Tudo o que precisa de saber sobre o copo menstrual

Já foi um objeto estranho e desconhecido por muitos. Mas, em 2019, não há quem não tenha ouvido falar do copo menstrual. Quem é utilizadora garante não querer voltar aos pensos higiénicos e tampões; já quem nunca usou, não esconde as suas hesitações. “Primeiro estranha-se e depois entranha-se, é mesmo o que costumamos dizer às nossas clientes”, diz Sofia Catarino, 37 anos, proprietária da loja ecológica Pegada Verde, de Torres Vedras, e utilizadora há mais de dez do copo menstrual.

Foi uma das primeiras a comercializá-lo, em 2009, e hoje confessa que há cada vez menos dúvidas por parte de quem o procura. “As pessoas estão mais bem informadas e interessadas, provavelmente também pela tendência saudável e da sustentabilidade”, explica. “Sinto que só nos últimos dois anos é que conseguimos chegar a uma faixa mais jovem. As mulheres a partir dos 35 anos eram as fiéis compradoras no início e tínhamos mais resistência das jovens, que hoje estão mais despertas”, nota Sofia, que é distribuidora em Portugal da marca Lunette.

Numa altura em que, todos os meses, abrem novos espaços vegetarianos e vegans com o selo da sustentabilidade em Portugal – das mercearias e lojas aos restaurantes – é impossível não trazer o copo para cima da mesa, mais uma vez. Afinal, o que é este produto que promete mais liberdade e saúde às mulheres?

 

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Copo Menstrual: o que é e onde nasceu?

A sua função não é absorver, como acontece com os tampões e dos pensos higiénicos, mas sim recolher o fluxo menstrual. A maioria dos copos menstruais vem ainda com uma haste, que ajuda no momento da remoção.

Ao contrário do que se possa pensar, o copo não nasceu no início do milénio. Nem na década de 80, quando várias marcas de higiene feminina relançaram o produto. Foi 50 anos antes, em 1937, que Leona Chalmers, uma atriz norte-americana, conseguiu patentear uma versão primária do que é hoje o copo menstrual. Mais tarde foi vendido a uma empresa que arrancou com a produção durante a Segunda Guerra Mundial.

Hoje os copos certificados são feitos com TPE (Elastómero Termoplástico, utilizado nas tetinas dos biberões) ou silicone cirúrgico/médico, sendo este último o mais habitual. “É o que se usa em articulações artificiais, em partes das válvulas mecânicas do coração. É muito resistente e está preparado para ser colocado no interior do nosso organismo e não se deteriorar”, diz Sofia Catarino, representante da marca finlandesa Lunette.

Benefícios

As razões não se prendem apenas com a sustentabilidade, mas podem começar por ela, até porque os números são impactantes. Com cerca de 450 menstruações ao longo da sua vida fértil, “cada mulher gasta, no total, 17 mil pensos e tampões”, conta Sofia Catarino da Lunette. Já a Organicup, outra marca orgânica nórdica, mais recente no mercado, refere que em dez anos uma mulher usará, em média, mais de 3600 mil produtos de higiene feminina. Um copo menstrual dura exatamente uma década. “Durante a vida inteira fértil se calhar nem se chega aos cinco copos, se forem bem cuidados”, vinca Sofia.

Para Isabel Girão, 55 anos, representante da marca alemã MeLuna, o copo menstrual é uma inevitabilidade, tal como foi o tampão, após o penso. “Estes absorventes demoram entre 100 a 400 anos a decompor-se e estamos só a falar das fibras”, explica, continuando: “Hoje em dia, nem os pensos nem os tampões são 100% algodão. São feitos de fibras sintéticas e libertam dioxinas que em contacto com o calor do corpo são potencialmente cancerígenas”. Na sua composição estão envolvidas fórmulas amaciadoras para tornar a fibra lisa e é ainda regular encontrar-se resíduos de lixívia e cloro para manter o branco imaculado dos tampões.

