Os dados existentes dizem-nos que poucas mulheres poderão ter a possibilidade de produzir ejaculação feminina durante o orgasmo, mas este fenómeno parece ser algo que alguns procuram e que uma cultura cada vez mais sexualizada até promove: a obtenção máxima do prazer, em todas as vertentes possíveis e imaginárias.
Este tema, leva-nos para uma questão muito importante: o que é o orgasmo? Como diferenciamos o vaginal e o clitoriano? A ejaculação é um terceiro tipo de orgasmo? O professor Nuno Monteiro Pereira responde: “Não há orgasmos vaginais, portanto não há essa diferenciação. O dito orgasmo vaginal é sempre, sempre clitoriano, a ideia de que existe um vaginal é um mito. É um mito ainda por cima com uma terrível transmissão feita por Freud – o primeiro a escrever sobre o assunto, a ponto de ser divulgado e citado – que em 1932 chegou mesmo a dizer que há dois tipos de mulher, as que têm orgasmo clitoriano e as que têm orgasmo vaginal. Distinguiu-as completamente, criando um estigma terrível. As mulheres com orgasmo vaginal seriam as adultas, em termos de desenvolvimento psicossexual. E as do orgasmo clitoriano seriam as ainda não totalmente desenvolvidas, com um orgasmo mais do tipo infantil.”
O resultado dessa diferenciação não foi muito bom para as mulheres: de alguma forma via-se justificada a obrigatoriedade da penetração num ato sexual e, ao mesmo tempo, menosprezavam-se aquelas mulheres que para atingir o clímax preferiam a manipulação externa, por exemplo. O médico reforça:
“Todos os orgasmos são clitorianos, mesmo havendo uma penetração vaginal.”
A razão que fez Freud e muitos outros homens e mulheres acreditarem na distinção de orgasmos é evidente para o especialista português: “Ao contrário do que se julgava, sendo um pequenino órgão, é-o apenas na porção visível, porque a chamada raiz do clítoris é bastante extensa. E quando a penetração vaginal acontece, está a estimular um dos lados da raiz do clítoris. Entre uma das raízes e a outra há uma estrutura que recobre toda a parece da vagina, que é o que permite que algumas mulheres tenham orgasmo quando esta parede está a ser estimulada – mas na verdade é esta que estimula o clitoris. Portanto, todos os orgasmos são clitorianos, uns por estimulação direta, outros com base na estimulação das raízes do clitoris, portanto não há, em rigor, orgasmos vaginais. Embora alguns sejam por ação por via vaginal, mas não deixam de ser clitorianos.”
E quando existe ejaculação feminina: é isso um outro de orgasmo? “É no fundo uma característica que raras mulheres têm, a maior parte das quais é em tão pequena quantidade que não se apercebe que é diferente de outras mulheres. Há mulheres que têm pequenas ejaculações que nem sequer as valorizam porque sempre a sentiram e acham que faz parte do seu ser,” acrescenta o especialista em sexualidade.
Longe de ser um tabu junto dos médicos, haverá um desconhecimento, muitos ainda não ouviram falar desta ejaculação feminina. “Os ginecologistas têm obrigação de saber o que é, mas um médico de clínica geral provavelmente não. Este assunto não é estudado nas faculdades…” refere a propósito o professor. Será importante falar do tema para elucidar, desmistificar e sobretudo para que a mulher a quem acontece perca o estigma, não dramatize e o encare como uma característica fisiológica individual, como ter o cabelo louro ou castanho. E para que aprenda a lidar com ela, tirando o melhor partido. E, já agora, para que a mulher que ainda não percebeu se tem, possa conhecer-se.
“O orgasmo é cerebral”
“O orgasmo não é um processo vascular, mas sim cerebral e neuromuscular”, pode detalhar esta sua ideia apresentada em aula… “A origem do orgasmo é sempre cerebral.” No homem e na mulher? “Sim, no homem e na mulher. No homem existe o orgasmo e a ejaculação. São mecanismos que se sucedem, um ao outro, a ejaculação imediatamente após o orgasmo, do tipo reflexa. No caso da mulher não falamos de ejaculação porque é outro mecanismo diferente. Portanto, no orgasmo em si, homens e mulheres têm o mesmo mecanismo, é sempre de origem cerebral: é preciso haver excitação alguns tipos de estimulação, para que haja uma resposta que depois é transmitida via nervosa, com resposta muscular de contração e espasmos e, eventualmente, uma ejaculação no homem, e o caso da mulher uma reação que melhora toda a capacidade vascular da vagina. A origem é sempre cerebral, mas a resposta neuromuscular.”
O processo de excitação feminino e masculino é diferente? Estudos com ressonâncias magnéticas apontam para uma atividade neurológica semelhante entre homem e mulher, que durante o orgasmo é muito intensa. A libertação de dopamina é também comum a ambos os géneros. Pode descrever um pouco cada um, salientando o que os diferencia?
“Nas mulheres só há o mecanismo do orgasmo. Nos homens há o orgasmo com mesma origem cerebral que depois desencadeia o reflexo da medula que depois desencadeia a ejaculação – esta tem origem medular, da medula espinal. O sistema nervoso central é dividido por cérebro, cerebelo, tronco encefálico e medula espinal. São as quatro estruturas do sistema nervoso central. (Depois o periférico são os membros). Isto é um mecanismo que começa no cérebro, mas o que determina a ejaculação no caso dos homens é a medula espinal. A medula obedece e ordens e se receber uma ordem do cérebro, cumpre. A ejaculação é um mecanismo medular, do sistema nervoso central, mas medular. A mulher não tem isto, este mecanismo. É só cerebral. E porquê? Porque o orgasmo dá o prazer e a satisfação sexual – o prazer sexual é basicamente orgásmico. O prazer é satisfação porque é cerebral, por isso é que dá prazer.”
@Rita Machado