Zara e H&M pedem mais esclarecimentos após denuncia de uso de algodão do Brasill

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[Fotografia: Pexels/Magda Ehlers]

Zara solicitou que fossem partilhados, o “mais rapidamente possível, o resultado da investigação independente que foi levada a cabo e as medidas necessárias para garantir a certificação do algodão sustentável que respeite os mais elevados padrões”. Em comunicado, a gigante espanhola Inditex afirma levar a sério as alegações contra a Better Cotton”.

Também a H&M, visada nesta investigação que associa produção de algodão alegadamente sustentável no Brasil, à desflorestação ilegal, apropriação de terras, violência e corrupção no Brasil, pediu acesso a mais dados, considerando estas “conclusões do relatório da Earthsight altamente preocupantes” e que devem ser levadas a “sério”. A marca sueca garante que a “Better Cotton iniciou uma investigação de terceiros” e diz estar em diálogo com esta label para “acompanhar o resultado da investigação e os próximos passos que serão dados para fortalecer e rever ainda mais os padrões”.

A investigação divulgada esta quinta-feira, 11 de abril, analisa o grande desenvolvimento da produção brasileira de algodão, para exportação, e segue o destino de mais de 800 mil toneladas desse algodão, contaminado, mas certificado, para empresas na Ásia, onde é transformado em peças de roupa para as marcas venderem depois especialmente na Europa.

As acusações são da organização não-governamental britânica de investigação “Earthsight”, que utiliza a investigação aprofundada para denunciar crimes ambientais e sociais, injustiças e ligações ao consumo global.

A “Earthsight” revela, no extenso trabalho a que a Lusa teve acesso, que passou mais de um ano a analisar imagens de satélite, decisões judiciais, registos de embarque, e a ir disfarçada a feiras comerciais globais para localizar e seguir esse algodão.

Produzido no Cerrado brasileiro por duas grandes empresas (que negaram qualquer ilegalidade), o algodão foi vendido entre 2014 e 2023 a oito fabricantes de vestuário em países como a Indonésia, o Paquistão ou o Bangladesh, fornecedores da Zara e H&M.

As fazendas de algodão em causa, diz a investigação, têm um longo historial de processos judiciais, casos de corrupção, desmatamento ilegal de 100 mil hectares de terra e apropriação indevida de terrenos no Cerrado, uma região que cobre um quarto do Brasil e abriga 5% de todas as espécies do mundo, incluindo tatus e papa-formigas.

m 2030, o Brasil deverá ultrapassar os Estados Unidos como maior exportador de algodão do mundo, segundo o documento. Esse crescimento do algodão levou ao declínio das comunidades tradicionais.

A “Earthsight” fala de uma “mistura ruinosa de corrupção, ganância, violência e impunidade”, que levou ao desvio de terras públicas e à apropriação de terras das comunidades locais, que são sujeitas a intimidação e roubo de gado.

As empresas e os consumidores na Europa e América do Norte estão a impulsionar o desmatamento, invasão de terras e violações dos direitos humanos de uma nova forma, “não pelo que comem, mas pelo que vestem”, diz a “Earthsight”, que nota que nem a H&M nem a Zara compram o algodão diretamente aos produtores.

“Todos os anos, milhares de milhões de litros de água doce são desviados para campos de algodão, que são encharcados com 600 milhões de litros dos pesticidas mais venenosos”, diz a ONG, que deixa ainda outra denúncia sobre a certificação do algodão.

É que, segundo a “Earthsight”, todo o algodão contaminado foi certificado como sustentável pela “Better Cotton”, uma entidade que diz ser o maior programa de sustentabilidade do algodão a nível mundial e que tem como missão ajudar as comunidades a prosperar protegendo e restaurando o ambiente.

A “Earthsight” diz que a maioria dos produtos da H&M e da Zara são fabricados com algodão como selo “Better Cotton”, uma empresa que tem sede em Genebra e em Londres, e que no passado foi várias vezes acusada de ‘greenwashing’ (divulgação de falsas práticas sustentáveis através de ações de ‘marketing’), secretismo e incumprimento da proteção dos direitos humanos.

Mas ainda assim o diretor da “Earthsight”, Sam Lawson, deixa um aviso: “Se tem roupa de algodão, toalhas ou lençóis da H&M ou da Zara, é bem possível que estejam manchados pela pilhagem do Cerrado. Estas empresas falam de boas práticas, de responsabilidade social e de sistemas de certificação, afirmam investir na rastreabilidade e na sustentabilidade, mas tudo isto parece agora tão falso como os arranjos das suas montras”.

A associação lembra que há várias leis para regular as cadeias de abastecimento, fala de regulamentos da União Europeia sobre sustentabilidade e desflorestação que não abrangem o algodão. E diz que os maiores culpados da situação são os maiores mercados consumidores.

A União Europeia é o maior importador de vestuário do mundo, seguida pelos Estados Unidos.

com Lusa