Os discursos alusivos aos movimentos #MeToo e Time’s Up, pela igualdade de género e pela diversidade marcaram a noite dos Óscares. Mas se contarmos os prémios que as mulheres levaram para a casa, percebe-se que há ainda um longo percurso a fazer para passar das palavras aos atos.

Começando por umas das categorias principais, a de Melhor Realizador, ainda não foi desta que a Academia voltou a premiar uma mulher, apesar da nomeação Greta Gerwig, por ‘Lady Bird’. Esta foi apenas a quinta indicação de uma mulher para esta categoria ao longo da história dos Óscares. Apesar de não ter ganho, a jovem realizadora, que conseguiu a proeza de ser nomeada com a sua primeira longa-metragem, festejou a vitória de Guillermo Del Toro como se fosse sua.

Quem fez história ao conseguir uma nomeação, mas que não passou disso, foi Rachel Morrison, a primeira mulher indicada ao Óscar para Melhor Direção de Fotografia. A concorrer pelo trabalho no filme ‘Mudbound – As Lamas do Mississípi’, Morrison viu o prémio fugir para Roger Deakins, pelo trabalho em ‘Blade Runner 2049’.

As mulheres acabaram por ganhar apenas nas categorias separadas por género – Melhor Atriz Principal e Melhor Atriz Secundária. Quem não deixou passar esse facto em branco foi a veterana Frances McDormand, que ganhou o Óscar de Melhor Atriz Principal, por ‘Três Cartazes à Beira da Estrada’ , e que apontou a causa provável para este cenário pouco igualitário.

“Olhem à vossa volta, senhoras e senhores, porque todos temos histórias para contar e projetos que precisam de financiamento”, afirmou Frances McDormand, pedindo mais “inclusão” para as mulheres, sob os aplausos de pé de muitas colegas.

Numa gala que se pautou por discursos de apoio aos movimentos contra o assédio sexual, de apoio aos “Dreamers” (movimento de imigrantes nos EUA) e aos mais desprotegidos, o tom foi dado logo pelo anfitrião da cerimónia, que decorreu no Dolby Theatre, em Los Angeles.

“O que aconteceu com Harvey [Weinstein] e o que está a acontecer por todo o lado era há muito devido. Não podemos continuar a deixar passar o mau comportamento. O mundo está a olhar para nós, precisamos de ser um exemplo” disse Jimmy Kimmel.

Mas foram Ashley Judd, Salma Hayek e Annabella Sciorra queprotagonizaram o momento #MeToo da noite. As três atrizes, que alegam ter sido abusadas por Harvey Weinstein, estiveram juntas em palco para apresentar um vídeo com figuras de Hollywood a defender a inclusão e a igualdade.

Já os atores Lupita Nyong’o, queniana, e Kumail Nanjiani, paquistanês, falaram pelos ‘Dreamers’, lendo uma declaração conjunta antes de apresentarem o prémio para melhor cenografia.”Nós somos ‘Dreamers’, crescemos a sonhar que um dia íamos trabalhar como atores. Os sonhos são a origem de Hollywood e os ‘Dreamers’ [filhos de pais que imigraram ilegalmente para o país] são a origem dos Estados Unidos da América”, afirmaram.

O mesmo foi sublinhado por Guillermo del Toro, vencedor da noite, com quatro Óscares para ‘A Forma da Água’. Ao receber uma das estatuetas, o cineasta mexicano fez alusão ao muro que Trump tenciona construir na fronteira dos EUA com os seu país. “O melhor que a arte faz, e que a nossa indústria faz, é apagar as linhas na areia”, disse Del Toro.

Também o guionista Lee Unkrich, durante o discurso de vitória de melhor filme de animação “Coco”, assinalou que “as pessoas marginalizadas merecem ter um sentido de pertença. A representação é importante”.

E nesse aspeto os Óscares deste ano romperam, pelo menos uma barreira, ao atribuírem pela primeira vez um troféu a um filme protagonizado por um transexual. O chileno ‘Uma Mulher Fantástica’, interpretado por Daniela Vega, ganhou o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro.