na alta cozinha?
Vou deixar a Claire Smith do Core (duas estrelas Michelin) responder a isso ou Elena Arzak do Arzak (três Michelin) ou qualquer outra incrível e talentosa chef que está a cozinhar por aí. Acho que não me cabe a mim responder a isso porque acho que estas chefs também não precisam que as defenda. Mas acho que todos sabemos qual é a resposta [sorriso].

Em Portugal temos muitas mulheres na cozinha, mas ainda não muitas chefs.
Sim, essa é uma grande questão. Porque é que não há tantas mulheres na cozinha? Há cada vez mais, como a Dominique Crenn em São Francisco, com três estrelas Michelin, a Elena Arzak, Sophie Pic ou a Ana Roš. O crescimento está em pique. Há uma razão histórica para ainda não existir essa igualdade na cozinha, porque temos atitudes que vêm desde há mais de 200 anos. Há 200 anos era tudo dominado por homens, mas hoje não. Na Austrália temos cada vez mais chefs mulheres a cozinhar e eu acho que as mulheres também se veem de maneira muito diferente agora. Temos muitas a ir para crítica gastronómica e eu, pessoalmente, prefiro trabalhar com mulheres.

O novo livro do crítico gastronómico chegou a Portugal em junho.

Mas tem sido parte de um trio masculino muito famoso, nos últimos 11 anos…
[Risos]. É verdade, 11 anos com os mesmos rapazes. Eu, o Gary e o George somos como um velho casal num moderno casamento de três pessoas. Mas adoramos. Já nos conhecíamos antes do Masterchef Austrália. O Gary e o George trabalhavam juntos, porque o George foi aprendiz do Gary. E eu também já tinha feito crítica dos seus restaurantes. Temos percursos diferentes, idades diferentes, mas concordámos em quase tudo nestes últimos 11 anos do Masterchef, em que provamos cerca de quatro mil pratos. Menos em gnocchi e puré de batata.

Onde é que os levava, se viessem a Portugal?

Se trouxesse o George e o Gary aqui ia trazê-los à Fuzeta. Íamos sentar-nos na beira da estrada, beber cerveja e íamos comer linguado com batatas cozidas e saladas. Ou então íamos a São Brás [de Alportel] e ir ao Luís dos Frangos e comer frango com batatas fritas e piri piri, e depois íamos a Beja, a Setúbal e íamos subindo.

Tem saudades do Masterchef Austrália?
Tenho saudades das pessoas. Quer dizer, não. Falei com o Gary esta manhã. Mas vou sentir falta da crescente família de concorrentes que tínhamos porque sou próximo de muitos e falo com eles regularmente. Vou sentir falta da equipa, mas não vou sentir falta do tempo de gravações. Eram nove meses a gravar o programa, era muito tempo, e isso impedia-me de fazer o que eu adoro, que é viajar, conhecer pessoas, comer e escrever. Esse é a minha paixão. Mas vamos encontrar algo que possamos fazer os três.

O formato australiano foi um dos que teve maior sucesso. Qual era o segredo?
Penso que o facto de gostarmos muito uns dos outros e darmo-nos muito bem. Gozamos uns com os outros e isso é muito confortável. É muito raro acontecer isso com os jurados porque, por vezes, os egos atropelam-se. Mas connosco, não, e as pessoas identificam-se. Se o George e o Gary estivessem aqui agora irias ver que é como na TV, muito autêntico. O importante, para nós, era que os concorrentes tivessem um bom sonho e nós julgávamo-los pelos seus pratos, não por quem eram. Para nós era indiferente se eram bonitos ou não, quais as suas origens, se a audiência os adorava. E esse ADN pode ser transposto para outro projeto.

Vão continuar a trabalhar juntos?

Fundámos uma produtora e já temos cinco ideias. Agora vamos à África do Sul fazer uns live shows para um festival chamado Appetite Fest, uma espécie de festival de música, mas de comida, e quando voltarmos começamos a falar com os nossos contactos para fazermos um programa que possa ser visto por toda a gente em Portugal, na Síria, Índia e Malásia.

Será sempre programa relacionado com comida?
Não me importava de ter algo com moda, mas os rapazes não [risos]. Será sobre comida, claro, é o que nós gostamos os três. Fizemos uma viagem no ano passado a Barcelona, Nápoles, Paris, Copenhaga, Chicago, Lima, só os três. O que fazemos no nosso tempo livre é o que esperamos poder fazer num programa de TV.

Por falar em moda, o Matt é conhecido pelos seus coordenados e os 400 lenços.
Sim, eu tenho 120 fatos, tenho talvez 70 pares de botas em vários tecidos. Tenho 200 T-shirts, 400 lenços. Eu sou viciado em estilo, não em moda. Porque a moda significa ver tendências e usá-las, eu não gosto nada disso, odeio isso. Eu gosto de ditar a moda. Por exemplo, eu e a minha estilista Charmaine De Pasquale queríamos combinar calças às riscas com um blazer monocromático, mas não conseguíamos encontrar um tecido às riscas para as calças. E um dia, eu estava a passar pelo Ikea, e vi na secção de cortinas tecido verde e branco, amarelo e branco, vermelho e branco. Sim, estas calças que trago são feitas com cortinas do Ikea. É brilhante! Tenho um ótimo alfaiate que as faz e pronto, assim ficaram. Nós queremos criar o nosso próprio estilo.

Imagem de destaque: João Silva /Global imagens