Missouri proibe aborto em violação e incesto uma hora depois do fim de Roe v. Wade

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Manifestantes pró-aborto em Atlanta, Georgia, durante um protesto de emergência após ter sido conhecido o documento do Supremo Tribunal norte-americano que quer proibir este direito [Fotografia: Erik S. Lesser/EPA]

O Supremo Tribunal acaba de retroceder na lei federal que permitia o direito constitucional ao aborto, deitando por terra uma conquista definida há quase meio século e que ficou conhecido como Roe v. Wade.

Esta reversão coloca a possibilidade de que cada estado norte-americano poder individualmente proibir o aborto, removendo-lhe a força constitucional que mantinha desde 1973. Até ao momento, há 26 estados, cerca de metade dos EUA, que podem anular o direito ao aborto das mulheres.

Aliás, cerca de uma hora depois, o Missouri tomava a dianteira uma mais radicais restrições. Segundo o diploma, quem fizer um aborto incorre num crime de classe B com penas de prisão de cinco a 15 anos. Quem fizer interrupções de gravidez também incorre em penas pesadas e que passam por ver as licenças médicas suspensas ou revogadas.

A lei estadual que estava à espera desta revogação federal – e que tem motivado protestos de celebridades, políticos e anónimos – não exclui gravidezes fruto de violação ou incesto. Ou seja, as raparigas e mulheres que tenham engravidado nestas circunstâncias passam a ser obrigadas a ter os seus filhos. Excetuam-se apenas as emergências médicas que ponham em risco a vida da gestante ou “criem um sério risco de comprometimento físico substancial e irreversível de uma função corporal importante da gestante”.

Esta decisão de reversão de Roe v. Wade, que mexe com o direito ao aborto até nos estados cuja possibilidade não está sob ameaça, vai tocar em matérias como a contraceção, irá afetar milhões de norte-americanas e com efeitos ainda hoje imprevisíveis e incalculáveis num futuro a breve trecho.

O presidente dos Estados Unidos da América Joe Biden veio criticar frontalmente este “recuo de 150 anos” na história do país e deixou bem claro que a vai lutar para reverter esta situação. Deixou dois apelos e duas recomendações: uma às mulheres que queiram abortar mas que estão impedidas pelas leis dos seus estados e outra às autoridades de saúde.

Ainda esta manhã de sexta-feira, 24 de junho, e na antecâmara de uma eventual decisão neste sentido que agora se confirma, o The Wall Street Journal noticiava que as clínicas de fertilidade e utentes – também elas afetadas por esta reversão – estavam a mudar embriões para estados mais liberais e como medida de contingência caso a reversão acontecesse.

O que tinha sido um rascunho de uma primeira deliberação polémica e que foi revelada pela imprensa acaba agora, apesar dos protestos nas últimas semanas, a ganhar força de lei, com seis votos contra três, e num documento com mais de 200 páginas (que pode ser lido no original aqui).