Nos anos 1990, tornou-se uma referência graças a filmes como Blade (1998) e Ela Baleou Andy Warhol (1996). Mais tarde, entrou em videoclips de Aerosmith e de Britney Spears e a imagem de bad boy ajudou a cimentar a fama. Mas há muito que Stephen Dorff havia desaparecido do radar do grande público – provavelmente, desde Somewhere – Algures, de Sophia Coppola, em 2000. Aos 45 anos, o ar de rapaz malandro mantém-se, mas a carreira atravessa uma nova fase com a estreia da terceira temporada de True Detective, que acaba de chegar a Portugal através do streaming da HBO Portugal.
O Delas.pt falou ao vivo com Stephen Dorff, que na série interpreta Roland West, um detetive que faz dupla com o também investigador Wayne Hays (interpretado pelo nomeado para um Óscar Mahershala Ali), para resolver um desaparecimento misterioso de duas crianças. O caso acontece nos anos 1980, é encerrado e reaberto mais tarde, acompanhando os protagonistas ao longo de três décadas da sua vida. O ator esteve em Portugal, pela primeira vez, para promover a série, em que estão presentes temas como o luto, a violência doméstica, a doença e o racismo. Em entrevista, fala sobre a sua personagem, a era dourada que a televisão atravessa e conta ainda como foi trabalhar com o ator Mahershala Ali, nomeado para Melhor Ator em Papel Secundário por Green Book – Guia para a Vida.
É verdade que, no início, o papel de Roland estava destinado a Mahershala Ali, que acabou por interpretar o detetive principal, o Wayne West?
Sim, o criador da série e argumentista Nic Pizzolatto abordou-o primeiro para interpretar o Roland, ainda antes de eu fazer parte do elenco. E o Mahershala tinha acabado de fazer o Moonlight e convenceu o Nic a fazer antes o papel do detetive Wayne West. Do que eu sei mostrou-lhe uma fotografia do seu avô, um afro-americano que foi oficial da polícia. Acho que esta mudança tornou a série ainda mais original. Não se vê muitas vezes um detetive negro como o Wayne, com um papel tão forte. Normalmente, é ao contrário. Eu nunca tinha trabalhado com o Mahershala, não o conhecia, mas já era seu fã. Também não sabia dizer o seu nome ainda [risos].
Como conseguiu o papel de Roland?
Normalmente, lemos um guião antes de uma audição. Mas, devido ao secretismo, mostraram-me apenas duas cenas. Fui e li as duas cenas como Roland para o argumentista Nic Pizzolatto, apenas 10 minutos. E pensei que tinha corrido mal porque, normalmente, quando corre bem ficas na sala durante muito tempo. E já há muito tempo que não fazia algo assim, ler as cenas sem saber o que o papel realmente era. Mas o diálogo parecia muito natural enquanto lia as páginas. Penso que o Nic já sabia que eu ia ficar, queria apenas confirmar. Quando consegui o papel, disse-lhe: ‘Então, já posso ler o guião. Não vou mostrar a ninguém!’. Comecei a ler e foi uma grande surpresa descobrir o quão boa era a história. E perceber que esta era a melhor personagem que já alguma vez interpretei.
Qual a história por detrás da série?
Basicamente há um crime que começa nos anos 80, quando os detetives Roland e Wayne (Mahershala Ali) têm 30 anos. O caso não é resolvido, reabre nos anos 90 e continua a atormentá-los após três décadas. Nós envelhecemos dos 30 aos 73-75 anos. É uma longa jornada para as duas personagens. E é muito ambicioso numa série de televisão fazer três décadas simultâneas e conseguir contar uma história sumarenta.
Fale-me da sua personagem, o detetive Roland.
O Roland é uma personagem ótima porque tem tantas cores diferentes. É intenso, é duro, é um cowboy. Preocupa-se com a forma como se veste com as suas botas e o seu blazer. É alguém fácil de gostar, é sensível e engraçado. É ele quem nos dá o humor nesta série, porque o Wayne (Mahershala Ali) é sempre tão intenso. E são precisos momentos mais leves e esse sentido de humor. Consegui fazer a parte dura e a emocional, porque ele também tem um lado sensível e não gosta de ver ninguém sofrer. Para um ator é perfeito. Normalmente só interpretas um homem bom ou mau. Ou mostras uma coisa ou outra. Isto deu-me a possibilidade de mostrar tudo e depois de crescer com a personagem, de mudar com ela. Quando o conhecemos ele é charmoso, adora mulheres, adora pessoas. É uma pessoa sociável, mas quando fica velho, isso muda. Está sozinho, não tem ninguém, exceto uns cães.
De que forma foi esta experiência diferente de outras que já tinha tido na TV?
Eu já tinha feito pequenos trabalhos na televisão, mas nunca uma série como esta. Filmámos durante sete meses, 120 dias, e foi a primeira vez que consegui ter oito horas para contar a história de uma personagem. Num filme tens apenas duas horas para mostrar tudo. Além disso, o argumento normalmente não é tão bom.
Não?
Na minha opinião, eu acho que os filmes perderam imenso nos últimos anos. De vez em quando há um Roma (também nomeado para um Óscar) ou algo verdadeiramente especial, mas na maior parte do tempo há apenas filmes para famílias, comic books, de horror, filmes que já vimos. Não há nada muito especial por aí, pelo menos eu não encontrei nada para mim assim durante algum tempo. Isto foi um é muito especial e acho que um sonho para qualquer ator. Tive sorte com este.
Trabalha como ator há mais de três décadas, desde o sucesso com Blade. Mudou muito nesta indústria?
Quando comecei éramos uns cinco rapazes, fazíamos todos os filmes e ia rodando. Parecia quase um pequeno clube. E a televisão era um mundo à parte, havia algumas coisas a acontecer, mas nada de especial. Agora é o mesmo mundo e a televisão tem hoje os melhores argumentistas e realizadores. Eu adoro cinema e é o que sempre fiz, mas há muito poucos bons. Tens uns cinco filmes por ano que conseguem chegam ao Óscar e que são bem distribuídos. Agora tens filmes no Netflix e noutras plataformas, que nem sequer passam pelo cinema. Este é de longe a minha primeira experiência na idade dourada da televisão. Hoje a televisão é o cinema. Espero encontrar outro projeto tão bom. Mas não sei se vai existir.
A televisão hoje é um concorrente muito forte do cinema?
A TV é hoje uma grande oportunidade. Sei que o Mahershala também sentiu isso. Ele ganhou um Óscar (Moonlight) e não foi logo fazer outro filme. Sim, fez o Green Book e, provavelmente, vai ganhar outra vez. Mas ele apostou no True Detective pela qualidade do material. Enquanto ator vais sempre escolher o melhor material. Talvez da próxima vez seja um filme. Tens que ir com aquilo que lês e que achas especial. Eu teria recusado qualquer filme para fazer esta série e interpretar o Roland. Teria de aparecer um grande filme com uma grande personagem para trocar isto. Foi melhor do que qualquer filme que fiz em anos, provavelmente desde o filme da Sophia Coppola.
Já tinha estado em Portugal?
Não, é a minha primeira vez aqui. Eu vivo em Malibu, adoro o sol e o oceano, adoro surfar, apesar de não ser muito bom [risos]. O Rodrigo Santoro, que também esteve em Lisboa a promover outra série da HBO, contou-me que no outro dia foi surfar à Nazaré, onde vocês têm a melhor onda. Estou a pensar ir lá só espreitar e tirar umas imagens. Tenho apenas um dia livre, por isso quero aproveitar.
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