E se formos todas bissexuais?

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O sexo e a sexualidade humana são mais falados e pensados do que nunca há e questões que nos saltam à vista, mesmo que achemos que não nos encaixam. Uma delas parece simples de tão debatida: seremos todos bissexuais? Até que ponto seremos, neste tema, tão diferentes dos animais? Qual é o papel da sociedade na definição da nossa orientação sexual? Como em todas as questões complexas, a doutrina diverge. Mas comecemos pelo início.

O que significa ser bissexual? No limite, esta definição está a cargo de cada um e da forma como se identifica sexualmente. Há quem se veja como bi-curioso, pansexual, omnisexual, existem, na verdade, algumas definições diferentes mas a mais simples é esta: é-se bissexual quando há atração por mais do que um género. Ou seja, a ligação nasce pela pessoa em si mesma, independentemente do seu sexo. Parece simples, mas será?

Se olharmos para os chimpanzés Bonobo, os animais que partilham a maior percentagem de DNA com os seres humanos, rapidamente percebemos que a bissexualidade pode ser algo mais natural do que se poderia supor. Isto porque os avanços sexuais que existem entre eles acontecem independentemente do género, e por razões de vária ordem, seja porque estão cansados, tensos, com fome ou apenas porque querem brincar. Aliás, desde 1999 que estão referenciadas mais de 1500 espécies de animais cuja observação demonstrou comportamentos bissexuais, entre as quais, leões, lagartos, cisnes e golfinhos.

Voltando aos seres humanos, a bissexualidade é, há muito, um tema estudado e analisado. Sigmund Freud, o famoso neurologista austríaco e precursor da psicanálise, foi um dos primeiros médicos a falar no conceito de bissexualidade inata, uma definição baseada no conceito de, segundo ele, os seres humanos nascerem com uma predisposição para a bissexualidade mas é o seu desenvolvimento psicológico que acaba por definir a sua orientação sexual.

Quem também partilhava desta noção era Gore Vidal, escritor controverso também pelo modo como afirmava que os tabus retiravam ao ser humano o lado inato e natural da sua bissexualidade, uma vez que o Homem respondia naturalmente aos estímulos sexuais, independentemente do género desse estímulo.

Alfred Kinsey, famoso médico americano e cujo trabalho é um dos pilares do estudo da sexologia, foi o primeiro a apresentar estudos e dados concretos sobre a fluidez da sexualidade humana, por oposição à dicotomia homo ou heterossexualidade, abrindo caminho à bissexualidade. Ainda assim, as suas descobertas não são conclusivas ou cabais.

Posto isto, seremos todos bissexuais? Há muito caminho por desbravar nesse campo da sexologia mas o que se sabe é que a perceção face a esta orientação sexual (por muitos vista como um capricho, uma fase, qualquer coisa que existe antes da assunção da homossexualidade) difere consoante o género. Neste tema, somos muito mais rápidos a carregar no gatilho do rótulo em relação aos homens do que às mulheres. Uma mulher que assuma ter tido uma experiência com alguém do mesmo sexo não é tão facilmente rotulada de lésbica ou gay como um homem nas mesmas circunstâncias.

Quarenta e poucos anos depois da homossexualidade ter deixado de ser considerada uma doença mental (no Ocidente), há cientistas que continuam na busca do “gene gay”, aquele onde assenta a ideia de que se nasce gay ou bissexual, recusando-se a aceitar a ideia de outras fações, de que essa orientação sexual, em vez de ser um destino, é uma combinação de experiências de início de vida, entorno social e circunstâncias emocionais.

Seremos todos bissexuais? O que se sabe e se observa é que há uma certa cultura pop que amplifica a bissexualidade como uma orientação válida e fora da penumbra do preconceito. Desde Katy Perry que canta ter gostado de beijar uma mulher ou a atração por mulheres assumida por Angelina Jolie, passando pela ambivalência sexual de Lou Reed, os tempos modernos parecem aceitar que a bissexualidade não apenas existe como está aí de pedra e cal. Se isso tem paralelo nos meios académicos e laboratórios de ciências sociais, ainda está para se ver. Mas o que sabemos, até agora, é que a orientação sexual de cada um está ligada ao modo como nos identificamos a cada momento. Se isso nasce connosco ou se é apreendido ao longo da vida, ainda está para ser provado.