Como explicar a morte às crianças

Beautiful mother is comforting her sad little daughter at home.
[Fotografia: Istock]

Numa altura em que os mais velhos estão recolhidos devido à necessidade de estarem protegidos da pandemia por Covid-19, distantes da família e, em particular, dos netos, e se multiplicam as notícias sobre o número de mortos em Portugal e no mundo devido ao novo Coronavírus, como explicar aos mais novos esta dura realidade?

De facto, todos os dias entram em casa novos dados estatísticos sobre as baixas provocadas pela pandemia, novas indicações de como lidar com os idosos, não sendo raras as perguntas das crianças.

Manuel Mendes Silva editou o livro A Morte Explicada aos Mais Novos, que pretende ajudar pais e educadores a responder à difícil pergunta sobre o que é a morte e ainda antes de a pandemia nos confrontar a todos como essa realidade ainda mais presente no dia-a-dia. Na obra, o médico fala desta dimensão humana através da história de Maria, uma menina de nove anos, que acaba de perder a avó.

Abaixo veja algumas recomendações deixadas no livro por idades das crianças, mas antes ainda é tempo de perceber como surgiu esta iniciativa e o que explicar em tempos tão extraordinários como este que o mundo está a viver: o de uma doença mortal global.

Para além da pandemia, em todas as circunstâncias se deve explicar a morte, como outros assuntos, mesmo que difíceis, como a sexualidade”, reitera o autor e médico. Para Manuel Mendes Silva, “esta pandemia está a fazer que todos, adultos e crianças, se apercebam da fragilidade humana e da relatividade de valores que eram muito prezados e que estão postos em causa”. Por isso, reitera o especialista, é tempo de olhar para “as dificuldades da vida, a doença, a morte, que estão muito mais presentes nesta época, associando o maior tempo livre e maior permanência com as crianças” e fazendo com que esta seja “uma boa ocasião para se falar sobre o assunto”. “E também oportuna pois é muito provável que possa morrer algum familiar, amigo, ou pelo menos conhecido”, acautela.

Morte livro crianças Coronavírus Covid-19
[Fotografia: DR]
Ao Delas.pt, o especialista espera “que o livro seja entendido pelos pais e educadores como um aviso e uma ajuda para lidar com um assunto difícil, que tentamos ‘por de lado”. Quanto aos mais novos, Mendes Silva quer passar a “mensagem de que vida é um dom, que começa e tem de acabar. É muito bonito quando as pessoas aproveitam o dom da vida, quando têm alegria, são boas e praticam o bem.”

A ideia para este projeto, conta o autor, surgiu há já alguns anos. “Há uma dúzia de anos o meu neto mais velho, na altura com seis anos, na programação das nossas visitas periódicas, pediu-me para o levar a um cemitério. Senti a importância de lhe explicar esse assunto difícil que é a morte, e de o resolver comigo mesmo antes de lho ensinar. Com o tempo fui levando os outros netos ao cemitério, como também os levava aos museus, aos parques, aos espetáculos, ou a andar a cavalo”, recorda o autor do livro e médico Manuel Mendes Silva ao Delas.pt. “Senti o apelo de estender às outras crianças estas explicações e propus à editora Booksmile um livro sobre este tema difícil, na sequência do meu anterior livro A sexualidade explicada aos mais novos sobre outro assunto embaraçoso.”

Veja abaixo um excerto das recomendações deixadas a pais e educadores. Conselhos que estão definidos e balizados pelas faixas etárias das crianças.

Até aos três anos: “As crianças com esta idade não têm ainda capacidade para compreender a morte. Quando a morte acontece na família ou a amigos próximos, estas crianças devem ser afastadas do corpo e das cerimónias, e deve ser-lhes explicado que a tristeza e o choro dos familiares e amigos se devem ao afastamento da pessoa morta”.

Dos quatro aos seis anos: “Estas crianças poderão já compreender aspetos muito básicos da morte. Poderão, conforme as suas caraterísticas, assistir a um ou outro cerimonial, mas não devem ver o corpo morto, ou somente em condições não impressionáveis, como o caixão fechado. Há que evitar os medos e receios que possam surgir por uma eventual morte que possa acontecer a outro ente querido.”

Dos sete aos nove anos: “Estas crianças já poderão compreender os aspetos básicos da morte (que é inevitável, irreversível e que tem uma causa), que lhe devem ser explicados. Somente se o quiserem, podem ver os corpos mortos das pessoas queridas. Poderão, conforme o seu desenvolvimento mental e emocional, acompanhar as cerimónias fúnebres e ir ao cemitério se assim o desejarem. Há que lhes explicar o que é explicável e confortar o que é confortável, respeitando a sua sensibilidade e suscetibilidade individual.”

Com mais de dez anos: “Estas crianças poderão já ser equiparadas a adultos, apenas devendo haver bom senso e respeito na transmissão de más notícias e adequação de comportamentos à sua sensibilidade e suscetibilidade individual.”

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