Morreu a escritora portuguesa Agustina Bessa-Luís. A notícia foi avançada à TSF, pela biografa (não-autorizada) da autora de ‘A Sibila’, Isabel Rio Novo, e entretanto confirmada, à Agência Lusa, por fonte familiar da escritora.
Agustina Bessa-Luís morreu esta segunda-feira, no Porto, aos 96 anos. O corpo da escritora “ficará em câmara ardente na Sé Catedral do Porto a partir das 10h30 de terça-feira, dia 4, onde às 16 horas serão celebradas Exéquias Solenes, presididas pelo Senhor Dom Manuel Linda, Bispo do Porto”, refere a informação colocada no site do Círculo Literário Agustina Bessa-Luís.
A mesma página na Internet acrescenta que, após a cerimónia religiosa, o corpo seguirá para o Cemitério do Peso da Régua, onde será sepultado, numa cerimónia reservada à família.
Agustina Bessa-Luís, nome literário de Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa, nasceu em Vila Meã, Amarante, a 15 de outubro de 1922. É considerada uma das maiores escritoras portuguesas, tendo-se notabilizado, sobretudo, pelos romances, como ‘A Sibila’, ‘Fanny Owen’, ‘Vale Abraão’ ou ‘A Corte do Norte’, entre muitos outros, que lhe valeram vários prémios literários.
Exemplo disso são os prémios Delfim Guimarães e Eça de Queiroz, atribuídos ao romance ‘A Sibila‘, com o qual a escritora alcançou a projeção literária, em 1954, quando da sua publicação. A essas distinções soma-se uma extensa lista de galardões que inclui o Grande Prémio de Romance e Novela, da Associação Portuguesa de Escritores, em 1983, pela obra ‘Os Meninos de Ouro’, prémio que voltou a receber em 2001, com ‘O Princípio da Incerteza I – Joia de Família’.
A escritora foi ainda distinguida pela totalidade da sua obra com o Prémio Adelaide Ristori, do Centro Cultural Italiano de Roma, em 1975, e com o Prémio Eduardo Lourenço, em 2015. Foi Prémio Camões em 2004.
Sobre Agustina, o ensaísta Eduardo Lourenço afirmou que é “incomparável” e é a “grande senhora das letras portuguesas”, em declarações à Lusa, no final da cerimónia da entrega do Prémio Eduardo Lourenço à autora, há pouco mais de três anos.
Uma obra “única” e “extraordinária”
A escritora Isabel Rio-Novo, autora da biografia de Agustina Bessa-Luís, intitulada ‘O Poço e a Estrada’ (Contraponto), considera que a “obra extraordinária” da autora “não morre hoje” e “continuará a ser lida e apreciada seguramente daqui por cem ou duzentos anos”.
“Enquanto leitora, enquanto biógrafa e pessoa que ainda teve o privilégio de poder conhecer pessoalmente sinto-me profundamente grata por uma obra extraordinária que não morre hoje”, disse Isabel Rio-Novo à agência Lusa.
A escritora, que publicou em janeiro a biografia da escritora recorda uma obra difícil de qualificar,”extremamente prolífica, de uma forma de escrita e de uma forma de compreensão e de indagação da natureza humana absolutamente única no contexto da literatura portuguesa e mundial”.
Isabel Rio-Novo disse ter conhecido pessoalmente Agustina Bessa-Luís, que se encontrava afastada da vida pública, por razões de saúde, há vários anos, no contexto de projetos de investigação. Desse encontro, recorda “toda a sua inteligência, o seu humor, a sua graça, cuja gargalhada cristalina era verdadeiramente contagiante”.
Os elogios à obra de Agustina estendem-se a todos os quadrantes, em especial o político, meio onde a escritora se relacionava, ocasionalmente. Para o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, Agustina Bessa-Luís evidenciou-se “como criadora, como cidadã, como retrato da força telúrica de um povo e da profunda ligação” entre as raízes dos portugueses e “os tempos presentes e vindouros”.
Na nota, publicada no site da Presidência da República Marcelo Rebelo de Sousa “curva-se perante o seu génio”.
Graça Fonseca, ministra da Cultura, salientou, em nota de imprensa, a importância da “autora de uma obra tantas vezes virada para o passado mas sempre contemporânea, sempre presente” e que inaugurou “um novo espaço ficcional, à imagem de outras grandes mulheres e que, em conjunto com ela, revolucionaram radicalmente a prosa em português, como Maria Velho da Costa ou Maria Gabriel Llansol”, afirmou a ministra da Cultura.
Lídia Jorge afirmou, em declarações à Lusa, que “Agustina Bessa-Luís deixa, do ponto de vista da ficção, uma das obras mais importantes do século XX, e, como escritora, sem dúvida alguma, a mais importante”.
A escritora, que lançou recentemente o seu primeiro livro de poesia, notou que, apesar de Agustina nunca se ter assumido como feminista, colocava-se “na perspetiva das mulheres de uma forma única, defendendo essa perspetiva”. “Mas não defende as mulheres como vítimas. Ela defende as mulheres como vencedoras, como lutadoras, como figuras de ação. Muita gente diz que a escrita dela é viril, mas não é viril, é forte, é voluntariosa, é diferente, é uma escrita em que as figuras femininas são voluntariosas, como ela própria era.”
Obra reeditada pela Relógio d’ Água
Em 2017, a editora Relógio d’ Água anunciou a aquisição dos direitos de publicação da obra completa da autora e a intenção de a reeditar, aos poucos. Essas reedições, juntaram aos textos originais, de alguns dos seus mais famosos romances, prefácios assinados por destacadas figuras da cena literária contemporânea, como de António Lobo Antunes a Gonçalo M. Tavares, Hélia Correia ou Bruno Vieira Amaral.
“Ao longo dos próximos anos serão publicados os seus romances, peças de teatro, contos infantis e ensaios biográficos, muitos deles esgotados ou fora do alcance dos leitores”, escrevia, em 2017, a editora na sua página do Facebook.
Entretanto, a editora Contraponto, responsável pela publicação da biografia sobre Agustina, ‘O Poço e a Estrada’, realiza nos próximos dias 8 e 9 de junho, pelas 19h30, na Feira do Livro de Lisboa, uma conversa com Isabel Rio Novo, a autora do livro, sob o lema: “uma mulher controversa, uma vida extraordinária, uma obra genial”