Vício em redes sociais aumentou com a pandemia. Eis como o controlar

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[Fotografia: Pexels]

O documentário O Dilema das Redes Sociais, dirigido pelo cineasta norte-americano Jeff Orlowski, já chegou ao catálogo da Netflix e rapidamente se tornou um dos fenómenos da plataforma de streaming. O momento do seu lançamento não poderia ser mais oportuno: a pandemia provocada pelo novo Coronavírus deixou-nos, entre outras coisas, viciadas nas redes sociais.

Embora não existam dados oficiais sobre o número de novos dependentes, segundo o site S Moda, os psicólogos concordam: “sem dúvida, esta pandemia virtualizou-nos, sem outro remédio tivemos que aprender a relacionarmo-nos via Internet, a adaptarmo-nos ao teletrabalho, às aulas online, às consultas médicas à distância. Redes sociais como o WhatsApp, Instagram, TikTok ou Twitter tornaram-se uma extensão da nossa vida real”, afirma Ana Belén Medialdea, psicóloga da saúde especializada em terapia estratégica ao S Moda.

Mas de que forma é que uma coisa tão positiva, como o facto de nos conseguirmos conectar uns aos outros à distância de um clique, pode voltar-se contra nós? A resposta é esta: as redes sociais são pensadas​para brincar com a nossa vulnerabilidade (como diz o documentário, é assim que ganham dinheiro).

O problema veio com um dos engenhos destas redes: a criação do botão ‘like’ no Facebook (que mais tarde foi estendido para outras redes), um clique que se conecta diretamente com o sistema de gratificação do nosso cérebro.

Assim como qualquer substância viciante, “o feedback positivo gera endorfinas – os químicos responsáveis ​​por produzir o nosso bem-estar – são libertados no nosso cérebro, pelo que associamos o reforço positivo às sensações agradáveis ​​que sentimos ao receber aquele estímulo, que por sua vez, se torna viciante“, explica Ana Belén Medialdea.

Não é uma surpresa que um ano como 2020 tenha acelerado as consequências negativas deste obstáculo. Na verdade, já existem estudos que relacionam o uso frequente de redes sociais durante a pandemia a uma maior prevalência de problemas de saúde mental.

De acordo com o Instituto Superior de Estudos Psicológicos de Espanha, um vício tecnológico atinge principalmente os adolescentes, que, ao abusarem das redes sociais, experimentam uma síndrome de abstinência, desgaste emocional, disforia, insónia, irritabilidade e inquietação. Isto não é exclusivo dos mais jovens: nos adultos, também provoca afastamento da vida real, induz ansiedade, afeta a autoestima e causa perda de autocontrolo, como explica o jornal espanhol El País.

Instagram e Twitter

“As redes sociais podem ser viciantes porque contêm vários elementos que nos atraem muito: o primeiro, o acesso a informações pessoais de outras pessoas que conhecemos, admiramos ou que nos falaram. Somos curiosos por natureza e isso deixa-nos curiosos. Também dá acesso às informações de que precisamos, contacto imediato com outras pessoas e entretenimento em constante mudança”, refere Silvia Congost, psicóloga especialista em dependência emocional e autoestima.

Há pouco tempo, o Instagram completou uma década, transformando-se numa rede social capaz de influenciar e moldar o comportamento dos seus utilizadores, como explica o documentário.

Ana Belén Medialdea traçou um perfil de quem são as pessoas com maior probabilidade de ficarem viciadas: “Entre os 16 e os 38 anos. O grupo de maior risco costuma ser o de adolescentes, devido a essa necessidade de procurar novidades e sentir-se reconhecido e parte integrante de um grupo, típico da sua idade. Eles ficam viciados devido à gratificação imediata, para encorajamento positivo.

