Miriam Augusto: O trabalho dela é viajar de mochila às costas

Imagine passar o ano inteiro a viajar e pagarem-lhe para isso. É o que faz Miriam Augusto, de 34 anos. Fundadora da agência The Wanderlust, onde é também guia de viagens, passa o ano a organizar e a viajar pelos quatro cantos do mundo, dando a conhecer os mais diversos lugares a quem se aventura com ela nas viagens de mochila às costas.

Uma breve conversa chegou para percebermos que ‘aventura’ é mesmo a palavra certa para descrever a rotina de Miriam, até porque foi este projeto, com início em 2012, que a levou a deixar de lado uma licenciatura em química e um mestrado em medicina legal. Atualmente, faz cerca de cinco a seis viagens por ano em trabalho, e garante que o facto de ser mulher não coloca em risco o sentimento de segurança de quem a acompanha em viagem. Revelou ainda aos Delas.pt os cuidados a ter na organização e planeamento de viagens, sobretudo quando existem outras pessoas a seu cargo, e o que não pode mesmo faltar na mala de um verdadeiro viajante.

Ao seu lado, na The Wanderlust, Miriam tem mais quatro mulheres e quatro homens, todos eles trabalham como guias de viagens, tendo como objetivo descobrir, explorar e viver o mundo juntamente com aqueles que os acompanham. Prepare-se porque parte da viagem começa agora.

Miriam Augusto na Indonénia [Fotografia: DR]

Supomos que seja uma apaixonada por viagens, mas alguma vez pensou fazer disso vida? Como chegou a fundadora da agência The Wanderlust, organizadora e guia de viagens?

Sempre viajei, desde garota, e quando comecei a viajar com amigos fui sempre eu a organizar as viagens. Formei-me em química, depois tirei mestrado em medicina legal e tive ali um período de tempo à procura de trabalho, altura em que também estava a tentar seguir para doutoramento. As coisas não se estavam a proporcionar e surgiu a sugestão de um colega: começar a viajar. Ele sabia que eu costumava viajar, que preparava tudo quando ia acompanhada pelos meus amigos, mas nunca tinha feito nada a nível profissional que estivesse ligado a viagens, nem sequer me formei na área de turismo. No início fiquei assim um bocadinho de pé atrás, a pensar até que ponto é que isto poderia resultar por causa do meu estilo de viagem, que é sempre de mochila às costas. Mas decidi testar o conceito, correu bem e a partir daí avancei mesmo para a criação da agência. Foi assim que acabei por vir aqui parar, um bocadinho por fechar portas e abrir janelas.

São viagens, como disse, de mochila às costas, é essa a grande diferença das viagens na The Wanderlust?

Este conceito é o de ir de mochila às costas sim, é ter um contacto mais próximo com a população local e com o próprio destino em si. São viagens de aventura, como lhe chamamos. É um conceito um bocado diferente daquele que se tem de viagens convencionais, de excursões. Aqui também os grupos são mais pequenos, não são de 20 ou 30 pessoas.

Normalmente são grupos de quantas pessoas?

Tentamos que o grupo não seja muito grande, para não criar sub-grupos e existir uma dinâmica boa entre todos os viajantes, além disso permite-nos fazer com que toda a gente possa ter uma atenção especial. Então as nossas viagens funcionam sempre entre cinco a onze pessoas ou quatro a nove. No caso da viagem a Bali é entre cinco a oito, porque como temos a vertente do yoga e meditação precisamos dar uma atenção mais especial a todos, daí termos reduzido um bocadinho o grupo.

“Viajo muito sozinha, e quando é assim tento ter algum cuidado na escolha do destino e ver até que ponto é viável para uma mulher andar lá ou não sozinha”

A viagem a Bali é a próxima que a Miriam vai fazer pela The Wanderlust. Está planeada para o final do ano, com partida a 23 de dezembro e a chegada a 2 de janeiro. Porquê ir fazer a Passagem de Ano na Indonésia?

