Publicidade Continue a leitura a seguir

Denúncias de assédio sexual “apenas no começo”, diz diretora da ONU Mulheres

Percorra a galeria e conheça algumas das conclusões do estudo levado a cabo pela Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Uma investigação liderada por Joanna Goodey e que entrevistou, cara a cara, 42 mil mulheres nos 28 estados membros. Resultados publicados em 2014, mas que agora são importantes voltar a lembrar. [Fotografias: Shutterstock]
83 a 102 milhões. Este é o número de mulheres mínimo e máximo que, neste estudo da Europa a 28 diz ter vivido um episódio de assédio sexual, de menor ou maior gravidade, desde os 15 anos. Só ano em que durou o estudo, foram 24 a 39 milhões as mulheres a relatarem isso mesmo. Contas médias, os autores do estudo vincam que uma em cada cinco mulheres foi confrontada com toques indesejados.
Entre as mulheres que foram vítimas de assédio sexual pelo menos uma vez desde os 15 anos, 32% afirma que tal teve lugar em contexto laboral, fosse, então, perpetrado por um colega, pelo patrão ou até pelo cliente.
6% das mulheres inquiridas foi alvo de seis episódios de assédio sexual desde os 15 anos.
De definição ampla, o assédio sexual pode chegar de múltiplas formas: 29% das mulheres inquiridas revelou ter sido alvo de toques e até abraços e beijos indesejados (desde os 15 anos); 24 % fala em atos verbais como comentários sugestivos ou piadas de cariz sexual; 11% reporta casos de assédio por via da internet (sms, redes sociais, e-mails).
A faixa etária mais exposta ao assédio sexual compreende as mulheres que têm entre 18 e 39 anos. As que têm até 29 anos, têm o dobro da probabilidade de serem vítimas pela net do que a faixa etária que se lhes segue.
68% das mulheres vítimas de assédio desconheciam, até à data do episódio, o agressor.
Mulheres com estudos superiores e com altos cargos foram vítimas preferenciais de assédio, pelo menos uma vez na vida. Falamos de 75%. Só pouco mais de 40% das mulheres que trabalha no setor primário declarou ter sido alvo da prática.
Raramente, as mulheres fazem queixa ou falam sobre isso. 35% das mulheres que experienciou casos graves de assédio sexual, nunca o disseram a ninguém; 28% revelou o incidente a amigos; 24% contou à família ou a um parente próximo e 14% disse ao parceiro. Apenas 4% das mulheres apresentaram queixa na polícia e 1% consultou um advogado ou denunciou o caso a entidades.
Uma em cada três mulheres - 33% - foram confrontadas com um episódio de violência física ou sexual desde os seus 15 anos de idade. E uma em cada cinco foi alvo de perseguição. Uma em cada duas mulheres (55%) foi confortada com um ou mais episódios de assédio sexual.
Uma em cada 20 mulheres (5%) foi violada desde os 15 anos.
Terão sido cerca de 13 milhões as mulheres da União Europeia que viveram um episódio de violência física durante os 12 meses que a investigação durou. 3,7 milhões de mulheres foram alvo de um episódio de violência sexual em igual período.
Apesar destes números, o número de mulheres que apresenta queixa às autoridades ou às instituições que as podem apoiar continua a ser diminuto. Apenas um terço que foi vítima do parceiro relata às autoridades ou insitutições de apoio e apenas um quarto, 26%, das que foram vitimizadas por alguém que não parte do casal.
Quando perguntado que tipo de ajuda quereriam estas mulheres, elas pedem, em primeiro lugar, alguém com quem conversar e que as apoie ( entre 33 r 54%, consoante a violência do crime de que fora alvo). Em segundo lugar, querem proteção (12 a 25%) e, em terceiro lugar, procuram ajuda no sentido mais prático possível (12 a 21%).
18% das mulheres, nos 28 Estados-Membros, foi vítima de perseguição, no âmbito da violência sexual, desde dos 15 anos. 5% delas tinha vivido isto mesmo durante os 12 meses em que decorreu o estudo. Falamos, então, de nove milhões de mulheres (o que equivale dizer que é quase a população portuguesa toda).
Cerca de 14% das mulheres recebeu mensagens ou chamadas ameaçadoras ou ofensivas da parte da mesma pessoa, repetidamente. 3% fala de danos patrimoniais na sequência daqueles comportamentos persecutórios. 4% das mulheres com idades entre os 18 e os 29 anos foi alvo de perseguição através da internet durante os 12 meses do estudo.
Uma em cada dez mulheres terá sido perseguida pelo seu anterior companheiro.
74% dos casos de perseguição - ou seja, três quartos - não chega a ser reportado às autoridades.

