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Como contar aos seus filhos que tem uma doença grave

Percorra a galeria e fique a conhecer as recomendações deixadas pelas psicólogas clínicas Filipa Jardim da Silva e Inês Afonso Marques ao Delas.pt [Fotografias: Shutterstock]
Ambas especialistas vincam que as crianças, independentemente da idade, pressentem alterações na família e percebem muito cedo que algo está diferente. Recomendam o uso de linguagem clara e adequada a cada idade.
“Até aos 2 anos, deve procurar explicar-se a situação numa linguagem simples e tranquilizadora, assegurando-lhes que não vão ser abandonadas (o maior medo)”, refere Filipa Jardim da Silva, que recomenda o uso, se necessário, de “um boneco para fazer a demonstração”. E acrescenta: “Em situações de hospitalização, a criança pode ter a oportunidade de visitar a mãe para manter o contacto".
Entre os 3 e os 6 anos, Filipa Jardim da Silva lembra que “as crianças já compreendem melhor a doença, até porque já estiveram doentes, associando-a a ficar em casa”. Por isso, basta “uma comunicação clara, com palavras simples, que a ajude a compreender concretamente o que vai acontecer e mudar eventualmente na dinâmica familiar, assegurando que não se culpabiliza”
Dos 7 aos 12, a psicóloga clínica vinca que “já existe uma capacidade de compreensão acrescida acerca das implicações da doença e um pensamento menos egocêntrico, pelo que é menos provável que a criança se considere responsável pela situação”. Filipa Jardim da Silva recomenda até o uso de “livros adaptados à idade da criança”.
Daí em diante, já na adolescência, recomenda-se o uso de “terminologia mais exata”, considerando que “é importante não sobrecarregar o jovem com informação excessivamente detalhada ou com responsabilidades acrescidas, afinal ainda não existe o equilíbrio psíquico e a maturidade emocional de um adulto”.
Para Inês Afonso Marques há, para lá da idade, o fator da maturidade. A necessidade de “se ajustar o vocabulário de modo a que a informação seja compreensível”. Sublinha ainda que “o mais importante é que haja sempre espaço para o diálogo, para que a criança expresse o que pensa e sente”.
Esta especialista, coordenadora da área infanto-juvenil da Oficina da Psicologia, lembra que “a partir dos 2/3 anos a criança começa a compreender o conceito de doença, sendo mais fácil usar o termo para explicar o que se está a passar”. Sublinha que é “fundamental” preparar a criança “para quaisquer mudanças temporárias (como ausências da mãe) que tenham que ocorrer”.
Já no caso de filhos mais velhos,esta psicóloga clínica recomenda outras soluções. “Nas crianças em idade escolar, os livros podem ser um aliado no momento de explicar o que se está a passar. Os adolescentes terão um entendimento mais próximo de um adulto”, refere Inês Afonso Marques.

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Tenho uma doença grave, e agora? Muitas vezes, muito além da má notícia, há a preocupação e a decisão acrescida de revelar à família o problema. E o maior dilema diz respeito aos mais novos: deve-se ou não pôr os filhos a par do que se está a passar?

No mês em que se assinala a luta contra o cancro da mama, o Delas.pt foi ouvir psicólogas, com trabalho desenvolvido na área infantil e juvenil, para perceber se há melhores maneiras de revelar aos filhos uma tragédia desta natureza ou similar e se há técnicas mais indicadas consoante as idades. Na galeria acima encontra algumas ferramentas que podem ajudar a simplificar um caso que é sempre complexo.

Para as psicólogas clínicas Filipa Jardim da Silva e Inês Afonso Marques, coordenadora da área infanto-juvenil da Oficina da Psicologia, esconder nunca é a melhor solução, até porque as crianças percecionam, desde muito pequenas, todas as alterações que têm lugar no seio do lar.

Psicóloga clínica Filipa Jardim da Silva [Fotografia: DR]
Há, contudo, regras – pequenos detalhes – que devem ser acautelados na hora de tocar um assunto tão sensível como a doença. “Uma mãe ou um pai deverão optar sempre por falar com os seus filhos e criar espaço também para ouvi-los”, diz Filipa Jardim da Silva.

