#Prostituição: Associação que apoia prostitutas favorável à regulamentação

Isabel Soares, da APDES -Porto G 3 Pedro Kirilos

O Porto G, projeto que presta apoio de rua a pessoas que estão na prostituição e que integra a Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES), foi uma das organizações ouvidas pelo deputado João Torres, na preparação da moção a favor da regulamentação da prostituição.

Isabel Soares é psicóloga e trabalha com o Porto G desde 2008. Inicialmente, o trabalho centrava-se na prevenção do VIH, com a distribuição de preservativos, mas, como explica ao Delas.pt, a intervenção foi-se alargando a outros campos e à necessidade de acesso a direitos, como a saúde e a segurança social. Para que esses e outros direitos estejam ao alcance das pessoas que se prostituem, a psicóloga defende, sem hesitações, e apontando os anos de experiência no terreno, a regulamentação da atividade. “A intervenção da APDES vai no sentido de contrariar os fatores que colocam esta população em situação de vulnerabilidade e o trabalho de proximidade com esta população diz-nos que o atual enquadramento do trabalho sexual em Portugal não está a proteger essas pessoas.”

Revogação do Lenocínio

Atualmente, o enquadramento português é, como em muitos outros países europeus, tendencialmente abolicionista ou semi-abolicionista, como classificam algumas associações, ou seja: não criminaliza o cliente nem quem se prostitui, mas proíbe a exploração da prostituição por terceiros, o lenocínio, criminalizando essa atividade. O objetivo do regime legal em vigor é acabar com o sistema prostituicional, punindo apenas os proxenetas (vulgo, chulos).


“A APDES defende que deve ser feita “uma análise séria sobre as pessoas que foram condenadas pelo crime de lenocínio. São pouquíssimas. E depois perceber porque é que há poucas condenações, porque é que o nosso código penal está carregado de artigos que criminalizam as atividades relacionadas com o trabalho sexual”.


Para Isabel Soares, o que este modelo significa, na realidade, é um limbo em que “o trabalho sexual não é crime, nem é legal”. “O lenocínio é que é crime e a forma como está redigido no enquadramento legal não permite às pessoas que fazem trabalho sexual uma série de coisas: não permite o estabelecimento de contratos de trabalho, não permite que as pessoas usufruam dos direitos laborais, como baixa médica, direito às férias, higiene e segurança no trabalho”.

Uma das principais recomendações da APDES, num quadro de regulamentação é, precisamente, a revisão do artigo 169º, “para permitir que as pessoas se possam organizar”, justifica a psicóloga.

Se duas pessoas fizerem trabalho sexual, alugarem um apartamento e este estiver no nome de uma, mesmo que cada uma tenha o seu anúncio e pague as suas contas, a que tem o contrato de arrendamento em seu nome pode ser acusada da prática de lenocínio”, exemplifica, acrescentando que a “APDES é a favor da revogação, da retirada por completo do lenocínio do código penal.”

Isabel Soares garante que esta posição não foi tomada “de ânimo leve” e que a organização estudou e ouviu as pessoas que se prostituem e que considera serem as fontes mais legítimas de informação. Por outro lado, a APDES defende que deve ser feita “uma análise séria sobre as pessoas que foram condenadas pelo crime de lenocínio. São pouquíssimas. E depois perceber porque é que há poucas condenações, porque é que o nosso código penal está carregado de artigos que criminalizam as atividades relacionadas com o trabalho sexual”.

Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna de 2016 foram detidas, nesse ano, quatro pessoas pelo crime de lenocínio, três homens e uma mulher. Em relação aos inquéritos iniciados em 2016, o lenocínio e o lenocínio de menores representavam, conjuntamente, 1,4% do total.

A psicóloga sustenta ainda que a lei já prevê, para os casos de exploração laboral, coação ou assédio “penas mais gravosas do que o lenocínio” e estes, num cenário de regulamentação da prostituição, em que a atividade passe a ser reconhecida como um trabalho com direitos e deveres, serão, acredita, mais fáceis de identificar e de combater.