São perfis que apresentam certa vulnerabilidade psicológica, tais como: procura por emoções fortes, impulsividade, intolerância à frustração, ou mesmo pessoas que já tenham um problema clínico anterior como baixa autoestima, rejeição da própria pessoa, timidez excessiva, necessidade de aprovação. Nestes casos, para além disso, a adesão às redes sociais pode ser uma via de escape para enfrentar as mudanças que têm de fazer na vida para poderem enfrentar estes problemas”, explica a psicóloga.

O Twitter, por sua vez, não se baseia tanto em ensinar o lado perfeitamente editado da vida, mas em expressar a sua opinião para o mundo. Qualquer ideia pode ser lançada: se é bem-vinda, torna-nos uma estrela por um momento, fazendo-nos sentir importantes.

“Sendo uma rede social onde os conteúdos costumam ser curtos, gera-se a sensação de continuar a procurar satisfazer a necessidade de obter outras respostas ou outras notícias que gostemos mais. Gera urgência para continuar a ser informado. O perfil mais comum costuma ser de pessoas entre os 18 e 44 anos”, resume Ana Belén Medialdea.

Como detetar que perdemos o controlo? A primeira coisa, geralmente, é sentir medo da desconexão. “As pessoas que sofrem com isto têm muito medo de perder algo importante nas redes sociais, de se sentir excluídas, e isso leva-as a sentir necessidade de se manterem ativas” refere a especialista.

O que faço: desapareço?

No entanto, a resposta não parece ser o desaparecimento total. Como o jornal The New York Times apontou recentemente, os tentáculos das redes sociais chegaram a tal ponto que não estar neles levanta questões sobre a sua legitimidade, popularidade e se está atualizado.

Bruce Mendelsohn, consultor de marketing digital, recomenda ficar pelo menos no LinkedIn, o site de relacionamento profissional, porque, se não aparecer, um potencial empregador pode se perguntar o que está a esconder.

Ainda assim existem várias práticas simples que auxiliam a desligar-se das redes sociais e no alívio emocional:

Desligue as notificações

O conselho é dado por Justin Rosenstein, o designer do famoso ‘like’, que trabalhou no Google e no Facebook, em entrevista à BBC Mundo.

Ao evitar que as notificações interrompam a sua rotina, será mais fácil de se concentrar no que está a fazer. Estes pequenos balões que surgem no telemóvel ou no computador são um lembrete inconstante de que algo está a acontecer no mundo online e que nos faz sentir como se algo estivesse a faltar.

“É como se um chocolate estivesse no meu bolso o tempo todo. Se eu comesse, ganharia peso que não quero. É sobre fugir de algo altamente viciante”, disse o programador.

Defina limites

Estabelecer um determinado horário para estar nas redes sociais pode ser um teste de força de vontade, mas vale a pena se livrar de maus hábitos, como a necessidade constante de olhar para o telemóvel.

Um primeiro conselho é estabelecer limites para si mesma: “defina alguns momentos do dia em que é ‘proibido’ tocar no seu telemóvel ou entrar nas redes”, recomenda Silvia Congost.

Outra boa ideia é definir um horário e definir um temporizador: escolha um limite diário ou semanal dependendo da sua necessidade de desligar e sempre que entrar numa rede social ative-o. Quando atingir o limite, seja forte.

Encontre um hobby

Assim como quando para de fumar, ou de comer por causa das emoções, quando corta nas redes sociais pode não saber o que fazer com esse tempo. Encontrar uma ocupação específica que queiramos exercer ajuda-nos a manter a nossa atenção nela e a dar ao nosso cérebro uma diversão mais saudável.

Transforme o uso das redes sociais em recompensas

Da mesma forma que nos recompensamos com uma manicure, um doce ou qualquer outra experiência agradável, pode fazer do uso das redes sociais uma pequena recompensa quando tiver realizado algo produtivo primeiro.

Exclua as aplicações que não usa

Vários especialistas que viram o documentário O Dilema das Redes Sociais concordam na mesma coisa: não vai ao Twitter há meses? Tire-o do telefone e eliminará a sensação de precisar dele.