O #metoo das jornalistas

Nós, as (e os) jornalistas, estamos constantemente, e bem, a expor e denunciar discriminações e desigualdades noutras profissões e noutros setores de atividade, mas raramente olhamos para dentro ou arriscamos a autocrítica sobre as condições e as pressões com que exercemos o direito-dever de informar.

Estudos não faltam. Quer sobre a presença de mulheres na comunicação social – nomeadamente sobre a ausência delas dos cargos de decisão e chefia -, quer sobre as representações estereotipadas que os meios reproduzem, poucas vezes questionando, das mulheres e do papel que a sociedade lhes atribui. Mesmo no que respeita ao princípio básico do trabalho igual, salários igual não é cumprido em, arriscaria dizer, nenhum órgão de comunicação social português.

O feminismo – que não é contra ninguém, mas a favor de uma sociedade mais justa, equilibrada e humanista – é necessário para fazer do mundo um sítio melhor

No dia em que tomo posse para mais um mandato de três anos à frente da Direção – paritária – do Sindicato dos Jornalistas e na véspera do Dia Internacional da Mulher, escolhi trazer-vos um bom exemplo da vizinha Espanha, que convocou uma greve geral feminista para 8 de março. Cerca de cinco mil jornalistas (Las Periodistas Paramos / #wethewomenjournalistsstop) associaram-se à greve, alegando que, enquanto trabalhadoras, sofrem o mesmo “sexismo” presente noutros setores (“precariedade, insegurança laboral, obstáculos no acesso aos cargos de decisão, assédio sexual e menosprezo profissional”).

Nós, as (e os) jornalistas temos o poder de decidir que temas tratamos e quem ouvimos. Portanto, há que denunciar a masculinização dos espaços informativos, afirmando que “há mulheres jornalistas em número suficiente e especialistas mulheres que podem garantir equilíbrio nesses espaços.

Concordo com as jornalistas espanholas que se associaram à greve quando argumentam que “o feminismo é também necessário para melhorar o jornalismo”. Na verdade, o feminismo – que não é contra ninguém, mas a favor de uma sociedade mais justa, equilibrada e humanista – é necessário para fazer do mundo um sítio melhor.

Para que essa utopia se concretize, as (e os – regra invertida, não é desagradável que sejam sempre uma referência entre parênteses?) jornalistas precisam de ser capazes de ver e ouvir, para contar.

É tempo de nós, mulheres jornalistas, sairmos do armário e dizermos #metoo. Quem não tiver uma história de desigualdade, quando não de discriminação, que pense outra vez. Reconhecer isso não fará de nós mais fracas, apenas nos tornará mais próximas de todas as outras mulheres, dando força a um coletivo há tempo demais oprimido. Fará de nós humanas, como as outras. Só aí seremos capazes de compreender o alcance de um #metoo.


Sofia Branco, Presidente do Sindicato dos Jornalistas