Síndrome da Impostora: Como a travar em si e como evitar que as crianças sofram dela

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[Fotografia: Freepik]

As sensações permanentes de que nunca se é capaz, nunca se é boa o suficiente e que, em algum momento, as falhas irão eclodir e ofuscar tudo o que foi feito leva a um estado geral, muitas vezes, mentalmente incapacitante e puxa para trás quem sofre do Síndrome da Impostora. Uma condição cujos primeiros sinais podem começar na infância e cujos gatilhos ao longo da vida fazem o resto: mal a mulheres e a homens.

A psicóloga Filipa Jardim da Silva acaba de lançar um livro (Editora Planeta) sobre esta temática no qual traz à luz detalhes sobre uma síndrome que atinge sobretudo o sexo feminino e que se pauta pela perceção permanente de não ter capacidades suficientes e mesmo, mediante o êxito, viver angustiada com a possibilidade de ser identificada pelos outros como “fraude”.

Mas, afinal, como travar e evitar um estado psicológico que pode ter consequências psíquicas como o burnout, mas também metabólicas como alteração de apetite, dores crónicas, insónias e até mesmo maior vulnerabilidade a doenças cardiovasculares?

À Delas.pt, a psicóloga revela que os primeiros sinais de Síndrome da Impostora evidentes logo na infância passam por “sentimentos de inadequação ou medo de não corresponder às expectativas”. Entre eles, detalha Filipa Jardim da Silva estão “autocrítica excessiva, medo intenso de falhar, procura pela excelência, busca pela aprovação e valorização externa, e insegurança pessoal”. Já na adolescência, e quando “o jovem está a construir a sua identidade e a testar limites, chegam os fatores da “pressão social, a comparação constante e o desenvolvimento de habilidades académicas, sociais e pessoais”.

Psicóloga Filipa Jardim da Silva [Fotografia: Divulgação]

A condição acaba, contudo, por se tornar mais evidente em “momentos de transição, escolhas e avaliação, como a entrada na adolescência, na universidade ou no mercado de trabalho”, chegando tendencialmente mais cedo à vida das raparigas do que à dos rapazes. “Nas mulheres, os primeiros sinais surgem com maior intensidade na adolescência e início da vida adulta. Desde cedo, as raparigas são mais sujeitas a expectativas sociais de perfeição, agradabilidade e desempenho exemplar, o que pode gerar um medo mais pronunciado de falhar ou de não estar à altura. Estudos sugerem que mulheres, mesmo altamente competentes, tendem a subestimar as suas capacidades e a atribuir sucessos a fatores externos, como sorte ou circunstâncias favoráveis”, explica a psicóloga.

[Fotografia: Divulgação]

 

Já nos homens, prossegue a mesma especialista, “a pressão para se mostrarem confiantes e autossuficientes pode levar a que os primeiros sinais surjam mais tarde, muitas vezes na transição para o mundo profissional. Os homens são menos incentivados a verbalizar dúvidas sobre as suas competências, o que pode levar a uma manifestação mais silenciosa do problema.”

Mas, então, como agir? “É essencial identificar pensamentos de autossabotagem, tendências de comparação e busca de validação externa e questionar crenças limitantes, reestruturar a narrativa interna e substituir, por exemplo, o ‘Não sou suficientemente boa’ por ‘só erra quem tenta e quem cria’”, recomenda a terapeuta. Fazer balanços pessoais, pedir feedback e registá-los e conversar sobre o tema, normalizando dúvidas e inseguranças são também caminhos deixados pela especialista em resposta por escrito à Delas.pt.

Intervir em crianças: dez pistas para agir sobre raparigas e rapazes

Diante dos mais novos, tentar evitar ou minimizar o desenvolvimento destas patologia sé possível mediante aplicação de estratégias simples que podem transformar, depois, uma vida inteira.

A psicóloga recomenda que se “elogie o esforço, a persistência e a aprendizagem, em vez de só o desempenho ou inteligência inata”, que “se partilhe histórias de erros e desafios para mostrar que errar faz parte do crescimento”, que se “evite a minimização das conquistas” e que se “incentive frases ‘Sim, trabalhei para isto!’ ou ‘vamos celebrar o que consegui”. Filipa Jardim da Silva recomenda também que se “forneça estratégias e ferramentas que fortaleçam as competências socioemocionais, criando espaço para tomarem decisões e resolverem problemas por si mesmos”, que se deixe claro que “o amor e aceitação não dependem da performance ou do sucesso”.

Num outro pilar, é importante prestar atenção à forma como olhamos para os outros e como levamos as crianças a fazê-lo. Nesse sentido, são de evitar as “comparações” como dizer ‘Porque não és tão organizado como o teu irmão?’ e a “pressão excessiva para a perfeição”.

No caso das raparigas, Filipa Jardim da Silva alerta para a importância de não repetir “mensagens que incentivem a agradabilidade e a busca por aceitação externa”. Já para os rapazes, a psicóloga vinca a necessidade de ”evitar discursos que invalidem a vulnerabilidade emocional, perpetuando a ideia de que não devem admitir falhas, receios ou mesmo expressar emoções como a tristeza”.