Dois apelos e duas medidas de Biden para contornar a lei que põe fim ao aborto nos EUA

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[Fotografia: Mandel NGAN / AFP]

O presidente dos Estados Unidos da América, Joe Biden, veio a público criticar sem meias palavras e de forma clara a reversão da lei federal que protegia o direito ao aborto, conhecida como Roe v. Wade, e que agora abre portas para que 26 estados – cerca de metade – com iniciativas legislativas para o proibir possam começar a fazê-lo já a partir desta sexta-feira, 24 de junho.

Aliás, cerca de uma hora depois da decisão do Supremo Tribunal dos EUA, o Missouri, estado de maioria conservadora, foi o primeiro a fazê-lo, com a assinatura da declaração por parte do procurador-geral do Estado, Eric Schmitt.

“Hoje é um dia sombrio”, afirmou e reiterou o chefe de Estado. “O tribunal fez o que nunca tinha feito, retirou expressamente um direito fundamental para tantos americanos e com consequências reais imediatas. As leis estaduais vão abolir o aborto e vão ter eficácia a partir de dia de hoje e por em risco a saúde de milhares de mulheres”, acrescentou.

Biden – que lembra que “a luta não terminou” – prometeu fazer tudo ao seu alcance para contornar esta decisão e avança com duas recomendações muito claras. “A única maneira que temos de garantir o direito das mulheres é que o congresso estabaleça a proteção como lei federal [Lei de Proteção da Saúde das Mulheres]. Nenhuma ação executiva do presidente pode ter lugar no congresso, mas os eleitores têm de fazer ouvir as suas vozes”, afirma. Lembrou que, “neste outono” (em novembro, com eleições para o congresso) “podem ser eleitos os representantes que podem proteger o direito a escolha”.

“Precisamos de restaurar a proteção desta decisão como lei do nosso país, temos de eleger os representantes que o façam. Até esse momento vou fazer tudo o que posso dentro da minha capacidade para fazer proteger os direitos das mulheres”.

Após este apelo, Biden lembrou que há ainda uma forma de contornar esta decisão com efeitos imediatos. “Se a mulher viver num estado com restrições ao aborto, a decisão do Supremo Tribunal não a impede de viajar para um estado onde o possa fazer. A lei impede um médico do estado que restringe de a tratar”, sublinhou e reiterou: “As mulheres têm liberdade de viajar em segurança para outro estado para obter os cuidados de que precisa. Nenhum funcionário estatal, vou deixar isso claro na minha administração, pode impedir o direito destas mulheres de viajarem para outro estado em busca da sua saúde. Vou fazer tudo para salvaguardar estas mulheres.”

O mesmo procurará fazer com as autoridades de saúde: “Vou pedir ao departamento de saúde para iniciar todas as ações possíveis para permitir acesso aos medicamentos necessários e já aprovados há anos, os políticos não podem intervir nas decisões entre as mulheres e os seus médicos”, sustentou.

Num terceiro momento, o presidente apelou a “todos para que mantenham as manifestações pacíficas e sem intimidação. A violência nunca é aceitável”, pediu. Biden prometeu vir de novo a público em breve para falar sobre um tema que, analisa, “vai aumentar a taxa de mortalidade das mulheres”.

Uma reversão da lei que, acrescenta, irá muito para lá do direito ao aborto. “Esta decisão vai por em risco o direito à privacidade, o direito de tomar a melhor opção para a nossa saúde, o direito ao controlo de fertilidade, o direito de casar com a pessoa que amamos, o direito de um casal fazer a escolha em termos de contraceção”, enumerou. Uma mexida numa lei com quase 50 anos que “põe em perigo e inicia caminhos onde nunca entrámos” e faz recuar os “Estados Unidos da América ao século XIX”.