A Indonésia é um dos meus países preferidos e onde passo bastante tempo. Essa viagem surge num conceito um bocadinho diferente daquilo que fazemos, porque decidimos juntar a vertente yoga, que nas nossas outras viagens não existe. Bali é uma ilha muito espiritual, com uma energia e vibração muito boas. Achámos que era o sítio ideal para juntar então o yoga e essa parte da meditação, porque de facto lá as pessoas ficam envolvidas numa energia muito positiva e numa transição de ano achámos que isso era pertinente, deixar para traz tudo aquilo que for menos bom e entrar de ânimo leve e de coração cheio. Daí termos escolhido a viagem a Bali nesta época e, eventualmente, se correr tudo bem, depois continuaremos a fazê-la. Além disso, Bali é uma ilha que conheço relativamente bem e onde me sinto extremamente à vontade, daí também ter planeado a viagem em dois dias, foi super rápido!

E quando as viagens são num país onde nunca esteve? De que forma é que se prepara?

Tento sempre ver o que é que o país tem para oferecer dentro daquilo de que gosto, como atividades ao ar livre, ver o que é que há para visitar… E depois traço uma rota de modo a poupar tempo e dinheiro. Isto acaba por ser importante, porque numa das últimas viagens que fiz (passei um mês na Malásia) não fui com nada planeado, só sabia que ia aterrar em Kuala Lumpur e que tinha alojamento lá, mas depois andei ali um bocadinho às voltas, o que fez com que gastasse mais dinheiro do que era suposto e andasse um bocado desorientada. Por isso, é sempre bom vermos primeiro o que é que existe, o que é que queremos fazer e de que forma o queremos fazer. Tento sempre andar de transportes públicos, adoro viajar de comboio e sempre que for possível viajo de comboio, senão vejo que alternativas é que existem e quais são as infraestruturas que o país me oferece. Também viajo muito sozinha, e quando assim é tento ter algum cuidado na escolha do destino e ver até que ponto é viável para uma mulher andar lá ou não sozinha.

Quem é que procura mais a The Wanderlust? Mulheres ou homens?

Acaba por ser um bocado meio meio, mas sem dúvida alguma que as mulheres procuram mais este estilo de viagem em grupo, porque muitas vezes não se sentem confortáveis para ir sozinhas. Sentem-se mais seguras estando inseridas num grupo. Atualmente, os números indicam que 62% dos viajantes são mulheres, ou seja, os restantes 38% são homens.

A Miriam sente que o fator segurança é importante?

Sim, não só no terreno, como no planeamento em si. O facto de às vezes os viajantes não conhecerem o país e de não terem muita noção de como é que as coisas funcionam lá também os deixa um pouco de pé atrás. Daí preferirem ir com alguém que já conhece e que se sente bastante à vontade no terreno.

“Não acham muita piada ter ali uma mulher a fazer de patroa e a dar ordens, mas consigo resolver tudo tranquilamente”

E de que forma a Miriam contorna tudo isso?

Temos que ter muita atenção aos pormenores, seja o tipo de roupa a levar, o tipo de materiais, como uma lanterna, ou o próprio papel higiénico, porque pode não existir no país. Esses aspetos são muito importantes e por isso fazemos o ‘Manual do Viajante’ e enviamos a todos nos nossos viajantes, com informações desse género. Incluímos também sugestões relativamente à saúde, como as vacinas, como é que devem fazer com o dinheiro, até mesmo comportamentos culturais que aqui podem ser muito bem vistos e nos outros países não serem assim tão bem aceites. Nós tentamos passar todas essas informações ao máximo antes da viagem.

Estando a Miriam habituada a viajar, o que é que é se torna mais difícil quando está a organizar uma viagem, ainda para mais com outras pessoas?

