Testemunhos: Pais que andaram na telescola explicam aos filhos o que foi

School supplies inside tv set
[Fotografia: Istock]

Milhares de alunos voltam esta terça-feira, 14 de abril, às aulas, mas, ao contrário do que sempre aconteceu, não irão pôr os livros na mochila, nem esta às costas. Este terceiro período extraordinário será passado em frente à televisão e a medida inscreve-se na intenção de evitar a propagação da pandemia da Covid-19.

A RTP Memória vai passar a ser a sala de aulas de milhares de estudantes de todo o ensino básico já a partir de 20 de abril – a RTP2 terá programação especial todas as manhãs para quem está na pré-primária – e será por ali que a matéria das disciplinas vai ser desfiada.

A grelha de o#estudoemcasa, cujo horário é das 9h00 às 17h50 e pode ser consultado ao detalhe abaixo, está organizada por anos e escolaridade, com os alunos do 1º ao 6º ano a terem disciplinas da parte da manhã e os do 7º ao 9º ficam com o período da tarde.

Recorde-se que o final do segundo período foi feito com recurso a novas tecnologias, mas o acesso a estas possibilidades – que não são semelhantes em todas as famílias -, estava ser desigual para muito alunos, tal como foi denunciado por pais, professores e diretores escolares. Agora, em comunicado, o Ministério da Educação crê que a emissão vai permitir alcançar a generalidade dos alunos.

Numa altura em que a telescola emerge como medida de saúde pública, o Delas.pt ouviu três pais que frequentaram a ‘velha’ escola de Ensino Mediatizado – que terminou no início deste século – e que agora a tentam explicar aos filhos como foi.

As regras hoje são outras, os professores das disciplinas estão à distância de um clique para qualquer dúvida, mas a viagem ao passado – com os aspetos negativos e positivos – não deixa de valer a pena.

Sandra Neves, 38 anos, auxiliar de ação educativa

Pois, cá estou eu a falar aos meus filhos da telescola, onde fiz o 5º e 6º anos.

O primeiro ciclo terminou e estávamos ansiosos e, ao mesmo tempo, nervosos, pois não sabíamos como seria a seguir: várias disciplinas e muitos professores… Muitos professores?!? Não, apenas tínhamos uma professora Fátima.

As aulas começavam com a chamada e, de seguida, seguíamos o horário definido. O delegado de turma ia buscar a cassete que a professora mandava, depois assistíamos à aula, enquanto a professora limava as unhas, penteava o cabelo e mandava calar o barulho que, entretanto, se instalava na sala. No final de cada aula, a professora perguntava se tínhamos tido dúvidas e, se fosse o caso, a professora rebobinava a cassete e víamos tudo de novo.

As aulas de religião moral davam para dormir ao contrário das de educação física, que eram brutais: assistíamos aos exercícios pedidos e depois íamos para o recreio correr enquanto a professora ficava na secretária.

Era muito diferente do que eu imaginava, mas foi bom porque com a telescola nasceram várias histórias como aquelas em que trocávamos os números das cassetes sem a professora dar por nada, em que desligavamos a ficha do leitor VHS – e a professora, como não sabia ligar, tinha de ler toda a aula -, ou o coleguinha de trás que adormecia sempre, entre outras memórias da minha pequena escola.”

Emanuel Santos, 40 anos, empresário

“Sim, eu fui um dos que andou na telescola, fui um dos que teve o privilégio de poder continuar com os amiguinhos da primária num ambiente mais resguardado, pois continuei o segundo ciclo nas mesmas instalações.

Com apenas duas professoras físicas a completar a equipa de professores que apenas conhecíamos de ver na televisão, aprendemos a falar Francês, a fazer trabalhos manuais, a fazer contas de Matemática e muito mais.

Tive o privilégio, sim. Mas nem tudo foi bom, as dúvidas que tínhamos não podiam ser colocadas aos professores especializados nas disciplinas. Muitos de nós, aquando da passagem para o terceiro ciclo, sentiram dificuldades de adaptação e de aprendizagem em comparação com os outros meninos que fizeram o 5 e o 6ª anos em escolas apropriadas, ou seja, estavamos um pouquinho mais atrasados a nível curricular e menos enriquecidos a nível de conteúdos letivos.

O facto de a turma ser composta por alunos dos dois anos também não ajudou, pois as professoras davam a “matéria” simultaneamente para o 5 e 6º anos, o que por vezes acabava por confundir a aprendizagem. Mas conseguimos e não foi por isso que muitos deixaram de se formar.

Quanto aos meus filhos, já lhes disse que tinha andado na telescola e acharam piada que eu tivesse passado por uma experiência destas. Agora é diferente, o agrupamento e os professores elaboraram um plano diário e vamos ter de cumprir.

Carla Bernardino Ferreira, 40 anos, operária fabril

“Telescola significou, para mim, ensino à distância, ministrado através da televisão e VHS, equivalendo ao segundo ciclo. As turmas geralmente eram divididas, entre ciências e matemática, e línguas e história. Depois, assistirmos ao que se via na televisão e o professor, na sala, fazia a explicação. O que gostava mais era das explicações, ficava a compreender melhor a matéria. O que gostava menos, era de assistir às aulas pela televisão, era um bocadinho aborrecido.”

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