Prostituição e tráfico

O tráfico de pessoas, sobretudo de mulheres e raparigas, para fins sexuais, é um dos flagelos associados muitas vezes à prostituição. E Portugal é um eixo privilegiado na rota dos traficantes, pela sua situação geográfica entre três continentes e porta de entrada na União Europeia e no espaço Schengen, com livre circulação de pessoas. Perante isto, e em caso de regulamentação da prostituição, o país não correria o risco de se tornar num paraíso de exploração sexual?

Isabel Soares considera que um cenário de regulamentação não só não contribuirá para legalizar o tráfico fazendo-o passar como prostituição, como alguns apontam, mas ajudará a detetá-lo melhor.


A nossa situação atual não protege as vítimas de tráfico. Também já trabalhei com vítimas de tráfico e acredito que também elas estão mais protegidas por este regulamento. O facto de tirar o fenómeno da marginalidade não é um detalhe. As redes criminosas vivem muito deste segredo e muitas vezes as forças policiais ganham dinheiro. As vítimas de tráfico não confiam na autoridades”


“É como na violência doméstica, eu acredito que quando um fenómeno está na marginalidade o escrutínio das situações de violência é muito mais difícil. O contrário faz com que as situações de violência mais facilmente sejam denunciadas.” A propósito disso, a psicóloga cita o modelo holandês – criticado e dado como exemplo desadequado, inclusive por alguns dos que apoiam a regulamentação. Segundo Isabel Soares, neste país “uma das motivações para regulamentar a prostituição foi precisamente controlar o tráfico de seres humanos”.

Antes do Porto G, a ativista trabalhou em Itália na ‘On The Road’, uma associação italiana que identificava e acompanhava vítimas de tráfico. Diz que quando regressou a Portugal também vinha “formatada com a ideia de que toda a gente que estava no trabalho sexual era efetivamente vítima de tráfico”. “Mas aqui não há um todo”, contesta. “Seria desonesto da minha parte não ver que são realidades absolutamente diferentes”,

Apesar de reconhecer que a regulamentação da prostituição poder ser “perigosa” se não for feita cuidadosamente, Isabel Soares insiste que se os bordéis estiverem legalizados “vão ter inspeções como qualquer local de trabalho tem, o que agora não acontece”.

A nossa situação atual não protege as vítimas de tráfico. Também já trabalhei com vítimas de tráfico e acredito que também elas estão mais protegidas por este regulamento. O facto de tirar o fenómeno da marginalidade não é um detalhe. As redes criminosas vivem muito deste segredo e muitas vezes as forças policiais ganham dinheiro. As vítimas de tráfico não confiam na autoridades”

Violência e subjugação sexual

Mesmo quando não se trata de tráfico, o ato de se prostituir é visto, por muitos, como uma exploração, uma vez que implica que alguém pague a outro para usar o seu corpo. “Isso é um argumento moral”, atira de imediato Isabel Soares. De acordo com a psicóloga, mesmo sendo uma atividade que implica contacto sexual, “há regras e as pessoas não fazem tudo aquilo que a outra paga para fazer”. “Se um cliente pedir à pessoa para fazer uma coisa que ela não queira, ela não faz”, refere, não conseguindo afirmar se as prostitutas com quem contacta já foram, uma ou mais vezes, coagidas a fazerem o que não queriam, sob ameaça ou concretização de violência, por parte dos clientes ou proxenetas.

A sua experiência diz-lhe o oposto. “Nós tivemos um projeto que durou de 2008 a 2015, apoiado pelo Dafne [programa de financiamento da Comissão Europeia de combate à violência], e um dos nossos campos de trabalho era fazer questionários em que avaliávamos também a violência na área do trabalho sexual. Para nossa surpresa a violência não era tão diferente daquela que afeta a mulher que não faz trabalho sexual, era mais do parceiro, da família, e menos dos clientes. São raríssimas as pessoas que se queixam dos clientes.”

As causas de prostituição

Isabel Soares já acompanhou cerca de 3000 pessoas, na zona do Grande Porto, desde que trabalha no projeto da APDES. São sobretudo mulheres que ganham a vida prostituindo-se, mas também alguns homens e transexuais. Sempre que vai para a rua conhece pessoas novas, não necessariamente inexperientes naquela atividade, mas que se vão aproximando gradualmente da organização. “No início, tínhamos uma amostra de 80% de brasileiras e as portuguesas eram um número residual. À medida que nos fomos integrando e ganhando a confiança, a percentagem de portuguesas e portugueses foi aumentando significativamente”. A psicóloga rejeita que isso tenha a ver com um aumento de pessoas que recorreram àquela atividade por causa da crise. “Não é assim. Nós perguntamos sempre há quanto tempo é que estão a fazer o trabalho e há muitas pessoas que já trabalham antes do Porto G existir, mas só agora entram em contacto connosco.”

