Ainda não passou um ano sobre o concerto de despedida, por tempo indeterminado, de Tony Carreira, e o tabu mantém-se. Em vésperas de se estrear no cinema um documentário sobre a vida e obra do cantor romântico, que chega às salas a 25 de julho, a garantia de um regresso continua adiada, ainda que o cantor admita: “Tenho saudades, claro que sim”.

Em entrevista ao Delas.pt e a propósito da promoção do filme realizado por Jorge Pelicano, Tony reitera que precisava de fazer este intervalo. “Tenho algumas fragilidades em mim, de cansaço, preciso fisicamente de recuar e de estar um bocadinho longe dos media, de algumas coisas”, afirma, recusando depois especificar os motivos que o estão a afastar da produção musical e dos palcos.

De entre os momentos que mais o comoveram neste novo filme, o cantor fala dos concertos de despedida que tiveram lugar no Altice Arena, em Lisboa, em novembro de 2018. É neste ponto que termina a história assinada por Jorge Pelicano e que requereu “cerca de 70 a 75 dias de rodagem, 300 a 350 horas de filme e um trabalho intensivo a nível de procura de arquivos da carreira de Tony”, enumera o realizador. Jorge não esconde, porém, que viu “risos marotos, um pouco preconceituosos” sempre que dizia que estava a fazer um documentário sobre este artista.

Jorge Pelicano, realizador do documentário sobre a vida de Tony Carreira
(Gerardo Santos / Global Imagens)

De novo neste trabalho e perante uma figura tão mediatizada, Pelicano crê que as revelações trazidas no documentário passam pelo posicionamento e pela atitude do artista. “Nunca tinha assistido a um concerto e fiquei, de certa maneira, surpreendido com os músicos com os quais ele tocava. E quando mergulhamos no arquivo dele percebemos que a preocupação já era de antes, ele sempre quis tocar com banda, não cantava em playback”, analisa. Mas há mais: “Impressionou-me a humanidade dele. Tinha um pouco a ideia de que este artista, tendo em conta o êxito que tem, podia ser um bocado vedeta. Mas desde o primeiro momento que isso não aconteceu, é uma pessoa simples. Essa humanidade dele para com os outros, não só para com os fãs, é uma das razões do sucesso e um dos motivos pelos quais é tão acarinhado. Ele faz parte da família das pessoas, senta-se à mesa com elas.”

Neste trabalho, há relatos de mulheres que, há 30 anos e ainda antes de ser tão conhecido em Portugal, seguem todos os passos do artista e estão presentes em todos os concertos, há histórias de quem prefere comer pior para ter dinheiro para sentir a alegria de o ouvir num espetáculo. Arredando a ideia de que apenas o sexo feminino sabe as letras de cor, o documentário – que revela uma legião de seguidores numerados – também traz relatos masculinos. “Fizemos mais de 50 entrevistas a fãs e sem ser a fãs, temos também homens. O conjunto dos que aparecem no documentário retratam aquilo que é o Tony”, afirma Jorge Pelicano.

Ausências notadas e o “castigo” dos plágios

E se a história se vai contando com temas do cantor, com histórias de seguidoras irredutíveis e com testemunhos de profissionais que têm acompanhado Tony ao longo da carreira, há, no entanto, ausências que são notadas. Afinal, trata-se de um documentário que retrata a vida do artista desde os dez anos, a vida dura em França numa fábrica de enchidos e o êxito conquistado, mas que não junta o olhar dos filhos Mickael, 33 anos, David, 27, ou Sara, com 19. Eles não falam sobre o pai neste documentário. A ex-companheira, Fernanda Antunes, de quem Tony se separou em 2014, surge apenas e brevemente em imagens antigas.

“De forma muito assumida, não queríamos entrar em assuntos privados”, justifica Pelicano. Mesmo quando o cantor romântico fala sobre a sua vicissitude no desamor e da separação? “Quisemos fazer um documentário sobre a carreira de músico, isso é que foi o centro, o ponto de vista. Intimidade sim, mas sempre quando a música se cruza”, sublinha.

O realizador admite que “talvez as pessoas até quisessem ver mais”, mas a decisão foi a de não olhar ao detalhe por esse lado. “Da mesma maneira que não entrevistámos os filhos. O que nos interessava era algo que cruzasse sempre a música. Agora, não quisemos deixar esses temas de fora porque fazem parte dele”, acrescenta o realizador.

Tony Carreira
(Gerardo Santos / Global Imagens)

“Não sinto que haja ali ausências”, afirma Tony, recentrando o tema nos filhos, e com humor: “Ali o artista sou eu, acho que devo estar mais presente do que eles”. Mais a sério, o cantor reitera que a escolha foi do realizador. “Não tive nada a ver com o que ele fez, que é absolutamente fantástico, e que é o olhar dele. Desde fãs, às pessoas que ali estão, quem tomou a decisão de entrevistar aquelas pessoas todas foi o Jorge Pelicano”.

E se a separação é um dos temas quentes, que dizer das acusações de plágio? “Interessava-nos sobretudo o pós-plagio”, justifica Pelicano. E acrescenta: ” Queríamos saber como é que o produtor cubano Rudy Perez reagiu a isso. Ora, havendo a possibilidade de estar com ele, fomos a Miami (Estados Unidos da América), ouvi-lo e ver como ele olhou para este processo, e ai já estamos a dar algo de novo ao público. De certa maneira é esse o nosso foco no filme”.

Tony, recorde-se, foi acusado pelo Ministério Público de plágio de 11 temas, em 2017. Mas o realizador explica que o documentário apenas escuta Rudy porque o cantor “trabalhava com ele nesta altura (fez um dueto) e já o fazia antes”.

“Aparece no filme o próprio autor da música Sonhos de Menino, o produtor Rudy Perez, a dizer que não há problema nenhum. Perguntam agora porque é que não falei com os outros? Portanto, é um castigo que vou ter de carregar durante mais uns tempos”, atestaTony, que diz abordar o caso “com a maior das tranquilidades”. No entanto, reage e questiona: “Só há uma coisa que continuo a não perceber – ou a perceber muito bem -, desde a minha acusação, várias outras pessoas também o foram e não vejo ninguém a falar sobre isso. Dez anos depois, continua-se a falar da mesma coisa”.

Imagem de destaque: Gerardo Santos/Global Imagens

Documentário de Tony Carreira já tem trailer