Certificado de perda gestacional antes das 24 semanas criado no Reino Unido

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[Fotografia: pexels/Puwadon Sangnern]

O reconhecimento da perda de um bebé ainda na primeira metade da gestação é um dos motivos que levou a Inglaterra a criar o certificado de perda gestacional para bebés que sucumbiram diante de um aborto espontâneo antes das 24 semanas. Importante vincar que este processo não tem quaisquer custos e é absolutamente opcional.

A criação desde documento, que já está disponível para ser obtido desde quinta-feira, 22 de fevereiro, às nove da manhã, no site do governo britânico, surgiu após anos de conversas entre governantes e pais enlutados que queriam ver publicamente reconhecida a existência de um filho que não tenha sobrevivido.

Citada no comunicado do executivo, onde é mostrado o link para o pedido de certificado (e que pode consultar no original aqui), a ministra para Estratégia de Saúde da Mulher, Maria Caulfield, detalhou que os “certificados de perda de bebés visam reconhecer a perda”, um passo que se inscreve, refere a governante, num “plano mais amplo a longo prazo para a saúde das mulheres no país, a Estratégia de Saúde da Mulher”. “Gostaria de agradecer ao trabalho incansável dos ativistas e das instituições de caridade pelo seu trabalho no apoio a esta agenda e na concretização dos certificados”, acrescentou Maria Caulfield.

Ouvida pela estação pública britânica BBC, Cate Poolton, 41 anos, de Warwickshire, mãe de dois filhos, mas que já tinha sofrido duas perdas gestacionais, considera que estes certificados vêm responder a uma longa de luta travada por mães e pais enlutados. “Não importa há quanto tempo estava grávida, é sempre um bebé que se perde, e este pedaço de papel prova que ele existiu”, afirmou, considerando que esta iniciativa irá fazer com que “as pessoas falem sobre o que passaram”. Afinal, como detalha, “leva muito tempo a processar e a recuperar da perda de um bebé”.

No Reino Unido, os bebés que nascem sem vida após as 24 semanas de gestação são considerados nadosmortos e ficam com registo oficial do óbito. Porém, o mesmo não acontece com os fetos que chegaram a esse ponto da gravidez. Recorde-se que, segundo dados citados pela BBC, a perda da gravidez ou aborto espontâneo antes das 24 semanas é uma das complicação mais comuns na gestação, tocando uma em cada cinco mulheres britânicas.

Para lá desta iniciativa, a ministra para Estratégia de Saúde da Mulher anunciou que “para garantir que todas as mulheres obtenham o apoio de que necessitam, o governo está a investir 25 milhões de libras em centros de saúde da mulher” tendo em vista a um “acesso mais fácil a serviços essenciais de saúde menstrual, contraceção, dores pélvicas, cuidados na menopausa e muito mais”, lê-se no comunicado.

 

Por cá e de acordo com alterações ao Código do Trabalho, de 2023, os trabalhadores que sofram uma perda gestacional têm direito a estarem ausentes três dias consecutivos. No caso da mãe, esta situação entre em vigor caso não esteja já abrangida pela licença por interrupção da gravidez, até 30 dias.

Recentemente, duas mães que passaram por uma perda gestacional e neonatal lançaram um projeto para apoiar outras mulheres que, pelas mesmas circunstâncias, ficaram sem colo para dar e sensibilizar as famílias, bem como os profissionais de saúde.

“Ser mãe é mais do que dar à luz, ser mãe é amar mesmo de colo vazio”, afirmou em outro de ano passado Suzy Pinho Pereira, especialista em psicologia da gravidez e parentalidade positiva, destacando ser esta a frase que retrata as mães que passam por perdas gestacionais e neonatais.

A psicóloga, também formada em luto, integra o projeto Amor para além da Lua, desstacou a importância de se abordar um tema que, segundo estima a Organização Mundial de Saúde (OMS) afeta anualmente 43 milhões de mulheres, mas que em Portugal “ainda é tabu”.

A falta de informação em Portugal sobre a morte de um bebé ‘in utero’ ou a interrupção médica da gravidez levaram-nas a lançar uma plataforma com toda a informação sobre o “antes, durante e depois da perda”, que se debruça não só sobre os direitos, mas também sobre as memórias que as mães e pais podem guardar.

“Houve um casal que chegou até nós que me deixou muito sensibilizada porque, ao contrário de mim, a mãe já tinha lido a informação na nossa página, foi preparada e guardou memórias”, adiantou.

A importância de recordar o bebé levou-as as criar “caixas de memórias”, compostas por peluches, velas, mantas, certificado de vida, uma moldura, uma folha para guardar as impressões das mãos e dos pés do bebe, mas também um folheto informativo sobre a perda.