Verão na Europa é sinónimo, entre outras coisas, de festivais de música. Portugal não é exceção e nos últimos anos assistiu-se até a um boom do mercado festivaleiro.
Onde o país parece estar à margem é no número de casos de violência sexual, que começam a ser cada vez mais frequentes no estrangeiro. Só na Suécia foram reportados, no primeiro fim de semana deste mês, cerca de 50 ataques a mulheres e adolescentes, ocorridos em dois festivais diferentes.
No Putte I Parken foram denunciados, pelo menos, 35 casos de mulheres assediadas sexualmente por grupos de homens e rapazes. A vítima mais nova tem 12 anos e a polícia identificou sete suspeitos. Já no Bravalla, o maior festival sueco, as autoridades receberam cinco queixas de violação e 12 de assédio sexual, o que levou os Mumford and Sons, um dos cabeças de cartaz desta edição, a boicotar qualquer atuação futura no evento até terem garantias de que a polícia e os promotores estão a fazer alguma coisa para combater essas situações.
Além da Suécia, também a Dinamarca, Reino Unido e a Alemanha já registaram casos semelhantes.
Portugal: realidade ausente ou escondida?
Nos festivais portugueses não há registo deste tipo de ocorrências, embora em 2011 se tenha falado de uma violação no festival Sudoeste – notícia que a organização não confirmou.
A falta de dados oficiais e de discussão aberta sobre o tema tem dificultado a confirmação desta realidade no contexto nacional, como explica ao Delas.pt, o presidente da Aporfest – Associação Portuguesa de Festivais de Música.
“Todos os anos se fala em violações, no Sudoeste e também noutros festivais, mas nunca com dados concretos”, refere Ricardo Bramão.
A associação reconhece a dificuldade que tem tido em obter esses dados e que muito do seu trabalho tem passado por tentar abordar uma questão “sobre a qual as entidades não se sentem confortáveis em falar”.
Uma notícia publicada, esta quinta-feira, no site da Aporfest refere que do lado de quem organiza os festivais e de quem os vigia – PSP/GNR, Proteção Civil, Segurança Privada e Cruz Vermelha –, não existe uma preocupação efetiva no que se refere a esse tipo de crimes, estando as atenções mais voltadas para comportamentos adulterados e apreensões de droga e estupefacientes.
No mesmo artigo, tanto a APAV (Associação de Apoio à Vítima) como a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres dizem não ter conhecimento de nenhuma agressão sexual em festivais de música. A plataforma deixa, contudo, o alerta de não se poder assumir “uma relação direta entre a inexistência de denúncias e as ocorrências”.
Segundo Ricardo Bramão, a perceção é de que “nada de grave” tem acontecido em matéria de agressões e abusos sexuais. Apesar disso, os intervenientes evitam falar “tanto sobre o que fazem, como sobre o que não fazem” em matéria de segurança.
“Achamos que é um assunto tabu, que existe pouca abertura para ser debatido. Por isso, queremos que seja discutido não como um problema existente, mas numa perspetiva de prevenção”, refere.
A Aporfest pretende voltar a lançar o debate a partir de setembro e também na próxima edição do Talkfest, depois de passar a época alta deste tipo de eventos.
A ameaça terrorista é outro dos pontos que a associação quer pôr na agenda de promotores e autoridades, sobretudo depois de o alvo de um dos atentados do ISIS, na Europa, ter sido, precisamente, um espetáculo musical. O ataque de 13 de novembro de 2015, ao concerto dos Eagles of Death Metal, no Bataclan, em Paris, fez 90 mortos.
Foram tomadas algumas medidas, em Portugal, para reforçar a segurança neste tipo de eventos, mas, segundo a Aporfest, é preciso aprofundar mais esse tema.
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