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Chong Kwong: “Não sou suficientemente preta, não sou branca nem asiática. Estou ali no meio”

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Vanessa Pires nasceu na Cova da Moura e cresceu entre a Damaia, Cacém e o Barreiro. Com o pai ligado a uma produtora de música africana, cedo começou a ouvir os ritmos quentes e dançáveis, mas foi o rap que a conquistou durante a adolescência.

Hoje com 31 anos, sete anos depois de ter deixado a música em stand by para trabalhar na área de organização de eventos e juntar dinheiro, volta a apostar no seu maior sonho. Foi à árvore genealógica buscar o nome do bisavô, Chong Kwong, para usar como nome artístico e está a trabalhar num projeto em que junta as suas influências portuguesas, africanas e asiáticas.

O primeiro single, também com o nome de Chong Kwong, foi lançado no final do mês de março e é uma espécie de apresentação da artista, que logo nos primeiros versos diz que está de regresso ao rap. A música mais recente, Não Te Convidei, saiu há um mês, mas até ao final do ano a artista deve lançar o primeiro álbum.

Para já marca presença em alguns dos maiores festivais de música a nível nacional. Em julho esteve no NOS Alive e esta sexta-feira atua no Meo Sudoeste.

De onde surgiu o seu gosto pela música?

O gosto pela música surgiu da minha família, em casa ouvia-se muito. Depois com 12 anos comecei a ouvir mais rap e hip hop e quando comecei a passar mais tempo no Cacém e Barreiro escrevi as primeiras letras.

Não tem músicos na família?

Tenho o lado do pai, ligado à música africana. Ele é dono de uma produtora e desde muito nova que ouço música africana, mas neste momento não há músicos na família sem ser eu.

Como veem este seu regresso à música em força?

O que mais gosto é poder trabalhar com a minha família também. Nos dois videoclipes que lancei este ano trabalhei com o meu primo e trabalhar com a família é sempre um bónus, há um apoio extra. No início estranharam um pouco porque não é muito normal dedicarmo-nos ao rap.

Porquê o rap? A sua ligação à música africana podia tê-la levado por esse caminho…

O meu flow no rap também tem muita influência da música africana, era inevitável. Neste álbum que estou a preparar vão notar essas influências africanas e asiáticas. Já dá para notar nestes dois singles que lancei, principalmente no ritmo, a parte mais dançável.

É portuguesa e afro-asiática. De onde vem toda esta multiculturalidade?

Nasci cá, a minha mãe é moçambicana, o meu pai cabo-verdiano, o meu avô timorense e a minha avó chinesa.

Sente ligação com a cultura asiática?

Sinto. Em minha casa, no Natal, comemos bacalhau, mas também comemos cachupa e pratos chineses. Também já tive oportunidade de viver em Macau e Hong Kong, por isso conheço bem a cultura.

Acha que pode vir a conquistar público nesses países?

Desde muito pequena que sinto que não pertenço a um determinado sítio. Não sou suficientemente preta, não sou branca nem asiática. Estou ali no meio. Sempre senti essa diferença na escola, não pertencia a nenhuma dessas referências e pensava muito nisso. Daí este projeto ser uma mistura tão grande de culturas.

Porquê o nome Chong Kwong?

É um nome de família, do meu bisavô.

Ainda só lançou dois singles mas já está confirmada em três dos maiores festivais nacionais: NOS Alive, Meo Sudoeste e Beat Fest. Esperava que tudo acontecesse tão rápido?

Não, para mim foi uma surpresa. Encaro como pequenas conquistas para ir mostrando a minha arte. Sou independente, não tenho editora, o que faz com que o orgulho seja a dobrar. Há uns anos estive a fazer música, depois parei e estive a trabalhar durante algum tempo num emprego das 9h00 às 17h00.

O que fazia?

Estava ligada à organização de eventos, marketing e produção.

Agora está dedicada à música a 100%.

Sim. Disse à minha mãe: “É agora.” Claro que obviamente o tempo em que estive a trabalhar permitiu-me juntar dinheiro para agora investir na música, isto é o meu bolo. Não deixa de ser sempre um futuro incerto, mas entre estar a trabalhar em algo de que não gosto e apostar num futuro incerto, prefiro assim.

Sente que este percurso está a ser muito mais difícil por ser independente?

Não necessariamente. É uma pescadinha de rabo na boca. As editoras só olham para nós quando temos um número para mostrar, seja de visualizações ou de fãs, mas é preciso trabalhar muito para chegar aí. Sou super a favor da independência. Temos de ter a palavra final sobre aquilo que é o nosso produto. É importante percebermos, por nós, as dificuldades que existem no meio. Damos aquilo que temos e no final do dia é nosso. É quase como um investidor de uma empresa que quer crescer e fazer dela uma coisa séria.

Até porque assim pode definir o seu próprio estilo sem ter de corresponder a exigências.

Exato e isso é uma coisa que definimos, que difere de artista para artista. No meu caso, aprendi a gostar da minha visão e a negociar, a ver o que é melhor para mim enquanto artista e pessoa.

Que expectativa tinha quando estava em estúdio a preparar estas duas músicas que lançou agora?

Acho que nunca sabemos como vai ser a reação do público. Podemos estar com as expectativas elevadas e depois não dar nada ou acontecer o contrário. Tento concentrar-me no processo de criação e não pensar muito nisso, para não ter as expectativas demasiado altas. Quero que seja uma coisa com a minha marca e não excessivamente comercial. Ser comercial é sempre o objetivo, mas não devemos mudar aquilo que somos. Assim, supostamente, o caminho é mais longo, mas não faz mal.

Este ano temos visto muitas mulheres a aparecer a cantar rap em Portugal. Além de si, a Nenny, por exemplo, está a ter um sucesso incrível com ‘Sushi’. Na sua opinião, o que está na origem deste fenómeno?

O hip hop neste momento, em Portugal, está a sair da adolescência e a entrar na fase adulta. Já tem maturidade suficiente para que se criem outros estilos dentro do próprio hip hop. Termos mais rappers, sejam homens ou mulheres, é bom, positivo e deve ser visto com normalidade.

Para quando prevê o lançamento do álbum?

Este ano. Está quase concluído, tenho apresentado algumas das músicas nestes concertos pelos festivais.

Que temas vai abordar nas suas músicas?

O álbum vai ser muito pessoal, mas com temas e problemas que nos tocam a todos. Coisas que vivi e que quero partilhar porque do outro lado há, de certeza, alguém que já passou pelo mesmo que eu. É importante haver essa proximidade e empatia entre o artista e o público.

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