Se, em 1991, dissessem à atriz Demi Moore, à fotógrafa Annie Leibovitz e à diretora da revista Vanity Fair, Tina Brown, que as fotografias de celebridades grávidas nuas seriam uma realidade banal em 2018.
A icónica capa da Vanity Fair, considerada uma das fotografias mais influentes de sempre, para a Time, estava longe de ser a que acabou por ficar nas bancas e para tendência futura.
Em maio deste ano, a estação americana CNBC reconstitui a história dessa edição da revista, que daria que falar em todo mundo, por ser a primeira do género com impacto global. Nela, Demi Moore, na altura com 29 anos, aparece nua, grávida de sete meses do seu segundo filho, com o ator Bruce Willis. A imagem foi pioneira e revolucionária, tornando-se numa referência e inaugurando uma tendência que várias celebridades femininas viriam a imitar durante as suas gravidezes, nessa e noutras publicações semelhantes. Mas nada o fazia prever.
A ideia era fotografar Demi Moore num vestido justo que salientasse a barriga, numa época em que as estrelas de cinema grávidas, que se deixavam fotografar nessa fase da sua vida, apareciam apenas fotografadas do peito para cima.
O vestido justo era, por isso, já um ato de rebeldia, movido, na altura, e em parte, pelo facto de Tina Brown também ter tido o seu segundo filho pouco tempo antes e de querer que a sessão marcasse uma certa viragem estética e de abordagem entre décadas.
“Estava à procura de uma capa que, de certa forma, mudasse o tom dos anos 80 para o novo espírito dos 90, para uma era ligeiramente mais fresca”, contou à CNBC.
Quando a conceituada fotógrafa Annie Leibovitz – conhecida, entre outros trabalhos, pela capa da Rolling Stone, com John Lennon nu na cama com a mulher ,Yoko Ono – lhe apresentou as imagens da sessão com Demi Moore, estas respondiam ao que tinha sido pedido: a atriz num vestido de justo. Mas havia outra que não fazia parte do trabalho para a revista e que Leibovitz tinha feito para o então casal Demi e Bruce.
“E eu disse-lhe, ‘então, mostra-mas’ e quando vi a fotografia da Demi, nua e grávida, em toda a sua glória, disse, ‘Annie, temos de ter isto na capa. Nesta capa”.
Depois de obtida a autorização da atriz para a publicação da fotografia, a Vanity Fair lançava em agosto de 1991 a célebre imagem. Mas as reações não foram consensuais e o pioneirismo da ideia não foi aceite por todos.
O gigante Walmart recusou-se a vender os exemplares dessa edição nos seus estabelecimentos, considerando a capa “indecente”, recordou Tina Brown. Mesmo assim, a edição foi um sucesso e a revista vendeu 1.2 milhão de cópias, um valor significativamente acima da sua circulação média de 800 mil exemplares.
“Penso que fizemos algum grandioso pelas mulheres com essa capa. É uma das coisas que mais me orgulho de ter feito pelas mulheres, porque realmente libertou as mulheres da roupa da maternidade. E também libertou as mulheres da noção de que a maternidade era algo que devia estar tapado.”
Seguiram-se outras capas do género com outras celebridades: Cindy Crawford, na W Magazine, em 1999, Britney Spears, na capa da Harper’s Bazar, em 2006, Christina Aguilera, na Marie Claire, em 2007, Claudia Schiffer, na Vogue alemã, em 2010, Mariah Carey, na revista Life&Style, em 2011, e, mais recentemente, Serena Williams, na Vanity Fair, em 2017. Veja as capas na galeria, em cima.
“A partir dessa altura, as famosas que engravidavam queriam todas fotografias como as da Demi Moore. Recentemente, houve outra capa do género na Vanity Fair, com a Serena Williams grávida e nua, porque as grávidas famosas querem expressar o seu rito de passagem, ‘eu quero a minha capa à Demi Moore’”, analisou Tina Brown, na reportagem da CNBC.
A capa portuguesa com Joana Amaral Dias
Em Portugal, a ex-deputada Joana Amaral Dias protagonizou uma capa semelhante, na revista Cristina, em setembro de 2015.
Candidata, na altura, pelo movimento político Agir às eleições legislativas desse ano, a exposição mediática do seu corpo, e em plena campanha eleitoral, não foi bem acolhida por vários setores, com a muitos a considerarem-na um aproveitamento político.
Em entrevista recente a Rui Unas, no programa Maluco Beleza, Joana Amaral Dias lembrou que antes da capa já tinha sido “acusada de instrumentalizar a gravidez”. Mas a sessão fotográfica para a revista de Cristina Ferreira aumentou ainda mais o coro de críticas. Uma decisão que não se arrepende de ter tomado.
“Nunca houve em momento algum de reservas e dúvidas em relação a essa exposição”, afirmou. E para a política, a polémica foi maior porque se trata do corpo da mulher, comparando com as várias ocasiões em que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, surge em público, em calções de banho. “Então o Marcelo Rebelo Sousa anda a mergulhar no Rio Tejo há 77 anos e nunca ninguém o vê nu? E é Presidente da República. Que representações são essas do corpo da mulher e do corpo do homem? Porque é que continuam a ser tão diferentes?”, questionou.
Atualmente, são várias a figuras públicas portuguesas, sobretudo da área da representação, televisão e moda que expõem sem complexo a sua nudez durante a gravidez. O caso mais recente é o de Rita Pereira, que fez uma sessão fotográfica aos nove meses de gestação e publicou algumas das imagens nas suas redes sociais.
Rita Pereira despe-se em sessão fotográfica para celebrar gravidez