Segundo Isabel Soares, as razões que levam as pessoas a prostituir-se não divergem muito das de outros trabalhos, ditos normais. “Fazem-no para ganhar dinheiro, como outras pessoas. Não considero que todas as pessoas que fazem trabalho sexual estivessem numa situação de pobreza”, defende.

Da mesma forma, entende que não há diferenças significativas no que toca ao gosto pelas tarefas desempenhadas, entre quem exerce aquela atividade e quem tem outras profissões. “Se a maior parte das pessoas gosta de fazer trabalho sexual? Não. Há pouco tempo estava numa mesa com seis amigos com profissões socialmente aceites e eu era a única pessoa naquela mesa que gostava daquilo que fazia. A questão do gostar coloca-se no trabalho sexual, mas não se coloca noutros.”

Na experiência de terreno, através do Porto G, Isabel Soares conheceu pessoas que quiseram sair, e saíram, da prostituição. Outras, apesar de terem saído acabaram por voltar, porque os rendimentos dos trabalhos que conseguiram arranjar não eram suficientes para fazer face às despesas.

Uma população heterogénea

A APDES é um dos membros fundadores da Rede de Trabalho Sexual, constituída por organizações da sociedade civil portuguesa que intervêm diretamente com a população que trabalha na prostituição, por um grupo dos chamados trabalhadores do sexo e por académicos, somando mais de 20 membros. O objetivo desta rede é a promoção dos direitos dos trabalhadores do sexo, argumento que justifica a sua opção por um modelo de regulamentação para a prostituição. “Esta rede é constituída pela maior parte das associações. Eu conheço o trabalho de ‘O Ninho’ não tenho nada contra e acho que é necessário”, diz Isabel Soares, referindo-se à associação que ajuda mulheres a sair da prostituição e que se opõe à regulamentação, defendendo um modelo abolicionista, semelhante ao sueco, que criminaliza o cliente.

Para a psicóloga, as situações que ‘O Ninho’ trata são uma parte que não deve ser generalizada ao todo. “Não podemos considerar que tudo é assim, porque não é, o tipo de ajuda que ‘O Ninho’ presta pode não ser útil para outras pessoas. Acho que é necessário um olhar integrado para esta realidade. Se nós mudarmos o enquadramento do trabalho sexual neste momento reconhecendo-o como trabalho, acredito profundamente que não prejudica em nada as pessoas que querem sair da prostituição.”


Se a pessoa que nós encontramos nos diz que quer sair do trabalho sexual ou da prostituição o nosso dever é encaminhar, fazer o currículo, saber quais são os seus desejos e também o fazemos. Nós não promovemos o trabalho sexual. A nossa intervenção é a promoção dos direitos das pessoas e respeitar as decisões das pessoas”.


Liberdade do corpo vs “venda” do corpo

Isabel Soares defende que as pessoas devem “fazer com o seu corpo aquilo que querem” e rejeita ideia de que na prostituição a mulher está a “vender o corpo”. Isso é o que classifica de argumento moral, utilizado pelas associações abolicionistas para contestar a regulamentação da prostituição.

Não considero que a venda de um serviço que é prestado com o corpo é a venda do corpo. A pessoa não vende a vagina, não vende o pénis, vende um serviço. Nós temos uma banca no Salão Erótico do Porto, sabemos quem o visita. Não são só os clientes de sexo pago, são famílias, estudantes, casais. Mas nesse salão somos todos clientes de sexo pago. Acho que há muita hipocrisia em torno desta questão, sempre houve.”

Por outro lado, compara a atividade a outras profissões onde as pessoas também usam o corpo para prestar os seus serviços, como “um massagista ou um jardineiro”. “Há aqui uma moral que não nos permite olhar para este trabalho [da prostituição] como um trabalho, mas as pessoas que o fazem encaram-no como um trabalho. Todas as semanas vou para a rua e elas dizem-me que vão trabalhar.”

