Polémica: texto sobre sexo com vítima de violação incendeia a web

Um colaborador da revista online brasileira Trendr, que aborda temáticas culturais, de comportamento e sociedade, escreveu um texto em que conta a sua experiência com uma mulher que tinha sido vítima de violação anteriormente. Avisa que se trata de um conteúdo forte e pede desculpas por ter utilizado, para ilustrar o texto, a imagem – que pode ver abaixo – de uma mulher deitada num baloiço. Pouco tempo depois, reformulou o título para ‘Como foi me relacionar com uma vítima de estupro’ e alterou a fotografia de abertura do artigo. Esta era muito chocante:

imagem-perturbadora texto violação

O autor do texto e a mulher conheceram-se numa viagem e ela aparentava ser uma mulher forte: “Intimidava-me sem eu querer. Fazia-me sentir tonto demais, novo demais. Tudo sem querer.”


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Dois dias depois de se terem conhecido, resolveram ir passear para uma praia onde se foram envolvendo sexualmente. Quando os preliminares já estavam num estado avançado o homem, segundo relata, percebeu que a mulher não estava confortável com a situação.

“Foi quando a minha respiração ficou mais rara e a minha mão mais pesada que ela se arrepiou pela primeira vez. Não foi um arrepio bom. (…) Aquela reação podia ter milhares de motivos e só me restava tirar a mão e respeitar, seja lá qual fosse o recado que ela me estava a passar. Eu olhei para o rosto dela e vi tudo, menos prazer. Parecia deceção. E medo. E raiva. E nojo. E mágoa”, escreveu. Pouco tempo depois, a rapariga revelou que tinha sido violada e não fazia sexo há dois anos.

“Passei, então, a tomar os angustiantes arrepios dela como balizadores das minhas ações. Estava claro que ela não queria que eu parasse. Estava claro que ela não sabia como não me parar. E estava ainda mais claro que eu não fazia ideia de como lidar com aquilo. Segui com o cuidado e o despreparo da minha primeira vez. Mas com muito mais medo. (…) Cada movimento que eu fazia, claramente despertava nela o trauma da violação, revelava em mim o meu próprio violador”, recordou.

Para ultrapassar as recordações traumáticas, a rapariga pegou no telefone e pôs a tocar a música Dancing In The Moonlight, de Alt-J. Passou um dos headphones ao rapaz e deixaram-se levar pelo momento. “Enquanto fazíamos sexo, ela em cima e eu em baixo (isso nunca foi tão significativo), cheguei a pensar ‘eu estou a libertá-la’. Que narciso engano. Foi só reparar para perceber que ela se estava a libertar sozinha e tinha simplesmente permitido que eu fizesse parte desse momento”, afirmou o autor do texto.

Quando termina de relatar a história, explica que escreveu o texto por estar indignado com um estudo do instituto brasileiro de pesquisas Datafolha que revelou que uma em cada três pessoas culpa as mulheres pela sua própria violação.

“Evoluímos muito, mas a mulher ainda é um pedaço de carne (…) E o homem ainda é o cachorro faminto que baba enquanto observa. (…) Porque este texto demora em média sete minutos para ser lido e ainda te sobraram quatro antes da próxima violação”, acrescentou.

Texto revolta mulheres vítimas de violação
Em reação ao texto publicado na revista Trendr, várias vítimas de violação e outras mulheres recorreram a blogues, sites e redes sociais para expressar a sua revolta. Classificam o texto de “pateticamente romantizado” e afirmam que só consegue ficar indiferente quem nunca passou pela terrível experiência.

Uma das mulheres, que não se identifica, chega mesmo a contar que passou a noite a chorar depois de o ter lido. “Aperta o peito, vem o choro. Fumamos um cigarro, fazemos um chá. Tentamos passar por isso o melhor possível”, conta uma das vítimas.

E explica que decidiu escrever também um texto para todos aqueles que consideraram “maravilhosa a sensibilidade do sujeito”. “Eu não quero ler o que homens escrevem sobre como fizeram sexo com uma vítima de violação. Aliás, ninguém deveria querer. Que o nosso sofrimento não seja instrumentalizado por ninguém. E que nunca mais sejamos musas”, acrescenta.

Em comentários ao texto, publicado no site ‘Medium’, várias mulheres agradecem. “Obrigada por exteriorizar tudo o que estava engasgado em mim sobre esse texto” e “Eu agradeço-te, de verdade”, são alguns dos comentários deixados. Foram mais de 700 likes e mais de 60 comentários só para este texto.

Veja, na galeria de imagens acima, as frases mais marcantes dos dois textos: do homem que partilhou a experiência e de uma das vítimas de violação que se sentiu indignada.