Sylvia Earle: Proteção do oceano “devia ser uma prioridade”

sylvia Earle GI_ Gonçalo Villaverde

Oceanógrafa, 83 anos e a detentora do record do mergulho mais profundo. Um título – a par de incontáveis distinções e prémios – e que segura há 40 anos depois de ter descido a 381 metros de profundidade. Sylvia Earle tem isto tudo para contar e muitos mais avisos para deixar no âmbito da visita que está a fazer em Portugal, tendo comparecido na National Geographic Summit. Ao Diário de Notícias, a bióloga octogenária declarou estar a fazer planos de estudo para os “próximos 20 anos” (leia a conversa na íntegra aqui).

Mas, para lá da vida pessoal, Earle veio deixar recomendações sérias na cimeira que tem decorrido no Coliseu dos Recreios, em Lisboa. As mais urgentes ligam-se, claro, aos oceanos. A exploradora defendeu que este é o momento e a oportunidade para a humanidade proteger o mar, nomeadamente através de um sistema semelhante às reservas naturais existentes em Terra. “Agora é o momento para haver segurança para o bem comum global” que é “o alto mar e o mar profundo”, através de políticas de proteção da vida marinha. Para a estudiosa dos oceanos, este é, então, o momento de “dar de volta ao oceano, proteger este vasto sistema, o coração azul do planeta”, o que “devia ser uma prioridade para todos”, afirmou à agência Lusa à margem do National Geographic Summit.

A exploradora defendeu que “a saúde do oceano é importante” para os humanos porque afeta diretamente a vida em todo o planeta Terra. “O que pomos no oceano volta para nos atormentar nos peixes, ameijoas, ostras, que estão agora cheios de microplásticos e toxinas, que não são as coisas mais saudáveis para os humanos consumirem”, explicou a bióloga marinha.

“E essa é a oportunidade que agora temos”, frisou, elencando que “há movimentações a ter lugar nas Nações Unidas para, pelo menos, haver algum tipo de proteção” para o mar, e que “nações em todo o mundo estão a começar a assegurar portos seguros dentro da sua jurisdição, o que é um sinal muito positivo”.

Zonas económicas exclusivas dizem respeito a… todos

Já na apresentação que fez aos presentes, durante a conferência, a cientista defendeu que a resposta para a conservação dos oceanos pode passar pela criação de áreas marinhas protegidas, à semelhança do que já acontece nos parques naturais em terra. Ainda que o que possa acontecer “nas zonas económicas exclusivas é mais uma preocupação nacional, mesmo tendo implicações internacionais globais, nenhuma nação pode reclamar prioridade” da vida marinha, considerou Sylvia Earle.

Recorde-se que Portugal tem uma das maiores zonas económicas marítimas da Europa e que pode vir a crescer caso a proposta de alargamento da plataforma marítima continental seja aceite nas instâncias europeias. Na verdade, os atuais dois milhões de quilómetros quadrados podem crescer, estima-se, para mais do dobro.

Em 2014, mais de 44 mil mapas intitulados Portugal é Mar foram distribuídos pelas salas de aulas do País, de estabelecimentos de ensino público e privado. Naquele documento ficava evidente que a componente terrestre do país era de 92 mil quilómetros quadrados, já a parte oceânica chegava aos perto de quatro milhões de quilómetros quadrados, ou seja, 97% do território nacional.

A exploradora advogou, na cimeira, também que é necessário “deixar o oceano ser o oceano”, alegando que os humanos estão a “mudar a natureza da natureza através das suas ações”.

Questionada sobre quais os principais desafios que os oceanos atravessam atualmente, a exploradora, que se dedica aos oceanos desde a década de 50 (do século XX), afirmou que passa por “todo o lixo, toxinas e plástico” que é colocado no mar, “todo o dióxido de carbono que está a fazer com que a química do oceano se altere e o torne mais ácido”, mas também “tudo o que é retirado”.

A humanidade tem “uma capacidade sem precedentes para retirar vida selvagem ao oceano numa escala que o planeta nunca conheceu“, atirou Sylvia Earle, referindo-se à “extração industrial de peixe e todas as outras criaturas que fazem o mar estar vivo”. Ainda assim, o “principal problema é a ignorância”, dado que “as pessoas não sabem porque é que isto importa“, rematou.

CB com Lusa

Imagem de destaque: Gonçalo Villaverde/Global Imagens