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Amai-vos uns aos outros

Catarina Pires

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Declaração de interesses: sou ateia e defensora de direitos iguais para todos.

Não sei se amanhã o cartaz do Bloco de Esquerda, que celebra a conquista do direito à adoção por casais do mesmo sexo com um Jesus Cristo pop sobre o qual afirma que também tinha dois pais, estará nas ruas. A chuva não ajuda à colocação de cartazes. A mim não me choca nada a utilização do humor, não acho sequer que seja ofensivo para qualquer uma das religiões cristãs, até porque quem acredita, crê que sim, que Jesus Cristo teve dois pais, um que o criou, no sentido em que através do Espírito Santo fecundou a virgem Maria, e outro que o criou, no verdadeiro sentido da palavra, fazendo-o crescer. Na verdade, Maria e José, mãe biológica e pai adotivo, casal heterossexual, educaram tão bem o rapaz que este não só mudou para sempre a história da humanidade como 2016 anos depois continua a determinar a vida de todos nós, não crentes incluídos. Eu, apesar de ateia, simpatizo bastante com Jesus Cristo, sobretudo pela sua defesa da igualdade e dos pobres e dos oprimidos. E porque era bonito. E porque se apaixonou pela Maria Madalena, prostituta. Já não simpatizo tanto é com o uso que as religiões que em seu nome foram criadas deram ao seu legado. Como não simpatizo com o uso da sua história neste cartaz do Bloco de Esquerda. Porque é disparatada e desprovida de sentido no contexto da adoção por casais do mesmo sexo e, portanto, não ajuda à discussão nem à evolução de mentalidades nem a nenhum dos objetivos que, segundo os seus promotores, visava. Antes pelo contrário. Direitos não se discutem, sobretudo os que já foram conquistados. E o que a soberba exibida nestes cartazes pode provocar é a fragilização da discussão e da luta a travar pelos que ainda estão por conquistar. E são muitos.