Sobre o facto objetivo de o serviço de quem se prostitui ser proporcionar prazer sexual, Isabel Soares afirma que não é o prestado a qualquer custo e que os limites são traçados por quem usa o seu corpo para o fornecer. “Se eu lhes digo, ‘tenho aqui preservativos extra-fortes, mais adequados para a prática de sexo anal”, e elas dizem-me, ‘achas que eu faço sexo anal com eles?’ Elas não fazem tudo aquilo que lhes pedem.”.

Por isso, a psicóloga insiste que existe uma distinção muito clara entre o que é trabalho sexual e coação sexual ou exploração sexual e acrescenta que o Porto G também presta apoio àqueles que se encontram nestas últimas situações. “Se a pessoa que nós encontramos nos diz que quer sair do trabalho sexual ou da prostituição o nosso dever é encaminhar, fazer o currículo, saber quais são os seus desejos e também o fazemos. Nós não promovemos o trabalho sexual. A nossa intervenção é a promoção dos direitos das pessoas e respeitar as decisões das pessoas”.

Da mesma forma que não o promovem, também não encaram a regulamentação como um caminho para a erradicação da prostituição “Não sou a favor, nem contra a prostituição. Não sou a favor da violência, nem da subjugação. As pessoas devem ter opção e dentro das suas opções ter os seus direitos garantidos, e é neste sentido que defendemos este enquadramento.”

Dignidade da mulher e direitos humanos

Entre as questões que sobressaem em qualquer debate sobre este tema está a dignidade da mulher, o género predominante na população que se prostitui. Para Isabel Soares, trata-se, mais uma vez, de um argumento moral. “Há quem diga que o trabalho sexual é dinheiro fácil e rápido, mas se a mulher não se sente subjugada, não se sente violentada, quem sou para dizer que isso está a interferir com a sua dignidade?”, questiona.

A psicóloga cita organizações como Organização Mundial de Saúde, a Organização Internacional do Trabalho, a ONU Sida, a Human Rights Watch e a Aministia Internacional, como “fontes credíveis” para justificar a sua defesa da regulamentação da prostituição, modelo “apresentado por estes movimentos” como o que melhor protege quem se prostitui, incluindo as mulheres que associações como ‘O Ninho’ apoia. “Eu nunca iria defender um modelo que fosse pôr as pessoas numa situação de paraíso de turismo sexual, nem de subjugação. Também eu me considero uma feminista e uma defensora dos direitos das mulheres, do direito da mulher ter uma escolha, que pode ser diferente daquela que eu tomaria.”


A psicóloga reitera que regulamentar não é legalizar a exploração sexual, nem a subjugação das mulheres e faz a comparação com outros temas fraturantes, discutidos no passado, em Portugal. “Eu não sou a favor do aborto, mas sou a favor de que as pessoas tenham a possibilidade de escolher.”


Questionada sobre até que ponto as decisões tomadas por essas mulheres foram realmente livres, e não fruto de circunstâncias económicas, sociais ou familiares mais desfavoráveis? Isabel Soares responde com o facto de as pessoas terem “escolhas diferentes”, mas admite que estas “são condicionadas”. “Claro que são, as minhas também são. Acredito que se o enquadramento legal for diferente as pessoas também vão ter mais hipóteses e vai ser mais fácil sair.”

Saúde pública

Melhorar o acesso e a proteção na área da saúde de uma população estigmatizada é um dos objetivos de quem propõe a regulamentação da prostituição. Em termos de saúde pública e de prevenção do HIV, este é também o enquadramento legal recomendado por entidades como a Organização Mundial de Saúde. Mas a natureza da própria atividade pode levar a comportamentos sexuais de risco, através de relações sem proteção – daí que grande parte do trabalho do Porto G consista na distribuição de preservativos a essas pessoas. Os próprios clientes podem pagar mais para ter relações desprotegidas. Num cenário de regulação, o uso de preservativo passaria a ser obrigatório para proteger quem se prostitui?