Publicidade Continue a leitura a seguir

A diretora executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, considerou que a avalancha de denúncias de assédio sexual que atinge o mundo do cinema, da música ou televisão nos Estados Unidos está “apenas no começo”.

Em entrevista à agência de notícias francesa AFP, Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou que os comportamentos vão mudar depois de numerosas mulheres terem quebrado o silêncio para revelar as histórias ou expressar a sua vontade de ver o fim dos abusos.

“Isto está a apenas a começar, penso que vamos ver muito mais mulheres a falar”, sublinhou a responsável da ONU, acrescentando: “Elas querem exprimir-se cada vez mais”.

A antiga vice-presidente sul-africana, que defende a igualdade de género na ONU desde 2013, afirmou que, ao mesmo tempo, o ponto de viragem para uma mudança radical de comportamento ainda não foi alcançado.

“Ainda não há pessoas suficientes a pensar” que esses abusos representam “um profundo trauma e uma dor interminável para muitas mulheres”, sustentou.

Nas últimas semanas, centenas de mulheres denunciaram comportamentos passados ou atuais de figuras conhecidas do mundo do cinema, da política ou do jornalismo.

Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou estar surpreendida por ver que, em vários casos, um mesmo homem foi acusado de abusos sexuais por diversas mulheres ou jovens.

“Ver que um mesmo homem é um assediador em série, que ocupa um cargo elevado, e que isso passou despercebido durante vários anos” mostra “uma verdadeira lacuna” no respeito pela aplicação de leis nos locais de trabalho, sublinhou Phumzile Mlambo-Ngcuka.

Segundo a responsável da ONU, a presença de um grande número de mulheres em cargos de direção podia ajudá-las a sair da sombra por “saberem que alguém do outro lado da mesa acreditaria nelas”.

Phumzile Mlambo-Ngcuka afirmou esperar que a vaga de denúncias galgue as fronteiras norte-americanas e vá além das atrizes de cinema.

“A tempestade tem sido perfeita, mas precisa de desenvolver-se para que outras mulheres, que não gozam de fama, possam encontrar também uma forma de cicatrizar e que os responsáveis de outros setores [da sociedade] sofram as consequências pelos seus atos”, observou.

Phumzile Mlambo-Ngcuka também expressou o seu desconforto relativamente ao “grande silêncio dos homens” que não levantaram a voz e não se distanciaram dos predadores sexuais, sublinhando “a importância de uma mudança de comportamento”.

Eles devem dizer “que nunca aceitarão assistir” a tais abusos e aqueles que os praticaram “comprometer-se a nunca mais o fazer”, vincou.

“É preciso que os homens reajam, que também se apropriem do problema, comprometendo-se a tomar medidas para resolvê-lo”, sustentou Phumzile Mlambo-Ngcuka, apontando que os responsáveis políticos dececionam ao afastarem-se do tema do assédio sexual, “talvez por terem medo de abrir uma caixa de Pandora”.

“Não há uma gestão forte” deste dossiê do assédio por parte das autoridades que detêm o poder, lamentou.

Dezasseis dias de ativismo devem arrancar no sábado, decretado Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra a Mulher.

Não existem dados mundiais sobre o assédio sexual, mas estudos europeus mostram que na União Europeia entre 45 a 55% das mulheres, com idade superior a 15 anos, são vítimas.

Imagem de destaque: Reuters


Veja mais:

Assédio sexual em Hollywood: a lista de vítimas é infindável

As mulheres são as maiores vítimas de assédio sexual e moral no trabalho