Violação: Tribunal diz que falta de resistência física não é consentimento, pode ser sobrevivência

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O ‘não’, a oportunidade de fuga e a existência ou não de resistência da vítima são argumentos frequentemente usados em sede de defesa em casos de violação. O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a ausência de qualquer resistência física da vítima de violência sexual não pode ser considerada como uma forma de aceitação ou de consentimento da agressão. Para àquela instância, tal comportamento pode expressar o desejo de sobreviver, escreve-se no acórdão que é citado pela agência Lusa.

Uma sentença que vem confirmar, numa segunda instância, a pena de prisão de seis anos e seis meses aplicado a um arguido condenado em primeira instância por um crime de violação agravada.

A decisão, que teve como relatora a juíza desembargadora Teresa Féria, conclui que “a inexistência de qualquer reação ou resistência de uma vítima de violência sexual radica no facto de esta a sentir a agressão como uma ofensa à sua integridade física, ou mesmo à sua vida, pelo que adota um comportamento orientado para a sua preservação, podendo optar por diferentes estratégias de sobrevivência”.

O caso do filho de Ágata e a alegada violação nos Açores

Esta terça-feira, 18 de junho, era tornado público que Marco Carneira, filho da cantora Ágata, tinha visto a pena de seis anos e meio de prisão confirmada no Tribunal da Relação de Lisboa. Uma condenação em segunda instância que teve lugar após acusação e sentença de violação de uma menor, de 14 anos, nos Açores. O arguido tinha 38 anos.

Entre os factos alegados em primeira instância pela defesa de Caneira estava, avança a revista VIP, a oportunidade de a alegada vítima poder fugir, de o empurrar ou pontear. Ora, os magistrados consideraram que a menor não terá apresentado resistência e, na base desse comportamento, não está o consentimento, antes a sobrevivência.

Segundo refere o Correio da Manhã, a alegada violação terá tido lugar em Povoação, na Ilha de São Miguel, na festa popular na freguesia de Nossa Senhora dos Remédios.

Ágata tem vindo a defender o filho, que diz ser “incapaz” de ter cometido este crime. Em entrevista à TVI, a cantora considerou que “se não fosse o filho da Ágata, provavelmente não se teriam lembrado dele. Ele era incapaz, expuseram a vida dele de uma forma muito chocante”.

Tribunal cita razões psicológicas para a imobilidade

“Vítimas há em que o medo lhes impede a demonstração de qualquer reação, é a chamada imobilidade tónica, outras em que se opera uma dissociação da realidade, como se a agressão de que estão a ser vítimas não se passasse com elas e apenas estivessem a observá-la e outro grupo de vítimas decide não resistir para evitar ferimentos ou morte”, salienta o acórdão.

Outra consideração que resulta da decisão proferida na passada quarta-feira, 12 de junho, refere que “a prática de um crime de violação não está relacionada com o desejo sexual, nem resulta de qualquer impulso sexual irresistível, mas antes constitui apenas e tão só uma afirmação de poder do agressor sobre a sua vítima“.

O acórdão adianta que está hoje estabelecido pela Psicologia que a ausência de resistência física por parte da vítima não pode ser considerada como uma forma de aceitação ou de consentimento da agressão, mas, pelo contrário, “expressa apenas o desejo de sobreviver a uma situação cujo controlo não detém e relativamente à qual experimenta um sentimento de completa impotência”.

Assim – prossegue o acórdão – “tal como num vulgar crime de roubo, a não manifestação pela vítima de qualquer reação à agressão não é nunca entendida como consentimento”, o mesmo deve suceder no crime de violação.

“Considera-se que a pena fixada se mostra justa, adequada e corretamente fixada, tendo em atenção os fins de prevenção geral e especial que lhe são estabelecidos“.

Este caso de violação contou, durante a fase inicial do processo, com depoimentos para memória futura da ofendida, prestados em novembro de 2017, e que foram considerados fundamental para a convicção do tribunal na determinação da matéria de facto.

CB com Lusa

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