Suzane Pires: “Cuido do cabelo para ficar bonita, principalmente se o jogo passar na TV”

Suzane Pires

Suzane Pires nasceu no Brasil mas a dupla nacionalidade permitiu-lhe realizar um dos seus maiores sonhos: representar a seleção portuguesa de futebol feminino. Em novembro de 2015 jogou pela primeira vez com a camisola das quinas e este sábado partiu para a Holanda, onde vai representar Portugal no Europeu de futebol feminino.

Quando não está a representar a seleção joga no Santos, uma das maiores equipas do Brasil. Foi lá que conheceu Gauther Cardoso, seu marido e atual guarda-redes do Nacional da Madeira.

Leia a conversa que o Delas.pt teve com a única jogadora casada da Seleção. E decore o nome: Suzane Pires, camisola 20. É uma das avançadas da equipa treinada por Francisco Neto e é bem provável que seja a autora de alguns dos golos que Portugal poderá marcar nesta histórica participação no Europeu.

Como nasceu este seu gosto pelo futebol?

Tenho um irmão quatro anos mais velho que sempre gostou de futebol. Assim que nasci ele disse à minha mãe que me ia dar uma bola e ensinar-me a jogar.

Quando decidiu fazer carreira no futebol?

Foi bem nova. Via os jogadores na televisão e os jogos de alta competição do meu irmão e dizia sempre que, quando crescesse, queria ser jogadora de futebol.

No Brasil é mais fácil para uma rapariga tornar-se futebolista profissional?

Não. A modalidade feminina está a crescer muito agora, mas continua a ser muito difícil para as raparigas no Brasil. Alguns clubes investem, mas na maioria dos casos são elas que têm de suportar os custos de transporte. Aqui é Portugal talvez seja um pouco mais difícil do que lá. No Brasil investem cada vez mais na formação de base, elas têm quem as treine desde pequenas.

Chegou a pensar desistir do futebol por ser rapariga?

Não, nunca. Graças a Deus sempre tive o apoio da minha família e consegui conciliar os estudos com o futebol. Nunca pensei em desistir, mas sei que é difícil em alguns casos e percebo que desistam. Quando estava a jogar na Alemanha recebi alguns convites para bolsas de estudo nos EUA, para poder representar a equipa de futebol de algumas universidades.

Já se sentiu discriminada por ser rapariga e jogar futebol?

Só quando era pequena e jogava com os rapazes. Chamavam-me sempre maria rapaz, o que é normal. Hoje em dia não, todos gostam. Quando estou de férias costumo ir aos locais onde jogava durante a minha infância e todos brincam e gozam quando faço cuecas a alguém, mas aposto que em alguns locais ainda há esse preconceito.

E ainda há muito o estereótipo de que uma rapariga que joga futebol é alguém que não cuida de si nem tem cuidados de beleza?

Antigamente era bem pior, as coisas mudaram. No dia anterior aos jogos evito comer algumas coisas. Para combater as cãibras, na véspera dos jogos hidrato mais do que o normal e como bananas. Também cuido do cabelo para ficar bonita, principalmente se o jogo passar na TV. São essas pequenas coisas.

As mulheres também têm um constrangimento que os homens não têm: as dores menstruais. Como lida com isso?

Não sofro muito com as dores menstruais, apesar de essa fase causar sempre algum desconforto. Já estamos tão habituadas que isso nem faz diferença.

Como é que a Suzane veio parar à seleção portuguesa?

Estava a jogar nos EUA. O selecionador Francisco Neto foi ver os meus jogos e convocou-me. Representar a seleção portuguesa era um sonho muito grande que está a ser concretizado.

É a única jogadora casada da equipa portuguesa. Por que razão não há mais futebolistas casadas?

É difícil conciliar a vida pessoal com os jogos. Tenho a sorte de o meu marido também ser jogador e de nos compreendermos um ao outro. Como jogávamos na mesma equipa [Santos] era maravilhoso. Treinávamos há mesma hora e depois de almoço passávamos o dia inteiro juntos. Poucos casais têm essa sorte. Agora estamos longe um do outro, mas quem sabe se não voltaremos a jogar de novo na mesma equipa.

O Gauther vai assistir aos seus jogos no Europeu?

Não vai dar porque ele já começou a pré-temporada no Nacional, mas vai acompanhar pela televisão.

Já jogou nos EUA, no Brasil e agora em Portugal. Que países oferecem melhores condições às suas jogadoras?

Nos EUA as futebolistas têm muita visibilidade, estão sempre a aparecer na televisão, há muitos anúncios televisivos com jogadoras. No Brasil há muito investimento em algumas equipas, como é o caso do Santos onde as mulheres têm praticamente os mesmos privilégios que os homens. Há boas condições a nível da alimentação e campos de futebol. A estrutura que está atrás das jogadoras também é muito importante.

Mas as diferenças entre o futebol masculino e feminino continuam a ser muitas, independentemente do país…

Muitas, principalmente em termos de estrutura. Mas acredito que um dia essas diferenças vão acabar, daqui a muito, muito tempo, principalmente quando falamos na questão do salário.

Quais as suas maiores referências no futebol?

No futebol feminino é a Marta Vieira da Silva, por tudo o que já conquistou. Quando falha, ela não aceita e luta sempre para melhorar. No masculino a minha referência é o Cristiano Ronaldo, exatamente pela mesma razão. Ele está no topo porque é o primeiro a chegar ao treino e o último a sair.

Que objetivos tem para o futuro próximo?

Estar bem no Europeu, passar a fase de grupos. Depois espero ganhar títulos no Santos, ser campeã brasileira e paulista.

Até quando a Suzane quer continuar a jogar futebol?

Não tenho ainda um tempo determinado. Quando esse dia chegar eu vou saber.

E o que pretende fazer depois da carreira de futebolista?

Ainda não tenho um plano. Gostava de estudar mais um pouco, investir na área de marketing.

Qual o adversário mais temido neste Europeu?

As equipas são todas muito fortes, vão ser jogos muito difíceis. Vamos dar o nosso melhor, tentar fazer o inesperado, surpreender com a nossa qualidade.