O estudo, que analisou dados relativos aos cancros de esófago, estômago, colorretal, pâncreas, laringe, pulmão, mama feminina, próstata, bexiga e leucemia, indica “a existência de zonas de risco para alguns tumores em regiões dos dois países”.
O Atlas da Mortalidade por Cancro em Portugal e Espanha 2003-2012, realizado pelo português Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) e pelo espanhol Instituto de Saúde Carlos III, fixa manchas geográficas que revelam se a mortalidade causada por um certo cancro é superior ou inferior ao esperado em cada concelho da Península Ibérica.
Em declarações à Lusa, Carlos Dias, coordenador do Departamento de Epidemiologia do INSA e um dos autores do estudo, assinalou que “o Atlas não se foca diretamente sobre os fatores de risco”, mas olha “para a mortalidade por cancro em Portugal e Espanha ao nível dos municípios”, para “calcular se, comparativamente ao que seria de esperar, a mortalidade num determinado município está acima ou abaixo”. Isso permite “lançar hipóteses sobre os fatores de risco que poderão estar subjacentes” à distribuição observada, realça o especialista.
Exclusivamente nas mulheres, o cancro da mama é o de maior incidência em Portugal e o que mais novos casos registou em Espanha em 2018. Em ambos os países, é o segundo cancro mais mortal para as mulheres.
Por exemplo, há uma mortalidade acima do esperado por cancro do esófago no Norte de Portugal e Espanha, enquanto nas regiões Sul isso se verifica para o cancro da laringe. Em ambos os casos, o Atlas permite dizer que “essa diferença se reflete tanto em Portugal como Espanha, não respeita fronteiras”, evidenciando “fatores que são comuns”, assinalou Carlos Dias.
Cancro da laringe mais incidente os homens em ambos países
Outro exemplo: há uma mortalidade do cancro da laringe superior ao esperado nos homens – mas não nas mulheres – no Sul da Península, o que indicia “um papel para a exposição ao fumo do tabaco e ao consumo de álcool, que se verifica tanto em Portugal como em Espanha, que são dois conhecidos fatores de risco”, adiantou.
Outros cancros exibem padrões diferentes. Por exemplo, a mortalidade por cancro de estômago “é muito superior ao esperado em Portugal do que na generalidade de Espanha”, o que abre caminho a outros fatores, “de comportamento, estilos de vida, acesso aos cuidados de saúde, que são diferentes” nos dois países.
O importante é que, observadas as “manchas” do risco de morte por cancro na Península Ibérica, se abrem “pistas para investigação” futura, disse o coordenador do Departamento de Epidemiologia do INSA.
Segundo o estudo, o cancro mais mortífero em ambos os países é o do pulmão, com incidência e mortalidade superiores nos homens. Porém, enquanto em Espanha se verifica uma tendência de diminuição nos homens e uma subida nas mulheres, em Portugal a tendência de aumento persiste em ambos os sexos desde 2001.
Tendo por referência o ano de 2018, e ambos os sexos no seu conjunto, o cancro colorretal foi o mais diagnosticado tanto em Portugal como em Espanha – e o segundo mais mortal (mais nos homens do que nas mulheres). Se tivermos por referência apenas os homens, então o cancro da próstata foi o mais diagnosticado em ambos os países – e o terceiro mais mortal.
A publicação deste estudo sofreu algum atraso, em parte devido à pandemia de covid-19, que mobilizou “quase totalmente” as equipas de investigação nos dois países, disse Carlos Dias, adiantando que a necessidade de ajustar metodologias e homogeneizar dados explicam o intervalo 2003-2012.
Os dados de mortalidade específicos por causa são muito mais demorados do que os da mortalidade geral, acrescentou Carlos Dias, sublinhando que “os padrões de distribuição [do cancro] não se alteram de um ano para o outro” e, portanto, “não perdem atualidade num espaço de cinco, dez anos”, porque a doença revela “uma relativa tendência”.