“Os retrocessos ilustram que os direitos humanos não são adquiridos”, diz Teresa Pina

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O retrocesso em direitos humanos é possível a qualquer momento, muito rapidamente, e baixar os braços não é opção, defende a ex-diretora da Amnistia Internacional Teresa Pina, que sexta-feira, 19 de outubro, lança, em livro, uma reflexão sobre o tema.

A obra Direitos Humanos – o que está por fazer no século XXI reúne uma série de casos que Teresa Pina acompanhou enquanto jornalista e como diretora-geral da secção portuguesa da organização Amnistia Internacional (2012-2016).

“Os retrocessos a que assistimos na Europa, mas também fora da Europa, ilustram que [os direitos humanos] não são adquiridos, que os progressos que conquistamos em outras fases da História podem ser facilmente revertidos“, alertou Teresa Pina em entrevista à agência Lusa.

“Se houve progressos que muitas minorias considerariam impensáveis, noutras matérias houve sérios retrocessos. Não se pode baixar os braços porque, do dia para a noite, estas coisas podem ser revertidas de uma maneira muito fácil”, prosseguiu.

E, para Teresa Pina, exemplos de ameaças atuais aos direitos humanos não faltam e vão desde questões “mais fraturantes” como os direitos reprodutivos ou das comunidades LGBT [Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero] até “violações inimagináveis” da ordem internacional, como a invasão do Iraque no pós-11 de setembro.

“A invasão do Iraque pôs a nu como é possível, rapidamente, violar os tratados e dar uma ‘machadada’ na ordem internacional. A própria prisão de Guantanamo, que se mantém e que nos pareceria certamente impossível nas últimas décadas do século XX, em que havia algum progresso e consenso internacional, põe também a nu a arbitrariedade com que as normas internacionais são violadas”, apontou.

Outro exemplo desta realidade, que Teresa Pina considera “grosseira”, é o da “verdadeira crise humanitária” que se “continua a viver nas águas do Mediterrâneo”, às portas da União Europeia, que em 2012 foi distinguida com o Prémio Nobel da Paz, entre outros motivos, por promover os direitos humanos.

“Há uma série de situações que me levam a questionar se estaremos preparados para evitar que os mais vulneráveis se tornem os mais atingidos, que a xenofobia, os nacionalismos e o populismo não voltem a afirmar-se como uma coisa aceitável e legítima“, disse.

Teresa Pina assinala, por outro lado, a erosão dos direitos económicos e sociais em tempos de crises financeiras. “A resposta da UE à crise não foi centrada com os direitos humanos, não houve a preocupação de proteger os mais vulneráveis e expostos, as minorias e os mais fragilizados. O facto de se ter gerado um ambiente de escassez, de falta de recursos, de desproteção social pode contribuir para alimentar estes sentimentos antiestrangeiro”, disse.

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A antiga responsável da Amnistia Internacional entende que não há respostas “milagrosas” ou “únicas” para estas questões e apresenta, no livro, um conjunto de medidas para “prevenir” novos retrocessos.

O livro, lançado quando se assinalam o 70.º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos, servirá também para sublinhar a “importância da pressão social sobre os governos”.

“É sobretudo em tempo de crise, quando os direitos humanos estão mais fragilizados e mais ameaçados, que as proteções devem ser reforçadas. É precisamente para destacar, mais uma vez, a importância que tem a pressão social sobre os governos e na consciencialização para a existência dos tratados de direitos humanos que este livro pretende chamar à atenção”, reforçou.

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