O que fazer se sentir ansiedade no meio de uma multidão? Psicóloga explica

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[Fotogafia: Rodnae Productions/Pexels]

A pandemia, o confinamento e o regresso à vida normal com vacinas, mas sem máscaras, criaram novos hábitos. E embora todos estejam cheios de vontade de voltar aos encontros, à vida social, aos concertos e as festivais, muitos ainda não se sentem completamente livres para recuperarem os momentos de outrora e outros sentem-se acometidos subitamente por uma sensação de angústia por estarem no meio da multidão.

Em mais um fim de semana de festivais, dois anos após ausências devido à covid-19, a psicóloga clínica Alexandra Antunes explica, no Delas.pt, como lidar perante uma súbita angústia em quem está aparentemente saudável. Uma sensação que até está, segundo indica a prática clínica da especialista, a dar mostras de crescimento, sobretudo junto dos mais novos.

Psicóloga clínica Alexandra Antunes [Fotografia: DR]

Alexandra Antunes começa por distinguir um episódio único de outros reiterados, com maior frequência. “Quando me sinto desconfortável e ligeiramente ansioso, desconfortável, com o coração a bater de forma mais acelerada e porque estou em situações que não estava habituado, mas é uma primeira vez, passa e não precisamos de ajuda, creio que deve ser olhado com ponderação”, refere.

“Quando aumenta de intensidade e tenho todos os sintomas associados a ansiedade – frequência cardíaca mais acelerada, muitas vezes com cefaleias associadas, tremores e, acima de tudo, com vontade muito grande de sair do sitio, o evitamento – há que pedir ajuda”, alerta a especialista e membro da direção nacional da Ordem dos Médicos.

“Se saio e tenho medo de voltar – uma sensação que se repete cada vez que vou -, se tem interferência no meu dia-a-dia, é preciso pedir ajuda. Deve-se recorrer ao Serviço Nacional de Saúde, que deverá encaminhar para consulta de psicologia e, nos casos mais graves, psiquiatra. Peçam ajuda”, exorta Alexandra Antunes.

Em qualquer dos casos, a especialista lembra que a Saúde 24 (808 24 24 24) “continua a manter em funcionamento a linha de apoio psicológico”. “É sempre um bom meio para onde é possível ligar mediante um episódio crítico, eles fazem também a triagem do que se está a sentir. Há uma ajuda e, mesmo em situações de crise, a linha tem tido essa reposta de conseguir apaziguar e sempre que necessário”, alerta.

E como retomar à vida normal, afinal quais são as estratégias? “De forma progressiva”, responde a psicóloga clínica. “Se estou com dificuldade e se não me sinto muito bem com muita gente, devo fazê-lo com menos pessoas, mas devo mesmo ir”. Afinal, como sublinha Alexandra Antunes, “sempre que evitamos situações vamos estar a reforçar o medo”.

“Vejo muitos jovens que parece que perderam a capacidade de interagir”

Durante mais de um ano e já com larga maioria da população vacinada, Alexandra Antunes notou, na sua prática em clínica, em dezembro de 2021 que “o relato das pessoas era muito idêntico ao do início da pandemia, ainda sem vacinas”. “Agora acho menos”, mas deixa uma nota: “Há alguma dificuldade em voltar à socialização. É quase como se as pessoas tivessem desaprendido a conviver, e por isso há um maior isolamento. Estão com algum desconforto, há uma ansiedade que passou a surgir.”

Vejo muitos jovens que parece que perderam a capacidade de interagir, ansiosos quando vão um jantar, a evitarem sair até se forem para sítios com muita gente. Dizem-me muitas vezes: ‘A pandemia prejudicou-me…’

Alexandra Antunes não cita dados concretos ou validados cientificamente, mas admite, da sua experiência diária, que algumas pessoas já tivessem latente essa ansiedade. Porém, reconhece também que noutros casos se está diante de “um sinal de uma nova dificuldade que surgiu”.

Qual o impacto da varíola dos macacos após dois anos de ‘recolhimento’?

Alexandra Antunes valoriza mais o impacto da guerra da Ucrânia na saúde mental do que o surto de Monkeypox, que também obriga a cuidados de distanciamento.

A varíola dos macacos “é um vírus identificado, já existia. Em Portugal, foi a primeira vez que existiu um surto, mas não é algo novo, está identificada a forma de contágio, de como se deve evitar, é mais visível porque há manifestações cutâneas”, afirma a psicóloga clínica.

Há um contexto muito distinto e que não vai ter o mesmo impacto na saúde mental como a covid-19, que se sabia nada. [A varíoloa dos macacos] É mais uma novidade a acrescentar aos dois anos que já vivemos e com grandes implicações. Creio que a guerra que entretanto deflagrou na Ucrânia veio agravar a saúde mental. Essa, sim, vai trazer mais consequências devido a maiores dificuldades socioeconómicas”, refere Alexandra Antunes.