Margrethe Vestager: “A etiqueta do feminismo é uma coisa que homens e mulheres podem usar”

Margrethe Vestager, comissária europeia da concorrência é uma das mulheres mais poderosas e temidas da Europa. Na Dinamarca, o seu país, a igualdade de género é levada a sério. Ainda assim, uma das filhas disse-lhe outro dia: “Mãe, pensei que a tua geração resolvesse isto”. O que há ainda por fazer na opinião de uma mulher que chegou ao topo.

Equilíbrio entre família e carreira, apoio familiar, filhos, etc… Quantos anos faltam até que estas perguntas deixem de ser feitas a mulheres em posições de liderança?

Se calhar não deviam deixar de ser feitas. Se calhar deviam é começar a fazê-las aos homens, também. A questão é que todos temos de tentar um equilíbrio entre trabalho e vida familiar. E, claro, temos de casar bem, para garantir que temos uma família em que as responsabilidades são equilibradas. Acho que devíamos continuar a debater isso. E seria justo que os homens também pudessem falar sobre esses temas. O que é que eles pensam? O que os preocupa? E funciona bem? Quais as vantagens e desvantagens de trabalhar muito, quando se trata de educar crianças e ter grandes responsabilidades? É uma pena que os homens não tenham estas oportunidades de falar de outra coisa. De se identificarem com as pessoas sobre outros tema, sem ser sempre o jogo de poder ou a próxima proposta ou outra coisa qualquer.

Até porque se os jornalistas começarem a fazer essas perguntas aos homens, o mais provável é que eles respondam.

Bom, isso ainda está para se ver se é mesmo assim.

Nunca se cansa de responder a estas perguntas? Nunca diz aos jornalistas que deviam ir fazer essas perguntas a homens no poder, também?

Eu tentei virar essa questão para outro lado. É uma oportunidade que eu tenho para dizer alguma coisa mais, além do caso Google, da concorrência ou das prioridades da Comissão. É uma oportunidade que eu tenho para dizer que sou igual às outras pessoas. Identifico-me com elas. Também tenho questões. Também tenho de arranjar maneira de estar lá para as minhas filhas e para o meu marido. E se o povo europeu me confiou este poder por uns anos, acho que devem poder saber mais coisas. Devem saber que isto não é uma máquina que toma decisões. É um ser humano. E, tal como todas as pessoas, ele ou ela, partilha a forma como todos vivemos, as preocupações que temos com os filhos. Ou com os pais.

É por isso que abre a sua agenda e o seu gabinete para entrevistas e reportagens sobre si. Para que as pessoas a conheçam, para que possa mostrar como é.

Sim. Para ser uma coisa mais pessoal. É assumido. Se não for pessoal, não é credível.

Considera-se uma feminista?

Sim.

O seu marido é feminista?

Não sei.

As suas filhas são feministas?

Não sei se usariam essa designação. Uma delas disse-me há pouco tempo: «Mãe, pensei que a tua geração resolvesse isto». Não conseguimos. Mas eu entendo a etiqueta do feminismo como uma coisa que homens e mulheres podem usar. A promessa do equilíbrio de género e igualdade de oportunidades é que podemos desenvolver mais os nossos papéis. Como mulheres, como homens ou seja qual for a identidade que tenhamos.

E podemos fazer mais das nossas vidas. Não se trata de mulheres, apenas. Trata-se de homens, também. E de como aproveitar ao máximo.

Alguma das suas filhas [Ella, 14 anos, Rebecca, 18 anos, Maria, 21 anos] alguma vez manifestou vontade de seguir uma carreira política?

Até agora não. Mas eu também não, quando tinha a idade delas.

Se alguma delas o quiser fazer, tem um bom conselho para lhes ar?

Seja o que for que façamos, o mais importante é acreditarmos naquilo, acreditarmos que faz sentido.


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Entrevista de Paulo Farinha

Fotografia de Reinaldo Rodrigues / Global Imagens