Angústia gerada pela IA está ao nível da que é sentida com alterações climáticas e coronavírus

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[Fotografia: Pexels/Kindçle Media]

A inteligência artificial (IA) promete revolucionar uma ampla gama de profissões, uma perspetiva que gera angústia em muitos trabalhadores que temem mudanças nos seus cargos, funções ou, até mesmo, o desaparecimento dos seus empregos.

Há um antes e um depois de novembro de 2022 e do lançamento do ChatGPT, a interface de IA generativa capaz de responder de forma documentada a qualquer tipo de consulta formulada em linguagem corrente. “As pessoas começaram a dar-se conta de que certas competências que tinham desenvolvido e nas quais se especializado poderiam, sendo realistas, ser substituídas pela IA”, explica uma designer gráfica especializada em animação, que pediu para manter o anonimato.

No seu caso, o choque veio de imagens geradas por programas de computador como o Midjourney ou o Stable Diffusion, que surgiram no ano passado. Acostumada ao setor dos meios de comunicação, já ferido por um grande número de demissões, esta nova-iorquina já não está “segura de como serão (os empregos) daqui a cinco anos, ou até antes”.

“Tudo o que é novo e desconhecido produz ansiedade”, destaca Claire Gustavsson, psicanalista americana com vários pacientes que lhe falam sobre a IA. “A tecnologia avança tão rapidamente que é difícil encontrar referências”, argumenta.

Meris Powell, psicoterapeuta de Nova York, relatou que um profissional da indústria do entretenimento lhe manifestou sua preocupação pelo uso da inteligência artificial no cinema e na televisão, um dos importantes pontos que desencadearam a greve de atores e argumentistas de Hollywood.”São as profissões da área de criação as que mais se preocupam“, segundo Gustavsson.

Mas programadores, consultores telefónicos, trabalhadores da área jurídica e financeira, contadores e jornalistas já convivem com a IA generativa, que pode produzir um artigo, uma recomendação de investimento ou centenas de linhas de códigos de programação instantaneamente.

Analistas do banco Goldman Sachs avaliam que a IA generativa irá suprimir ou reduzir a atividade de aproximadamente 300 milhões de empregos, de acordo com um estudo publicado em março.

“Espero que minha função se torne obsoleta em dez anos, à medida que as capacidades da IA a permitam realizar a maioria das tarefas que os bancários efetuam”, reflete Eric, de 29 anos, que trabalha em uma agência bancária e prevê “mudar de carreira”.

“Aceitar o desconhecido”

“Quando o ChatGPT penetrou o inconsciente coletivo, os terapeutas também se alarmaram”, alguns até pensando que poderiam ser substituídos pela IA, recorda Gustavsson. “Apenas a mudança climática e o coronavírus produzem este nível de ansiedade” entre os fenómenos sociais, avalia esta profissional especializada em acompanhar transições de carreira.

Ela trabalha com os pacientes para os ajudar a “aceitar o desconhecido” e “encontrar meios para utilizar as novas tecnologias a seu favor”.

A designer gráfica desenvolveu recentemente habilidades em codificação e aperfeiçoou a adição, mas tem a sensação de que essas aptidões terão menos peso, se é que continuarão a ter no mundo pós-IA. “Imagino-me a trabalhar mais em gestão, na direção artística”, mas “é difícil porque há menos postos deste tipo”, reflete.

Diria que 0,5% ou 1% da população mundial vai beneficiar com a inteligência artificial. Para os restantes, é uma zona cinzenta, e têm razão em ficarem preocupados“, afirma Peter Vukovic, que foi responsável técnico de várias start-ups. “Hoje, a IA está centrada na eficiência” para “fazer mais dinheiro”, explica esse ex-diretor criativo. “Mas poderá servir para outros fins”.

Na medida em que a IA seja capaz de fazer uma parte importante das tarefas, vou perder habilidades“, antecipa Shaun Jonas, artista gráfica em 2D e 3D, ainda que isso não lhe gere preocupação, assegura. “Vejo isso como uma ferramenta adicional que se acrescentará às demais”, afirma. Para Jonas, os artistas poderão, no futuro, diferenciar-se da IA “mediante um estilo único”.

AFP