Fisioterapia da vagina. “Grande maioria dos companheiros vai às sessões”

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O dia-a-dia de Soraia Coelho é lidar com mulheres que procuram soluções para as suas disfunções sexuais, mas também problemas do trato urinário e ginecológico. Talvez o expressão ‘fisioterapia da vagina’ corra o risco de ser vaga para explicar toda a operação que se apresenta como fisioterapia pélvica, mas é, sem dúvida, uma forma inicial de entrar num tema que, frequentemente, está associado a medicação, a cirurgia, e não tanto a reabilitação.

Soraia Coelho, fisioterapeuta e especialista em reabilitação do Pavimento Pélvico
Soraia Coelho, fisioterapeuta e especialista em reabilitação do Pavimento Pélvico

Fisioterapeuta e com cerca de uma década de trabalho na área da prevenção e recuperação do pavimento pélvico, a especialista explica ao Delas.pt em que consiste este trabalho que procura – sem cirurgias, mas com tratamentos e alguma medicação associada em casos específicos – reabilitar a vida e autonomia das mulheres.

Entre as dores e as recuperações de partos traumáticos, Soraia Coelho explica, na mesma entrevista feita por escrito, que tem utentes dos 15 aos 87 anos. Revela como se processa todo o trabalho, quais os efeitos e que tipo de acompanhamento têm estas mulheres. Tratamentos femininos que, revela a fisioterapeuta, têm frequentemente contado com a presença dos companheiros.

Quais as idades mais frequentes das mulheres que a procuram para estes serviços de tratamento pélvico e urinoginecológico?

É um espetro inteiro. A minha utente mais nova tem 15 anos, a mais idosa 87. Mas a média situa-se entre os 25 e os 40.

Quais os problemas mais comuns, por idades das jovens ou mulheres?

Os mais comuns são a incontinência urinária, cicatrizes de episiotomia e cesariana, as disfunções sexuais e dor pélvica (como por exemplo em casos de endometriose).

As mulheres – quando chegam à sua clínica – já trazem antecedentes, problemas. Quais os mais comuns?

No meu caso especifico procuram-me por dor pélvica, disfunções sexuais (dispareunia e vaginismo) e por aderências das cicatrizes da cesariana. Na grande maioria dos casos são resolúveis, isso também porque os tratamentos nesta área são tratados em contexto de equipa multidisciplinar, e nisso tenho uma equipa comigo excelente. Existe agora também um outro tipo de pensamento por parte das pessoas que nos procuram para uma vertente de prevenção. Saber o que podem fazer de forma a evitar lesões pélvicas, seja num pré-parto, como na menopausa ou pré-cirúrgico.

Soraia Coelho fisioterapia pavimento pélvico
[Fotografia: DR]

Quais as sequelas mais comuns dos partos? E como resolver?

As mais comuns são a incontinência urinária e as lesões consequentes de cicatrizes. Em casos de partos mais traumáticos podem apresentar prolapsos pélvicos (queda do útero, bexiga, recto ou uretra). A resolução depende sempre do caso e do historial da pessoa. Não existe uma “receita de bolo” para resolver. E em média, as avaliações são diárias de forma a adaptar o tratamento.

Quais os problemas femininos mais difíceis e mais fáceis de resolver?

Isso é difícil de dizer. Depende muito da pessoa e da lesão. Uma disfunção sexual pode ser tratável em quatro ou cinco sessões como levar meses.

“Uma disfunção sexual pode ser tratável em quatro ou cinco sessões como levar meses”

É possível um tratamento para sempre ou, em matéria de pavimento pélvico, haverá sempre recaídas?

As recaídas não ocorrem com muita frequência. As utentes levam sempre um plano de exercícios de alta e com diversos conselhos sobre como cuidar do pavimento pélvico. Em casos mais complexos, após a alta, as utentes são avaliadas a cada três meses, seis meses, um ano e dois anos após. O que mantém também o seu compromisso perante a evolução.

Há algum tipo de recurso a medicação? Se sim, qual e em que circunstâncias?

Em alguns casos sim. Se existirem alterações hormonais ou em casos de bexiga hiperativa, por exemplo.

Que tipo de cirurgias pode este tipo de fisioterapia evitar?

Falamos por exemplo de prolapsos de grau 1 ou 2, que podem ser tratados com fisioterapia. Casos de incontinência urinária de stress por fraqueza muscular.

‘Ponto do marido’: prazer ou prisão?

E no caso do ponto do marido, em que medida pode ser útil?

Poderá ajudar, caso a cicatriz não necessite de revisão cirúrgica. Se apresentar um grau de lesão grave, a opção pode ser apenas a da cirurgia. Mas, na maioria dos casos, a massagem e a mobilização tecidular resolvem a questão.

Em que é que consistem os tratamentos?

Essa é uma das perguntas mais difíceis de responder. Mudo tanto os tratamentos e nunca sigo uma única linha. Podemos usar técnicas manuais, meios físicos (electroestimulação, tecarterapia…), reeducação postural e reeducação de estilos de vida. Podemos usar uma vertente mais de adaptação ao exercício físico, como apenas alongamentos e massagem. De uma maneira muito geral, a média de sessões fica entre as 8 a 12. Mas, como em tudo, é muito variável.

De que forma é que estes tratamentos são compatíveis com o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e outras soluções médicas?

Ao nível do SNS já existem diversos hospitais que oferecem reabilitação pélvica. Deverá sempre falar com o seu médico de família e pedir referenciação. Já ADSE e seguradoras, se existir uma prescrição médica do ginecologista/urologista, podem seguir a linha de acordo directo ou pedir reembolso das sessões.

[Fotografia: DR]

De que forma nota que os companheiros destas mulheres as apoiam? O que nota, que relatos ouve?

A minha experiencia é bastante positiva. A grande maioria dos companheiros vai às sessões e tenta perceber o que pode fazer para ajudar a superar as situações. No caso das disfunções ou dor pélvica, acaba por ser uma consulta em que muitas vezes, se fala em como a sexualidade pode de novo ser vivida a dois e como a poderão fazer de forma a respeitar os limites existentes.

Fala-se de que questões em concreto?

Falamos sem medos e sem tabus, dando informação sobre lubrificantes que podem usar, posições sexuais que causem menos impacto ou mesmo apenas relembrar que uma relação sexual não é apenas penetração, e que a podemos por vezes, vivenciar de forma diferente. Nos pós-partos, por vezes, entendem que, apesar de lhes ter sido dito que poderiam iniciar a vida sexual por o corpo já ter sarado, a mente não acompanhada da mesma forma. E existe uma validação para muitas dúvidas que sentiam. Por vezes, também tenho o revés da medalha, em que alguns companheiros não entendem o que se passa, forçando o assunto ou mesmo a intimidade física. A dor, na maioria das vezes, não é visível por outros. E o que não vemos, torna-se difícil de comprovar ser real, na intensidade experienciada.

Como se resolve nestes casos?

A ajuda da sexóloga é muito importante nesse fator para abrir a via de comunicação entre o casal.

Imagem de destaque: DR

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