Asas gigantes, lingerie sexy e muita, muita beleza. Este é o universo que conta, entre outras, com a portuguesa Sara Sampaio, chega anualmente até nós e faz sonhar milhões. No entanto, nem tudo revela ser angelical como na passerelle. Na galeria acima, reveja o último desfile da marca, realizado em novembro do ano passado.
Randal Konik usa expressões dramáticas e autoevidentes como “Game Over” ou “Acabou o jogo”. Para o analista do grupo financeiro norte-americano Jefferies – focado em apurar a valor das companhias a longo prazo e na perspetiva de acionistas – o caso é dramático sobretudo depois de no mês de junho terem sido apresentados resultados catastróficos. As ações em bolsa da detentora de uma das mais belas empresas de lingerie do mundo, a L Brands, caíram 12%. Mas as quebras do primeiro trimestre do ano denunciam quebras na ordem dos 50%.
Português será uma das línguas mais faladas no desfile de Victoria’s Secret
Tanto a Victoria’s Secret como a submarca desportiva Pink têm vindo a sofrer “uma queda a larga escala, uma incapacidade total para a fixação de preços e uma perda contínua dos valores das ações”. Um frase lapidar proferida numa carta escrita por Konik à banca, com perspetivas negras, e citada pelo site informativo do universo da moda Business Of Fashion.
Mas afinal, o que tem vindo a correr mal neste céu?
A casa de lingerie explica que as temporadas têm registado faturações baixas e que, por isso, têm sido “épocas fracas”. Mas há analistas que avançam outras explicações: o exagerado número de lojas nos Estados Unidos da América e Canadá – quase 1200 –, o crescente consumo online e, em loja, a falta de atratividade que agora gera o ‘compre um artigo leve três’.
Mas os espaços físicos são um fator relevante para o detentor da marca. Les Wexner, de 80 anos e conselheiro delegado da empresa, defendeu essa mesma ideia e reiterou-a em conversa com o Financial Times, em março deste ano. Considerava ele que os seres humanos “por serem animais gregários” precisam de ter locais onde se encontrar, lembrando que o crescimento das compras na Internet aplica-se a muitas áreas da vida, mas não à moda, sendo que nos espaços físicos é mais fácil surpreender os clientes com os produtos do que na Web.
Contudo, os dados de faturação relevam uma empresa que vem ficando despida. De acordo com os dados reportados recentemente e relativos ao primeiro trimestre, a marca fala em 154, 8 milhões de dólares (132 milhões de euros), menos 50 milhões do que em período homólogo do ano passado, e revela um lucro líquido, em igual período de, 47,5 milhões (40,6 milhões de euros), menos de metade do que em 2017 (94,1 milhões de dólares/80,4 milhões de euros).
Da libertação dos homens à prisão das mulheres pela ideia da beleza
A Victoria’s Secret passaria a ser uma insígnia da L Brands apenas em 1982 e quando, conta o diário espanhol El País, era uma rede de apenas meia dúzia de lojas com contas no vermelho. Antes, estava nas mãos do fundador Roy Raymond e da mulher deste, desde 1977. A casa nascia, então, porque este empresário queria comprar lingerie sexy para oferecer à companheira sem parecer suspeito ou pervertido.
Os 80 mil dólares de poupanças da família foram suficientes para, em finais dos anos 70 do século passado, assegurar a libertação dos homens na hora de comprar intimidades. Ignorando, claro, que mais tarde e já na mão de Les Wexner, nascia um ideal de beleza criado sobre as mulheres, e que tem hoje tanto de apreciado como de criticado.
O novo dono tirou os homens do centro da equação, recentrou o negócio nas mulheres e, em 1995, fazia parar o mundo ao contratar manequins, mulheres lindas que se vestiam de anjos para mostrar o que de mais sexy a companhia de lingerie apresentava. Sara Sampaio é um dos mais recentes rostos de uma galeria ímpar de beleza que foi contando com Tyra Banks, Heidi Klum, Alessandra Ambrosio, Adriana Lima e muitas, muitas mais.
Ainda hoje os desfiles são vistos por milhões, em Portugal costuma ter transmissão garantida nos canais do cabo da SIC. Mas os analistas lembram que estas iniciativas já não movem multidões como antes e falam de quebras de auditórios na ordem dos 50%. Ao mesmo tempo, os mesmos especialistas, conta o periódico espanhol, falam do rasto negativo deixado pelos sacrifícios que são necessários para se ganhar asas neste mundo.
As restrições alimentares, os exercícios e os cuidados extremos em vésperas de desfile podem já não entusiasmar tanto o público feminino, que sonha agora com outra libertação: a dos preconceitos.
Imagem de destaque: Aly Song/Reuters