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Raquel Prates: “Não é o útero que faz de uma mulher o que ela é, mas sim a sua natureza, a força interior”

[Fotografia: DR]

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Tem sido uma dos rostos que mais tem batalhado pela tomada de consciência da doença e dos efeitos nefastos provocados pela endometriose. Agora, a apresentadora e ex-manequim Raquel Prates volta a elevar a voz para revelar que vai ser sujeita a cirurgia para remoção total do útero – que acontece esta quinta-feira, 17 de fevereiro.

Em vésperas de entrar para o bloco operatório, Raquel Prates falou, por escrito, com o Delas.pt e revelou como lida “há dez anos” com uma doença debilitante – muitas vezes incapacitante – e, acima de tudo, muito mal compreendida e aceite pela sociedade em redor.

Prates fala das dificuldades do diagnóstico, do problema em encontrar especialistas vocacionados para estas áreas e da falta de respostas para quem vive com a patologia. Tudo isto sem esquecer os impactos na vida pessoal e profissional: “Podemos ter de cancelar ou adiar compromissos profissionais, faltar a um evento social, não estar presente em encontros familiares, tudo isto com as consequências que daí advêm. Perda de oportunidades profissionais, distanciamento social, não conseguir estar presente em acontecimentos importantes para as pessoas que nos são mais próximas.”

Aos 46 anos e a momentos de enfrentar uma histerectomia total, a apresentadora e rosto da moda fala das novas batalhas que tem pela frente – os efeitos desta remoção de tecidos – e de como quer usar, daqui para a frente, a sua influência na sociedade civil para acabar com o estigma em torno de uma doença que, estima-se, afete mais de 240 mil mulheres portuguesas em idade reprodutiva.

Sim, porque, afinal, ter persistentes dores menstruais não é mesmo nada normal. É perigoso! “Ao longo dos anos sem o tratamento adequado, a situação transforma a vida num estado quase permanente de dor e sensação de incapacidade que podem levar as doentes a quadros depressivos e ansiosos”, descreve a apresentadora.

Há quanto tempo recebeu o diagnóstico da endometriose?

Tive o primeiro diagnóstico de há cerca de dez anos, o de adenomiose [crescimento de tecido do endométrio fora do útero] foi mais recentemente, após consultar um especialista em Endometriose e Infertilidade reconhecido internacionalmente nesta área, António Setúbal da CEI Clinic. Ao longo da última década consultei vários outros médicos, pelo que aqui se identifica logo uma das principais dificuldades desta doença: encontrar um profissional de saúde especializado nestas patologias para obter um diagnóstico correto e determinar o caminho terapêutico adequado, o que determina a qualidade de vida e os impactos da doença no futuro das pacientes.

Quais têm sido as maiores dificuldades em lidar com a endometriose?

Como acontece com qualquer mulher portadora de endometriose, as maiores dificuldades prendem-se com o efeito que os sintomas têm na vida diária e que têm impacto nas diferentes vertentes da vida: profissional, social, familiar. As dores intensas e o facto de vários órgãos poderem ser afetados tem como consequência uma condição física fragilizada que, ao longo do tempo, se transforma vulgarmente também numa fragilidade mental e emocional. Em alturas em que a doença se manifesta de forma mais intensa, muitas vezes os planos que tínhamos para aquele dia têm forçosamente de ser alterados.

[Fotografia: DR]
Podemos ter de cancelar ou adiar compromissos profissionais, faltar a um evento social, não estar presente em encontros familiares, tudo isto com as consequências que daí advêm. Perda de oportunidades profissionais, distanciamento social, não conseguir estar presente em acontecimentos importantes para as pessoas que nos são mais próximas. Acresce que, como é uma doença ainda muito desconhecida, existe a tendência para desvalorizar os sintomas, e consequentemente não haver facilmente a compreensão do real estado geral em que nos encontramos por vezes. Isso provoca na mulher com Endometriose uma tendência para um maior isolamento e distanciamento.

Como é cumprir o dia-a-dia com esta condição?

É um desafio. Nunca sabemos como vamos acordar em cada manhã, se a condição física nos vai permitir levar a cabo o que tínhamos planeado. Muitas vezes, até as noites são bastante complicadas, o que faz com que já comecemos o dia extremamente cansadas e desgastadas. Depois, é quase impossível ter o mesmo rendimento mental e a mesma predisposição para encontros sociais ou familiares. Quando existem focos em outros órgãos, o quadro pode mesmo tornar-se incapacitante ao ponto de em um ou mais dias não conseguirmos levantar-nos da cama. São necessárias uma resiliência e uma capacidade de tolerância à dor muito elevadas. O cansaço crónico e a falta de energia são, infelizmente, características da endometriose. Ao longo dos anos sem o tratamento adequado, a situação transforma a vida num estado quase permanente de dor e sensação de incapacidade que podem levar as doentes a quadros depressivos e ansiosos.

Como encara a histerectomia total?

Obviamente, não é o que desejaria. A questão é que as lesões no útero provocadas pela Adenomiose atingiram um estágio em que a possível evolução das mesmas, pode levar a um nível ainda mais grave e comprometedor, além de que as dores são muito fortes, pelo que a melhor solução para o meu caso é mesmo a remoção total. Uma vez que o objetivo da maternidade já não será possível também, a histerectomia vai permitir reduzir riscos futuros e ganhar qualidade de vida.

[Fotografia: DR]
Naturalmente, não será a melhor situação que pode acontecer a uma mulher ou a um casal, mas neste momento encaro este passo com otimismo, porque acredito ser o melhor para mim nesta fase. De resto, não é o útero ou os ovários que fazem de uma mulher o que ela é, mas sim a sua natureza, a força interior, as suas convicções e forma de estar na vida.

E quais os efeitos que mais teme desse imperativo?

Estou informada sobre os efeitos desta cirurgia e estou consciente da possibilidade de ocorrerem modificações no meu corpo, por dentro e por fora. São conhecidas algumas manifestações mais comuns, como alterações no sono, apetite, pele, etc.. No entanto, cada organismo reage de sua forma, os efeitos não são iguais para todas as mulheres. Conforme as consequências que esta cirurgia tiver em mim, serão avaliadas as possibilidades de minimização das mesmas pelos médicos que me acompanham. É um processo, não apenas um momento. Sinto-me confiante que vou conseguir fazer este caminho com sucesso, sempre com energia positiva e o apoio da minha família e dos meus afetos mais próximos.