Sarah Affonso e o Minho. Ou o percurso próprio da mulher que partilhou a vida com Almada Negreiros

O Museu Calouste Gulbenkian, em Lisboa, tem patente até ao dia 7 de outubro a exposição ‘Sarah Affonso e a Arte Popular do Minho’, um encontro entre a pintora e esta região e que revela uma artista autónoma, por vezes esquecida na sombra do marido, Almada Negreiros.

“A exposição é feita de pistas para a exploração deste encontro com Sarah, uma mulher fundamental para Portugal, não só por se ter casado com o conhecido artista Almada Negreiros, mas por ser ela própria uma artista conceituada dos anos 20 e 30“, explicou, em declarações à Lusa, a curadora Ana Vasconcelos.

A mostra inspira-se na iconografia popular do Minho e na forma como marcou a artista, entre a infância e adolescência passada em Viana do Castelo, de 1904 a 1915. A região influenciou fortemente “as suas criações artísticas”, como revela a exposição, que inclui pintura, desenho, bordado e cerâmica, abordadas numa perspetiva marcadamente feminina.

Segundo explica a curadora, a pintora modernista “encontra-se sempre num percurso muito feminino”, seja no retrato de mulheres – lavradeiras, varinas, noivas, camponesas -, seja nas bijuterias, bordados, desenhos e pintura de cerâmicas.

Assim, a ligação de Sarah Affonso com o Minho está representada, por exemplo, por um traje rico de lavradeira, datado de 1882, uma coleção de postais, desde os finais do século XIX, com a evolução da figura feminina folclorista, e dois cartazes das Festas da Nossa Senhora da Agonia, de Viana do Castelo, de 1870.

Esta parte da exposição, que integra vídeos, fotografias, documentos e ícones da tradição minhota, como o galo de Barcelos e bijuteria em filigrana, “representa a fixação da imagem do Minho, ativa até aos nossos dias, numa tipificação dos trajes, gestos e pessoas da região”, explicou à Lusa a curadora.

Um vestido de batizado, de 1934, bordado em seda e algodão, que “mostra o seu lado mais doce e feminino”, coleções de peças de cerâmica e barro, pintadas por Sarah, desenhos, quadros e objetos pessoais são outros dos artigos que podem ser contemplados na mostra. Na galeria, acima, veja algumas imagens com elementos da exposição.

Uma artista fora das convenções

Sarah Affonso nasceu em 1899, em Lisboa, onde veio a casar com Almada Negreiros, em 1934. Nos 120 anos do seu aniversário, a Gulbenkian ilustra, com uma exposição, parte da história de uma mulher que partilhou a vida e a arte com um dos maiores artistas portugueses do século XX, mas que também teve um percurso próprio.

A fundação recorda, na apresentação desta exposição, que Sarah Affonso “foi a primeira mulher a frequentar, contra todas as convenções, o [café] Brasileira, no Chiado, o que ilustra não só os preconceitos do seu tempo, mas também o espírito independente com que os encarava”. “Se, por um lado, o tempo em que viveu condicionou o seu percurso artístico, [também usou] as suas vivências e memórias, como matéria-prima da sua arte. Foi a partir da sua própria vida – da infância e dos laços de amizade e amor – que construiu uma linguagem e uma temática próprias”, escreve a fundação.

Sarah Affonso estudou pintura na então Academia de Belas-Artes de Lisboa (atual Faculdade de Belas Artes), onde foi discípula de Columbano Bordalo Pinheiro e uma das suas últimas alunas. Dessa ligação, escreve a Gulbenkian, “terá ficado com o gosto pelo retrato e pela encenação de uma certa intimidade”.

A exposição ‘Sarah Affonso e a Arte Popular do Minho’ pode ser vista na galeria do piso inferior do Museu Calouste Gulbenkian, até 7 de outubro.

com Lusa