E o preço? Pode gerar algumas hesitações à primeira, mas a verdade é que o copo menstrual é uma alternativa mais económica do que os pensos e tampões, ficando pago em cerca de seis meses. Custa entre 20 a 24 euros, dependendo da marca e do local de compra. Mais uma vez, dura dez anos.

A liberdade é outra palavra-chave quando se fala de copos menstruais. Acabaram-se as idas de quatro em quatro horas à casa de banho para mudar o tampão, os nervos na praia, uma vez que este produto garante 12 horas sem fugas. É preciso limpar o copo apenas duas vezes por dia, de manhã, ao sair de casa, e no regresso. «É engraçado que quando usamos percebemos que a nossa ideia da quantidade de fluxo não é real. Um fluxo médio-moderado pode nem chegar para encher o copo durante o período da menstruação”, refere Elizabete da OrganiCup, lembrando que a higienização duas vezes ao dia é essencial. As correrias ao supermercado para reabastecer o stock terminam também, pois o copo está sempre disponível, em casa.

Por fim, a saúde. Alergias, irritações e até secura vaginal são algumas das desvantagens para quem usa tampões ou pensos. No caso do copo, não há proliferação de bactérias e microrganismos, precisamente por este se encontrar em vácuo no canal vaginal. “A partir do momento em que o sangue entra em contacto com o tampão ou o penso, este começa a oxidar. Só assim conseguimos também perceber verdadeiramente a cor do nosso período”, diz Isabel, da finlandesa Lunette.

Como escolher?

Maior ou menor, com ou sem cor, sem ou com haste – e que tipo de haste? Todas são questões válidas no momento de comprar o copo. E tudo se resume à preferência, fluxo e anatomia de cada mulher. No geral, os tamanhos menores (A ou S) são indicados a mulheres que ainda não estiveram grávidas e os maiores a mulheres que já foram mães. No entanto há exceções: uma mãe desportista, com os músculos pélvicos trabalhados e menos de 30 anos, facilmente pode usar um tamanho menor.

Algumas marcas com mais de dez anos são o espelho desta diversidade. A MeLuna, por exemplo, tem quatro tamanhos do S ao XL, modelos com maior ou diâmetro, uma panóplia de cores e de maleabilidade, além das pegas ou hastes, uma espécie de prolongamento do copo que ajuda a utilizadora a situar o copo no canal vaginal. Por sua vez, a Lunette faz-se valer só de dois modelos, igualmente com várias cores. A OrganiCup, mais recente, tem dois tamanhos para reduzir a confusão e um modelo transparente, uma opção que visa reforçar a mensagem de que a menstruação não tem de ser escondida.

Ainda não existe nenhum copo menstrual de marca portuguesa, no entanto o que não faltam são opções no mercado, em farmácias, parafarmácias, lojas bio, vegan e de alimentação e produtos orgânicos. Vale a pena estar atenta às certificações, nomeadamente a da FDA, a Food and Drug Administration dos Estados Unidos, que certifica estas três referências – veja onde pode comprá-las na fotogaleria acima.

Comprei e agora? Como colocar

Todos os copos menstruais vêm com as respetivas instruções, mas todas referem a posição mais adequada e o tipo de dobras. Dobras? Sim. “Quando colocamos um copo menstrual ele entra dobrado, não entra aberto”, diz Elizabete Gomes da OrganiCup. “Existe um mundo de dobras, a C é a mais conhecida e a mais fácil de fazer. Basta dobrar o copo e inserir. Mas existem outras: a sete, a tulipa e novas, como a ninja ou a estrela”. Fique a conhecer algumas.

Tal como a primeira experiência com o tampão, também a colocação do copo menstrual melhora com a prática. Há quem demore até três ciclos a adaptar-se, pelo que algumas marcas (a OrganiCup, sempre, e a Lunette, durante a campanha de agosto) fazem o reembolso, sem perguntas, se a cliente não se adaptar durante 90 dias. O importante é estar descontraída e começar por procurar a melhor posição, ou de cócoras (pode ser no banho) ou sentada na sanita, e até de pé, a quem preferir. Pode sempre usar um lubrificante à base de água ou molhar o produto para facilitar a introdução.