Bem, aquilo que começa a ser extremamente difícil é que há coisas que, para nós, já são intuitivas e, por essa razão, por vezes esquecemo-nos de passar informação a quem se vai juntar a nós numa viagem. Mas por isso é que também temos o ‘Manual do Viajante’. No planeamento da viagem em si, o mais complicado é jogar com vários fatores: perceber horários de transportes, horários de sítios que queremos visitar e tentar fazer com que aquilo tudo bata certo, evitando que haja dias aborrecidos para os viajantes. Essa é a parte mais complicada.

E o facto de o grupo ter como guia uma mulher, neste caso a Miriam como líder, nunca levantou problemas? Nunca passou por episódios desagradáveis por causa disso?

Não, nunca senti isso, pelo menos por parte dos viajantes que vão comigo. Às vezes o que sinto é… por exemplo, a Indonésia é um país maioritariamente muçulmano, ainda que Bali seja Hindu, mas nas outras ilhas tenho que lidar diretamente com eles, porque sou eu que estabeleço as parcerias, sou eu que digo que tipo de serviços é que quero e quando tenho que me impor, aquilo não corre muito bem. Não acham muita piada ter ali uma mulher a fazer de patroa e a dar ordens, mas consigo resolver tudo tranquilamente. Agora, por parte dos participantes, de quem vai de viagem, isso não, nunca senti nada, muito pelo contrário.

“Já tivemos alguns viajantes acima dos 60 anos, entre os 60 e os 70 anos”

Que idades têm normalmente os seus viajantes?

Há uma média de viajantes entre os 35 e os 40 anos. No entanto, temos outros grupos bastante novos. Por exemplo, a última viagem que fiz foi para Marrocos e a viajante mais nova tinha 22 anos. Às vezes acontece termos grupos nesta faixa etária, entre os 20 e os 30 anos. São jovens que já estão a terminar os cursos, alguns já estão a estagiar ou a trabalhar e começam a receber ordenados e a ter algum poder de compra. Normalmente, são pessoas que estão empregadas, que têm um bom salário e que adoram viajar neste conceito, mas não têm disponibilidade para tirar um mês ou dois de férias. Então procuram este tipo de agências que já fez todo o planeamento por eles e sabem que, à partida, voltam para casa com uma boa experiência e boas memórias.

Lembra-se da pessoa com mais idade que já viajou consigo?

Já tivemos alguns viajantes acima dos 60 anos, entre os 60 e os 70 anos. Mas as pessoas com mais idade foram um homem com 72 anos e uma mulher com 70. As pessoas que têm mais idade e que nos procuram são extremamente ativas, fazem as suas caminhadas todos os dias e gostam deste estilo de viagem, portanto, já sabem para o que é que vêm.

Além das viagens organizadas, nas quais as pessoas se podem inscrever, é possível pedir um planeamento específico para uma viagem que se queira fazer?

Sim. Ainda agora tivemos uma situação de um grupo que queria viajar para a Indonésia, mas que o percurso não é o que nós vendemos a público e eu acabei por fazer o itinerário todo. Se for um destino que nós conhecemos bem e se houver um grupo de pessoas que queira um itinerário personalizado, nós fazemos. É uma questão de entrarem em contacto connosco e dizerem aquilo que pretendem.

“Podem roubar-me tudo menos o passaporte… e a câmara fotográfica!”

Por fim, sendo a Miriam uma autêntica viajante, o que é que considera imprescindível numa mala de viagem, independentemente do sítio para onde vá?

Sempre passaporte, não pode mesmo falhar. Podem roubar-me tudo menos o passaporte… e a câmara fotográfica! Adoro fotografar e já fiz algumas viagens sem câmara, porque infelizmente avariou. É extremamente frustrante para mim. Não sou propriamente aquela pessoa que vê tudo por trás da lente, gosto muito de viver ao máximo e, normalmente, quando estou extremamente envolvida naquilo que se está a passar à minha volta nem tiro fotografias nenhumas. Mas é daquelas coisas que tenho sempre lá comigo.

Percorra a galeria de imagens acima e fique a par de dicas essenciais para viajar em segurança, mesmo que sozinha.

[Fotografia de destaque: DR]

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