O adeus de Júlio Torcato e o regresso a casa de Marques’ Almeida

O último dia de desfiles do Portugal Fashion inaugurou com uma passerelle a céu aberto às 11:30h. O calendário de sábado, 20 de outubro, abriu com o desfile de Marques’Almeida, um dos mais aguardados desta edição da semana de moda do Porto. O dia prosseguiu com os desfiles de Katty Xiomara, Nuno Baltazar, Luís Buchinho e outros nomes marcantes da moda portuguesa.

Marques’Almeida abriu o desfile ao som de fado para apresentar uma coleção repleta de referências portuguesas. Os bordados de Guimarães ganharam destaque em dois coordenados inspirados nas camisas brancas clássicas, enquanto as franjas inspiradas nos xailes fadistas surgiram em diversos coordenados. “Numa altura de tantas mudanças na marca, mas também em Londres, é instintivo olhar para as nossas raízes e perceber que é isso que nos segura em qualquer mudança que possamos fazer”, disse a dupla ao Delas.pt depois do desfile. Não faltaram ainda as gangas desfiadas que já fazem parte da assinatura da dupla, os brocados de flores e as malhas. Mangas de balão, cabedal, fechos e atilhos fizeram ainda parte da coleção mais cool desta temporada de Portugal Fashion. Marta Marques e Paulo Almeida apresentaram pela última vez em Portugal em outubro de 2013, na ModaLisboa. Voltar a desfilar em casa “é uma sensação maravilhosa sobretudo neste sítio incrível. Depois de estar tanto tempo fora é muito bom voltar a casa e estar perto da família”, confessaram os criadores.

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O dia seguiu com desfile de Katty Xiomara, que se inspirou em três mulheres. “Esta coleção é uma homenagem a três mulheres da área artística gráfica e até da decoração de interiores. O tema começou por explorar o trabalho de um artista masculino, o Furtonato Depero. Quando me envolvi no trabalho deste artista acabei por ir ter à Barbara, à Carmen e à Paula e acabei por construir a coleção com base no trabalho delas. Não uso nenhum trabalho delas diretamente mas sim a inspiração, com base nisso criei uma série de grafismos que são usados em toda a coleção e que nos convidam a ser arrojados e a seguir em frente”. Destacaram-se as peças de organza colorida, numa coleção com a assinatura desportiva e feminina da designer, bem como a paleta cromática alegre.

A música ‘Cálice’ de Chico Buarque – que quando foi cantada ao vivo pela primeira vez teve uma intervenção militar porque a letra tinha sido censurada – deu o mote à coleção de Nuno Baltazar que se inspirou no período da ditadura militar brasileira. O Brasil domado pela ditadura e os artistas que fizeram da sua arte uma arma de intervenção. Um paralelismo com a realidade contemporânea do Brasil que o designer confessou ter sido a parte mais difícil da coleção. “Quando me apercebi da contemporaneidade que esta coleção tem, foi muito duro do ponto de vista humano. Foi difícil estar a ler letras de músicas que podiam ter sido escritas agora e que estão na eminência de ser necessárias novamente e com o mesmo significado que tinham na altura”, contou Nuno Baltazar ao Delas.pt. O desfile abriu com um estampado que representava a censura e que se estendeu a várias propostas do desfile. A paleta cromática começou em tons de verde, passando pelo bege, dourado e preto. Para o final do desfile ficou reservado o vermelho, roxo, laranja e rosa. O criador dedicou a coleção a Isabel Branco, coordenadora de desfiles do Portugal Fashion.

 

Luís Buchinho inspirou-se “na arte e na técnica do Gyotaku que é uma técnica japonesa, que surgiu em meados do século XIX, e servia para os pescadores registarem os seus troféus. Eles pintavam os peixes e imprimiam os desenhos num papel de arroz e assim ficavam com um registo fotográfico. Peguei nesse conceito, nas formas dos peixes e na multiplicidade das suas formas, cores, brilhos e as texturas que construí nos tecidos através dos acabamentos”, contou o criador ao Delas.pt após o desfile. Acabamentos esses que foram um dos pontos mais interessantes da coleção, desde os cortes a laser aos metalizados, e dos amachucados aos plissados desdobrados, que são conseguidos através de “três dobragens diferentes e depois vai tendo operações de selagem e depois aberto”. Estes tratamentos foram dados a tecidos planos, que só depois foram trabalhados para terem o aspeto com que surgiram na passerelle, através de um processo de construção notável. Dos acessórios destacaram-se as luvas e os cintos que completaram silhuetas, onde a mistura e materiais e assimetrias característica da assinatura Luís Buchinho marcaram presença.

Júlio Torcato apresentou o desfile mais emocionante da sua vida para celebrar os trinta anos de carreira e a última vez que apresenta uma coleção neste formato. “No formato de desfile convencional, esta apresentação foi a última. Isto abre o caminho para outras ideias mais conceptuais do que o formato de passerelle. Nos últimos tempos já não sentia paixão pelos desfiles. Eu amo a moda, amo desenhar moda, mas já não estava a sentir paixão pelo desfile. Era uma rotina que se estava a esgotar”, contou o designer ao Delas.pt. Esta foi uma coleção de trinta peças que foram resgatadas do arquivo do criador e entregues a trinta pessoas, que fizeram parte da carreira do estilista, e tiveram total liberdade para alterar as peças. Uma coleção feita por amigos que não só intervencionaram a moda de Júlio, como a desfilaram. Miguel Viana, Luís Pereira, Mariama Barbosa, Isabel Branco e Miguel Flor foram alguns dos nomes que fazem parte dos bastidores da moda mas que fecharam na passerelle esta 43ª terceira edição do Portugal Fashion. O destino destas peças especiais ainda não está definido porque para Torcato esta peças são tão suas como de quem as alterou, já que ele apenas forneceu a base, no entanto, o designer não descarta a hipótese de fazer uma exposição.

O último dia de desfiles do Portugal Fashion, que na totalidade dos três dias contou com cerca de 35 mil visitantes, contou ainda com os desfiles de Storytailors, Meam, Concreto, Shoes (Ambitious, Fly London, J. Reinaldo, Nobrand, Rufel e The Baron’s Cage), Luís Onofre, Pé de Chumbo (que contou com a presença de Cuca Roseta) e Alves/ Gonçalves.

Percorra a galeria acima para ver imagens dos desfiles deste último dia.

A exuberância sofisticada de Diogo Miranda e o regresso de Maria Gambina