Quem é Frances Haugen? A mulher que denunciou o Facebook em véspera do apagão

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Frances Haugen [Fotografia: Blog Frances Haugen]

Nasceu em Iowa City, nos Estados Unidos da América, tem 37 anos e é filha de dois professores. Na curta biografia que apresenta no seu blog, Frances Haugen revela quem é, de onde vem, mas só agora tal ganha extraordinária dimensão depois de ter trabalhado com o Facebook e ter assumido denúncias em direto no 60 minutes, o icónico programa da CBS que em Portugal é transmitido pela SIC Notícias.

Recorde-se que Haugen veio a terreiro denunciar que o gigante das redes sociais estava a prejudicar crianças e adolescentes tendo em vista os lucros.

Haugen é formada em Engenharia Elétrica e da Computação pelo Olin College e tem um MBA concluído em Harvard. No seu blog, apresenta-se como especialista em gestão algorítmica de produtos, tendo trabalhado em algoritmos de classificação no Google, Pinterest, Yelp e Facebook.

Frances colaborou, a partir de 2019, com o Facebook no papel de gestora de produto líder da equipaCivic Misinformation, que lidava com questões relacionadas à democracia e desinformação. Mais tarde, revela ainda, “também trabalhou em contra-espionagem”. Foi no âmbito desse trabalho que Haugen revela agora ter ficado “cada vez mais alarmada com as escolhas que a empresa [Facebook] faz, priorizando os próprios lucros em detrimento da segurança pública e colocando em risco a vida das pessoas”. Antes, a especialista tinha estado em empresas de tecnologia como Google, Pinterest e Yelp durante 15 anos.

Haugen diz que pesquisa amplifica ódio e desinformação

Esta especialista de dados e ex-funcionária do Facebook declarou que os produtos do gigante tecnológico prejudicam as crianças e alimentam a polarização nos EUA, e que a empresa se recusa a fazer mudanças por causa dos lucros. Uma matéria que afirmou na televisão no domingo, coincidentemente a véspera do grande apagãoq ue empurrou as redes sociais para o silêncio do mundo inteiro e durante cerca de seis horas. Na terça-feira, 5 de outubro, esta ex-funcionária de Zuckerberg reiterou denúncias na subcomissão de Comércio, no senado norte-americano.

Frances Haugen acusou, diante dos senadores, o gigante das redes sociais de ter conhecimento de danos aparentemente causados a adolescentes pelo Instagram e de ser “desonesta na sua luta pública contra o ódio e a desinformação”. A especialista de dados fez uma ampla condenação do Facebook, sustentada por dezenas de milhares de páginas de documentos de pesquisa interna que copiou secretamente antes de deixar o seu emprego na empresa.

A ex-funcionária do Facebook apresentou também queixas junto das autoridades federais, alegando que a própria pesquisa do Facebook amplifica o ódio, a desinformação e a agitação política, mas que a empresa esconde essa realidade.

As razões de Frances Haugen

Haugen esclareceu que está a fazer tais revelações porque acredita que “os produtos do Facebook prejudicam as crianças, alimentam a divisão e enfraquecem a democracia” norte-americana.

“A liderança da empresa sabe como tornar o Facebook e o Instagram mais seguros, mas não fará as alterações necessárias porque isso poderá colocar em risco os seus lucros astronómicos“, referiu Frances no seu depoimento. Nas suas palavras, é necessária uma ação do Congresso para mudar a situação.

Após reportagens recentes no The Wall Street Journal baseadas em documentos que a ex-funcionária forneceu ao jornal, houve um clamor público, tendo Frances Haugen revelado a sua identidade numa entrevista ao programa da CBS 60 Minutos, no domingo à noite, 3 de outubro.

Na entrevista, insistiu que “o Facebook, repetidamente, mostrou que prefere o lucro à segurança” das pessoas. A ex-funcionária, que desafiou assim o gigante das redes sociais com 2,8 bilhões de utilizadores em todo o mundo.

Frances Haugen diz esperar que a sua iniciativa ajude a estimular o governo norte-americano a estabelecer regulamentação para as atividades do Facebook.

Instagram pode ter prejudicado especialmente raparigas

O painel do Senado está a examinar o uso que o Facebook faz com as informações resultantes das pesquisas no Instagram, existindo indicações de que podem causar danos potenciais a alguns de seus utilizadores jovens, especialmente raparigas. Para alguns dos adolescentes fãs da plataforma de partilha de fotos, a pressão dos colegas gerada pelo Instagram levou a problemas de saúde mental e de imagem corporal e, em alguns casos, provocou distúrbios alimentares e pensamentos suicidas, indica a pesquisa de Frances Haugen.

De acordo com a especialista em dados, um estudo interno do Facebook indicou que 13,5% das adolescentes admitiam que o Instagram tornava piores os pensamentos suicidas e 17% das adolescentes reconheciam que piorava os transtornos alimentares. “A empresa oculta intencionalmente informações vitais ao público, ao governo norte-americano e aos governos em todo o mundo”, acusou Frances Haugen no seu depoimento.

Segundo a ex-funcionária, os documentos que agora forneceu provam que o Facebook repetidamente enganou o público sobre o que a sua própria pesquisa detetou sobre a segurança das crianças, a eficácia dos seus sistemas de inteligência artificial e o papel na disseminação de mensagens polarizadores e extremistas”.

Instagram em versão infantil está suspenso para já

Devido à polémica causada na última semana, o Facebook suspendeu o trabalho que estava a realizar para introduzir uma versão infantil do Instagram, que a empresa dizia ser vocacionada principalmente para adolescentes entre os 10 e os 12 anos.

O Facebook contrapõe que as alegações de Frances Haugen são enganadoras e insiste que não há evidências para apoiar a premissa de que é a principal causa da polarização social. “Mesmo com a tecnologia mais sofisticada, que acredito que implantamos, mesmo com as dezenas de milhares de pessoas que empregamos para tentar manter a segurança e integridade da nossa plataforma, nunca estaremos absolutamente no topo desses 100%”, observou no domingo Nick Clegg, responsável das relações públicas do Facebook, à cadeia de televisão CNN.

Na sua opinião, isso deve-se à “forma instantânea e espontânea de comunicação” no Facebook, acrescentando: “Acho que fazemos mais do que qualquer pessoa razoável pode esperar”.

Entretanto, na segunda-feira, uma paralisação global mergulhou o Facebook, o Instagram e a plataforma de mensagens WhatsApp da empresa no caos, dissipando-se apenas gradualmente no final do dia. O Facebook não esclareceu cabalmente o que pode ter causado a interrupção, que durou cerca de seis horas.

CB com Lusa