Uma lição de decoração por Miguel Raposo

Há 30 anos que Miguel Raposo transforma espaços. Depois de se formar em Design Industrial começou a trabalhar em arquitetura e design de interiores e teve um showroom em Santos. Agora está na Rua de S. Bento, a rua por excelência dos antiquários, onde a presença duma loja aberta de um designer de interiores faz todo o sentido. Na comemoração de uma ano passado sobre a abertura do novo espaço em S. Bento, Miguel Raposo convidou a imprensa para lhe cantar parabéns, e nós fomos.

Há quanto tempo existe o atelier Miguel Raposo & Pura Habilidade?

Foi criado em 2008 fruto da necessidade de agregar vários profissionais na área da arquitetura e do design de interiores e equipamento.

Porque é que mudou de espaço e vieram para aqui?

A vinda para a Rua de São Bento deveu-se ao facto de pretendermos ter uma maior exposição e visibilidade, abandonando o local anterior que era mais resguardado. Neste novo espaço e com uma relação direta com o exterior, estamos mais visíveis de forma a fazer chegar o nosso trabalho a mais pessoas.

É uma loja e um atelier aberto?

Sendo um espaço amplo, conciliamos as áreas de atelier e showroom, criando uma dinâmica de funções que agrada aos clientes.

Como funciona?

Recriamos rotativamente ambientes/propostas que são representativos do nosso conceito e sentido estético. A par do mobiliário desenhado por mim, ao queremos dar destaque, expomos também peças de proveniências e formas de expressão artística distintas. Pintura, escultura, artes decorativas, antiguidades e mobiliário vintage, convivem de forma harmoniosa nos nossos ambientes e de acordo com uma seleção criteriosa, coordenada por mim.

A Rua de São Bento é mesmo uma mais-valia para este seu sector? Porquê?

É por excelência a rua dos melhores antiquários, movimentando um público/cliente (nacionais e estrangeiros) exigente e conhecedor. São estes, que sentido afinidades com o nosso conceito acabam por nos contratar para os seus projetos diversos.

Não tem pena de vender peças únicas e irrecuperáveis, como a secretária da Olaio que está exposta na loja?

As peças únicas e especiais, regra geral, não são adquiridas pelos clientes de uma forma impulsiva. São fruto de um prolongado “enamoramento” no qual acabamos por participar. Desta forma, vou acompanhando o processo até ao momento da decisão da aquisição da peça e acabo por ficar seguro de que a dita peça vai para o dono adequado. É gratificante quando sabemos que alguém valoriza aquilo que elegemos e consideramos especial. No caso da secretária a que se refere, a mesma foi adquirida por um cliente para o qual fizemos o projeto de arquitetura da sua casa. Não podia ir para melhor sítio…

Quando decora para outra pessoa fá-lo como se o fizesse para si? E sendo um dos grandes prazeres da vida, decorar a nossa própria casa, como encara a profissão de decorador?

Não decoro como se o fizesse para mim. Cada projeto é distinto de qualquer outro, pelo facto de que o cliente é único e com necessidades distintas. Vejo cada projeto de acordo com as características e exigências de quem vai viver os espaços. A minha prestação como profissional obriga-me a encarar cada projeto de forma diferente e indo ao encontro das perspetivas do cliente.

O projeto de arquitetura ou design de interiores é uma tarefa de rigor que vai para além da mera conjugação de materiais, cores, texturas, etc. Gosto de fazer uma distinção entre decoração e design de interiores. Enquanto profissional revejo-me no conceito do rigor e do conhecimento técnico que é o que se exige num projeto de design de interiores. Um bom projeto é aquele que resolve um conjunto de questões técnicas, tais como; organização e articulação dos espaços, luminosidade, utilização adequada dos materiais, sustentabilidade, tudo isto em articulação com as questões estéticas.

Tem uma linha sua de gosto que tente passar?

O que mais me preocupa nos meus projetos (sejam de qualquer uma das áreas que intervimos) é a realização de trabalhos cujo conceito e imagem sejam intemporais. Não estou muito ligado às “tendências” que se esgotam rapidamente e produzem ambientes repetidos e massificados e de “receitas” facilmente repetidas.

Dou especial atenção aos pormenores e aos materiais nobres. Procuro uma mescla de objetos representativos de distintas épocas e com grande incidência numa estética focada em diversos períodos do século XX. Valorizo uma paleta de cores que transmitem ambientes repousantes.

Os novos portugueses, como imigrantes ou expats, são uma nova e esperançosa clientela?

O grande investimento estrangeiro e aqueles que escolheram Portugal para viver, são sem dúvida a principal clientela neste momento. As exigências de um novo mercado e a oportunidade de negócio, fez-nos também repensar o conceito do atelier e encarar de uma forma muito positiva o futuro próximo.

Homens e mulheres querem a mesma coisa quando o procuram?

De uma forma geral não existem diferenças no conceito do projeto, tratando-se de um cliente feminino ou masculino. No entanto, é evidente que existem abordagens diferentes para os pormenores e exigências distintas na forma de abordar alguns temas. Quando se trata de um casal homem/mulher acabamos por desempenhar muitas vezes um papel conciliador, tendo em conta essas divergências. Esse é mais um desafio entre outros…

Por João Galvão