Esta psicóloga clínica e coach profissional ressalva não existir “uma receita standard sobre a melhor forma de explicar a doença a uma criança”, mas pede-se, então, tranquilidade, alguma contenção nos pormenores e criação de espaços para que as crianças exponham as suas dúvidas. Filipa alerta ainda para a necessidade de se “prestar atenção a alterações de comportamento ou humor que possam surgir no período seguinte”.

Inês Afonso Marques [Fotografia: Oficina da Psicologia]

Inês Afonso Marques pede uma avaliação inicial do caso: “Tudo dependerá do tipo de doença e também da idade da criança. Assumindo doenças crónicas que poderão ter algum grau de interferência na vida das famílias, faz sentido que seja passada alguma informação às crianças para que compreendam essas interferências – muitas idas ao hospital, internamentos, alterações no corpo ou falta de energia, por exemplo, serão aspetos que dificilmente passarão despercebidos às crianças, mesmo que pequeninas, sendo pertinente enquadrar aquilo que observam e experienciam.”

Regra de ouro: Evitar o “não fiques triste”

Uma má notícia gera sempre, consoante as idades, algumas reações às quais os pais devem estar atentos. Há, porém, frases que devem sair do léxico dos pais numa circunstância desta natureza. “Quaisquer que sejam os sentimentos espera-se que os adultos funcionem como uma base de segurança”, alerta Inês Afonso Marques, que pede: Evitar verbalizações como: Não fiques triste. A mãe não te pode ver assim. Tens de estar bem. Controla-te. Não chores”. A psicóloga clínica considera ainda que “é importante que o adulto valide todos os estados emocionais que a criança manifesta”.

Abrir espaço para o diálogo reveste-se, para ambas especialistas, da máxima importância. “É comum e adaptativo as crianças sentirem um conjunto de sentimentos variados, desde a zanga à tristeza, culpa, medo e frustração, depois de terem conhecimento da situação e ao longo do processo. Abrir espaço à expressão dos mesmos sem repressão nem julgamento é fundamental”, afirma Filipa Jardim da Silva. Inês não podia concordar mais: “Um primeiro passo importantíssimo para ajudar as crianças a conhecerem as emoções e a gerir emoções desafiantes é dar-lhes espaço para que as expressem, sem críticas ou invalidações. Mas, também, sem que haja pressão para que falem, partilhem.”

“É pertinente articular com a escola, uma vez que frequentemente o rendimento pode ser afetado”, alerta Filipa Jardim da Silva

Filipa acrescenta até que é importante ver outros maiores de idade a entrarem nesta arena delicada. “Nesta fase, outros interlocutores adultos assumem um papel importante a apoiar a criança a ventilar estas emoções mais intensas e a reciclá-las em contextos e atividades variadas”. A coach profissional lembra que é, por vezes, necessário convocar e alertar outras entidades. “Muitas vezes, é pertinente articular com a escola, uma vez que frequentemente o rendimento pode ser afetado e os agentes educativos podem constituir um elemento adicional de suporte nesta etapa de vida”, acrescenta.

Ir dando explicações ou ficar-se pelo silêncio?

Uma doença – sobretudo as mais graves e as crónicas – passam a fazer parte do quotidiano da família e vêm, infelizmente, para ficar muito tempo. Ao Delas.pt, ambas psicólogas clínicas revelam que é importante ir dando conta aos mais novos da evolução do caso, garantindo que a segurança e a presença são fatores absolutamente inquestionáveis e fiáveis para os filhos. Mas, sempre com conta, peso e medida.

“Sim, devem dar-se explicações ao longo do processo”, atesta Inês Afonso Marques. Ora, tal deve ter lugar porque, entende a psicóloga clínica, “isso ajudará a criança a compreender todas as mudanças que vão ocorrendo à sua volta, no seu contexto físico e emocional. Mas não necessariamente explicações ‘a toda a hora’, nem demasiado detalhadas”, salvaguarda.


“Não se devem dar necessariamente explicações ‘a toda a hora’, nem demasiado detalhadas”, recomenda Inês Afonso Marques

Filipa Jardim da Silva adita: “É importante garantir-se que as crianças estão securizadas o suficiente, pelo que consoante a evolução do tratamento e implicações do mesmo, não só se poderá ir legendando o que vai acontecendo para que nada seja mal interpretado”. Afinal, refere esta especialista, “o isolamento e a falta de comunicação tenderão sempre a gerar mais sofrimento e instabilidade do que o diálogo em família”.

Imagem de destaque: Shutterstock

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