A discussão sobre a regulamentação legal da prostituição no programa da RTP, Prós e Contras, foi acesa. Mas até a proposta chegar à Assembleia da República muita tinta vai correr. De todas as intervenções a favor e contra, só Inês Fontinha, da Associação Ninho, quis trazer para o debate as causas da prostituição e apontou a principal: a pobreza.
Alexandra Lourenço, no outro lado da barricada, e que falou do lugar de prostituta e de hipotética empresária do sexo num quadro legal diferente do atual, confirmou essa mesma causa:
“Há 2 milhões de pobres em Portugal. 600 euros para quem tem filhos a cargo não chegam.”
No mesmo dia, as páginas dos jornais encheram-se de contas sobre a distribuição da riqueza gerada pelas empresas dos portugueses mais ricos. Os lugares de topo na economia portuguesa continuam no seu ciclo de crescimento, com aumentos salariais e/ou de lucros bem generosos.
Dos salários dos mais pobres também temos tido notícias. O estudo ‘Portugal Desigual‘ da Fundação Francisco Manuel dos Santos (da família Pingo Doce) mostrou em setembro que:
“Hoje um em cada cinco portugueses vive com menos de 422 euros mensais.”
São os tais dois milhões de pobres.
Um outro estudo, do Instituto Nacional de Estatística, o ‘Portugal 2015’, demonstra que as mulheres são mais vulneráveis à pobreza.
Tudo indica que há um problema maior por resolver: a distribuição desequilibrada da riqueza gerada em Portugal.
Não deixa de ser sintomático que a discussão sobre a legalização da prostituição seja trazida à agenda política neste contexto em que a pobreza continua a grassar e as desigualdades sociais também. O trabalho já foi uma forma de melhorar as condições de vida. Para muitos, hoje, nem trabalho há, para outros há trabalho muito mal pago.
Que a venda de atividades sexuais apareça aos defensores da sua regulamentação como uma alternativa aos rendimentos baixos devia encher-nos a todos de vergonha. Uma fonte revelou-nos há dias que o sexo oral em Lisboa está a €4,5. A prostituição pode ser vista assim como uma alternativa à pobreza?
Depois de ilegalizarmos a pobreza, depois de coletivamente decidirmos que a pobreza é uma indignidade, depois de encontrarmos uma solução que retire da fome e da miséria, pelo menos, os 611 mil habitantes que, trabalhando, são pobres – e que são na maioria mulheres – talvez possamos então legalizar a prostituição. Resta saber se, nessa altura – quando as condições dignas estiverem asseguradas a todos os que vivam em Portugal – ainda vai haver mão-de-obra disponível para a prostituição.