A grande diferença é que, claro, não há aplicador e os dedos têm mesmo de entrar com o copo dobrado no canal vaginal. “Quem usa tampão tem de esquecer um bocadinho a forma como o coloca. Porque a ideia mental que temos do nosso canal é que ele aponta para cima”, começa por explicar Elizabete, reforçando: “O nosso canal não é direto ao colo do útero. A partir da entrada da vagina ele desce em direção ao ânus, por isso quando o apontamos para o fundo das costas, ele encaixa perfeitamente”.

Isabel Girão, antiga desportista, sublinha ainda que este deve ficar muito mais baixo no canal vaginal, em comparação com um tampão com aplicador. “Quando ele chega ao sítio que deve ser colocado, os dedos abrem, o copo desfaz a dobra e vai ajustar-se ao canal”, conclui. Uma boa dica para perceber se está completamente aberto é ir colocando um dedo à volta do copo. Se não encontrar falhas ou dobras e não o sentir, conseguiu. Caso não, tente outra vez. “Se o sentimos, está mal colocado. A mulher só tem sensibilidade no terço inferior do canal vaginal, em cima não tem. E a sua base deve ficar quatro, cinco centímetros acima no canal vaginal, com a haste na pontinha, mas no interior”.

Dicas para remover

Relaxar, relaxar e relaxar é a palavra de ordem. Repetir a posição (cócoras ou sentada) e tentar alcançar a haste do copo. Não serve para puxar, mas sim para ajudar a situar a base do copo, que deve ser lentamente retirado, apertando ligeiramente um dos lados para libertar o vácuo e empurrando com movimentos pélvicos. Ao contrário do que se possa pensar, é raro o copo verter o fluxo. Depois, basta colocar na sanita, passar o copo por água na torneira e voltar a colocar.

Caso o copo suba no canal vaginal, não há motivos para preocupações, muito menos para idas ao médico, reforçam as entrevistadas. A lei da gravidade é soberana e com a ajuda de umas contrações pélvicas, este irá sempre sair.

Limpar e guardar

Mãos limpas, um tachinho próprio para ferver o copo menstrual durante dez minutos, no início e fim do ciclo, são os únicos requisitos. Há quem adicione ainda um pouco de bicarbonato de sódio para o ir branqueando. No final do ciclo, basta guardá-lo no saco próprio em que vem.

Cada marca tem os seus próprios produtos complementares que ajudam a higienizar o copo, como um sabonete líquido natural e sem cheiro, que pode servir para lavar o copo e as mãos, e ainda toalhitas que podem ajudar quem muda o copo fora de casa. Caso surja a necessidade de o trocar numa casa de banho pública, o segredo é despejar o fluxo para a sanita, levar uma garrafa de água, limpá-lo e voltar a inserir.

 

Pré-adolescentes menstruadas, também podem?

Sim. A MeLuna tem um modelo mais pequeno, para meninas com 12, 13 anos, que ainda não tiveram relações sexuais e não estão à vontade com o seu corpo. Pode vir inclusive com um fio para prender na haste e facilitar a remoção. Brevemente, a OrganiCup vai lançar também um modelo juvenil, mais pequeno.

E quem usa DIU ou anel vaginal?

É compatível, mas todas as marcas entrevistadas aconselham a consulta ou opinião de um ginecologista.

Corro o risco de Síndrome de Choque Tóxico?

O anúncio está em todas as embalagens de pensos higiénicos, tampões e nas marcas de copos menstruais mais cautelosas. O copo menstrual não retira a possibilidade de SCT, até porque este não afeta só mulheres, mas também homens e crianças. Trata-se de uma bactéria que está presente no nosso corpo e que pode produzir toxinas que conduzem a este Síndrome de Choque Tóxico. É muito rara, mas o risco pode ser reduzido com bons hábitos de higiene e respeitando o período máximo aconselhado por cada um destes produtos femininos.

 

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