A realizadora portuguesa Raquel Freire estreia, a 7 de março, um documentário sobre mulheres portuguesas, na atualidade, e que resulta também de um esforço com mais de uma década de contornar o “machismo estrutural” no país.
Mulheres do meu país é um filme-retrato sobre a condição da mulher portuguesa no século XXI, apresentando a vida de 14 pessoas, desde a mulher da limpeza à geneticista, da pescadora à cuidadora informal. “Cada uma destas mulheres é um país em si”, disse Raquel Freire à agência Lusa.
“Para mim, estas são as mulheres do nosso país, no século XXI, em 2019, tendo em conta os vários eixos de interseccionalidade, das opções, das emancipações, e de como é viver hoje em dia com todas as desigualdades e dificuldades e como é que é ultrapassá-las hoje neste território”, referiu.
O documentário é inspirado na obra As mulheres do meu país (1948), de Maria Lamas, um livro de cabeceira de há muitas décadas da realizadora portuguesa, sobretudo pela “visão profundamente feminista, de igualdade e de liberdade” daquela autora.
Do trabalho de pesquisa para o filme, feito com a participação da jornalista Sofia Branco, Raquel Freire escolheu 14 mulheres que falam das suas vidas, como ultrapassam dificuldades e “como chegaram à sua emancipação”.
Entre essas 14 mulheres está Lúcia Vaz, “afrodescendente, empregada de limpeza, mãe de dois adolescentes”. “Foi a primeira mulher que quis filmar, porque faz parte das centenas de mulheres negras que se levantam às 04:30 e que vêm limpar as cidades, para depois podermos viver nelas“, recordou Raquel Freire.
Maria do Mar Pereira, socióloga, Alice Azevedo, mulher transgénero, ativista, as irmãs Flores, artesãs do Alentejo, Maria João Pereira, bailarina, Leonor de Freitas, empresária, Mynda Guevara, rapper da Cova da Moura, Maria José Neto, pescadora de alto-mar, Toya Prudêncio, ativista cigana, Adelaide Costa, engenheira do Ambiente e bombeira, Márcia Sousa, operária e ativista lésbica, Ângela Pica, sobrevivente de violência doméstica e cuidadora informal, e Clara Queirós, geneticista, são as restantes retratadas no filme.
Há uma coisa em comum entre todas elas, explica Raquel Freire: “Cada mulher tem força e a capacidade de olhar o mundo à volta, de o compreender e de o transformar. Só não faz mais, porque está absolutamente assoberbada de trabalho”. Segundo Raquel Freire, o filme fala também de um “machismo estrutural” que ela própria teve de superar.
“Eu concorro para tudo, como mulher não consegues filmar em Portugal”
“O filme custou metade do dinheiro que o ICA [Instituto do Cinema e Audiovisual] dá para fazer” um documentário, disse Raquel Freire, lamentando que nunca tenha conseguido obter apoio financeiro do organismo para fazer o documentário. “Eu concorro para tudo, como mulher não consegues filmar em Portugal”, disse.
Mulheres do meu país, que teve apoio da Secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade, será exibido na véspera do Dia Internacional da Mulher, no cinema São Jorge, em Lisboa, onde estará também patente uma exposição de fotografia da realizadora com retratos de todas as mulheres que entram no filme. No dia 8, a exposição transitará para os espaços da Presidência do Conselho de Ministros, em Lisboa.
Segundo Raquel Freire, está planeada ainda uma transposição do projeto para uma série de televisão, com a RTP, e para um livro.
Imagem de destaque: Diana Quintela/Global Imagens
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