Hoje é o dia mais triste do ano – mas estar triste também é saudável

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Esta segunda-feira, dia 20 de janeiro, assinala-se a ‘Blue Monday’, dia a que os países do hemisfério norte, sobretudo anglo-saxónicos, começaram a considerar como sendo o mais triste do ano. É, geralmente, a terceira segunda-feira desse mês.

E, apesar de a data ser recente (assinalada desde 2005), o que é certo é que há muito que o primeiro mês do ano é associado a tristeza e a depressões. E há razões psicológicas que o sustentam.

“Janeiro, tradicionalmente, é um mês muito difícil porque está exatamente no meio do inverno”, começa por explicar, ao Delas.pt, Ana Cardoso de Oliveira, psicóloga, que colaborou com a artista Sónia Baptista, na performance Triste In English from Spanish.

Ainda que com o primeiro mês do ano os dias comecem a ser mais longos e a ter mais luz – uma realidade que se verifica mais na Europa do sul – “é um mês sem festas”, que se segue à azafama da quadra natalícia e do réveillon.

“Depois daquela euforia, na verdade, as pessoas ficam mais resguardadas, está muito frio e é um mês em que as pessoas estão mais doentes porque vieram mais cansadas de dezembro”. Além disso, refere a psicóloga, é também em janeiro que as pessoas aproveitam para fazer uma “reflexão” sobre as suas vidas.

“Há uma pressão enorme para sermos todos mais parecidos e alegres e o que acontece é que se a pessoa não se sente alegre é um horror”, Ana Cardoso de Oliveira

A partir do final do mês, diz a psicóloga, a motivação começa a mudar, porque as pessoas começam a preparar-se para a chegada da primavera, mesmo que ainda tenham de enfrentar mais umas semanas de inverno.

Mas há condicionantes mais práticas que fazem de janeiro uma altura favorável a estados de alma mais deprimidos e as finanças são uma delas. “Em janeiro, as pessoas também têm menos dinheiro, e as despensas (mais tradicionais) também estão mais vazias, porque estão a acabar os produtos que se armazenaram, que as pessoas fazem, como compotas e conservas”. E esse não é apenas um ritual no norte da Europa ou sem sítios recônditos do velho continente.

Basta afastarmo-nos dos grandes centros urbanos do país, para os rigores do inverno serem sentidos de outra forma.

“Trabalho na Avenida de Roma [em Lisboa], mas atendo pessoas de todo o lado e tenho uma pessoa de perto de Arganil, que não sai de casa durante o inverno, sobretudo naqueles invernos com mais neve, porque [o clima] é muito hostil”, exemplifica Ana Cardoso de Oliveira.

E apesar de Portugal ser um país do sul da Europa, é um dos que apresenta maior mortalidade associada ao frio, sobretudo pela má eficiência energética das casas, que as torna particularmente frias. E isso tem impacto não só na qualidade da saúde física, mas também mental das pessoas.

“O desconforto físico traz também desconforto psicológico”, assinala, e os portugueses acabam por se refugiar em casa, nos meses de frio, mesmo que as condições das habitações não sejam as melhores para o combater. Por outro, temos “temos uma grande restrição psicológica de viver a natureza no inverno e uma tradição de muito fechamento e isolamento familiar”, que se verifica, particularmente, nesta altura do ano.

O direito à tristeza

Apesar de tudo, estar triste não deve ser repudiado. Pelo contrário, do ponto de vista psicológico, a tristeza também contribui para o nosso equilíbrio e bem-estar.

Como refere Ana Cardoso de Oliveira, “a tristeza pode ser circunstancial, reativa ou exterior a uma perda, a um luto ou a uma expectativa gorada”. Mas também “pode ser uma tristeza interna, em que aumentamos a consciência e o nosso autoconhecimento”.

Este aprofundamento da relação com nós próprios passa, em grande parte, pela vivência da tristeza, como sublinha a psicóloga. “Temos saudades do que aconteceu, do que já se perdeu, em que estamos tristes por já não ser a pessoa que éramos.” Faz-se uma espécie de luto, como aponta Ana Cardoso de Oliveira, mesmo que, externamente, esses momentos não sejam entendidos como necessários e que a pressão para se sair desse estado de humor seja grande. Ou seja, “temos de ser alegres, de falar mais, de sair mais, temos de reagir”, exemplifica. Daí que a psicóloga fale do direito à tristeza.

“Esse direito à tristeza significa que, para as pessoas serem verdadeiramente felizes, com saúde interna e com o crescimento adequado, têm que ter esse direito e quando estão nesse estado mudarem-no de dentro para fora, e não de fora para dentro.”

Essa imposição externa pode até ser contraproducente e levar ainda uma maior frustração, prolongando o estado de tristeza.

“Há uma pressão enorme para sermos todos mais parecidos e alegres e o que acontece é que se a pessoa não se sente alegre é um horror”, aponta a psicóloga, acrescentando que a tristeza “é uma alavanca de crescimento e de transformação”.

É preciso, no entanto, não confundir tristeza com depressão. “A tristeza é saudável, só passa a ser doença quando deixa de ser tristeza para passar a ser a não vontade de viver, quando se está com astenia, desmotivado, quando a vida não faz sentido e não há um propósito. Aí é preocupante”, conclui.