“Não, acho que isso tem de ser discutido caso a caso e que devem ser as pessoas que fazem este trabalho a decidir”, defende Isabel Soares, dando como exemplo a Alemanha, onde, segundo diz, “o poder é dado ao trabalhador do sexo”, que além de decidir o que está ou não disposto a fazer, tem também a possibilidade de denunciar o cliente, caso este desrespeite o que foi previamente acordado. No que respeita a Portugal e em concreto à sua experiência na zona norte, onde intervém, Isabel Soares refere que “as pessoas que fazem trabalho sexual não abdicam do uso do preservativo”. “Acho que a pessoa, tendo a informação, deve ser capaz de decidir se quer ter ou não práticas de sexo protegido.”

A trabalhar com esta população, na vertente da saúde, o Porto G é contra os rastreios obrigatórios, defendendo antes que os serviços, em especial os que se relacionam com a saúde sexual, devem estar disponíveis, acessíveis e ser facilitados. “A nossa perceção é que as pessoas que fazem este trabalho têm uma preocupação com a sua saúde. A nossa população gosta de fazer exames de seis em seis meses mesmo não tendo comportamentos de risco.”

Um modelo de regulamentação

Apesar de defenderem um enquadramento legal que passe pela regulamentação da prostituição e consagre o trabalho sexual como atividade laboral, o Porto G e a APDES reconhecem que ainda há muito a discutir e vários cuidados a ter na elaboração de um modelo adaptado a Portugal.

Regulamentar não é por si só bom, porque se formos regulamentar e implementar práticas discriminatórias estamos a piorar a situação das pessoas. Qualquer medida que se tome, o nosso apelo é que se envolva um grande número de disciplinas para que saia coerente e que promova os direitos das pessoas.” A ideia é olhar para outros países, analisar o que correu bem e o que não funcionou, e sobretudo não repetir erros. “É preciso ver, porque temos exemplos de todos modelos em todo o lado. É possível, antes de tomarmos um passo, vermos o que é que tem acontecido nos outros sítios.”

O modelo neo-zelandês é o que recolhe opiniões mais favoráveis, entre quem defende a legalização da prostituição, apesar de referências recorrentes à Holanda e à Alemanha. Já o modelo sueco, abolicionista e criminalizador do cliente, é fortemente contestado pelos defensores da regulamentação, que citam incoerências nos relatórios comparativos do governo e falam de denúncias de aumento da violência por parte dos clientes, desde que o fenómeno desapareceu das ruas.

“Nós não defendemos a mudança do enquadramento legal como uma medida isolada”, sublinha Isabel Soares. Campanhas de sensibilização, a formação das pessoas que querem sair da prostituição são algumas das medidas que entende que devem ser implementadas em paralelo, num contexto de legalização.

“Quando penso na possibilidade em revogar o artigo 169.º, não sou a favor da exploração da prostituição, o que eu acredito é que aquele artigo não está ali a fazer grande coisa, porque existe uma série outros artigos que protegem as pessoas. O que nós estamos a fazer neste momento pelas pessoas que estão mal e que querem outra alternativa é nada”, acusa.

A psicóloga reitera que regulamentar não é legalizar a exploração sexual, nem a subjugação das mulheres e faz a comparação com outros temas fraturantes, discutidos no passado, em Portugal. “Eu não sou a favor do aborto, mas sou a favor de que as pessoas tenham a possibilidade de escolher.”

Em Portugal, a idade mínima para se poder trabalhar é 16 anos, menos dois do que a que define a maioridade. No trabalho de rua com as pessoas que se prostituem, o Porto G não acompanha ninguém com menos de 18 anos. “Se encontrarmos alguém que seja menor temos de sinalizar”, explica a psicóloga. Num cenário de legalização da prostituição, os trabalhadores do sexo deveriam ter, no mínimo, 18 anos para trabalhar nessa atividade? Isabel Soares não se compromete com idades: “acho que tem de ser avaliado.” Mais certa é a convicção que seja qual for o modelo, esta discussão não pode passar sem uma maior intervenção de quem realmente faz da prostituição o seu sustento dos chamados trabalhadores do sexo. “A avançar [esta iniciativa] espero que isso aconteça e que inclua a heterogeneidade de vozes que compõem este fenómeno, porque não é possível ficar indiferente a uma pessoa que parte o pé, que deixa de trabalhar e não tem qualquer forma de subsistência.”