Incêndios: “Daqui a cinco anos vai ser pior”

Passo hoje na mesma estrada [na nacional 236] e já leva vegetação tão alta ao fim de um ano… se calhar já leva um metro de altura“. A constatação, em jeito de desabafo, é de Filipa Rodrigues, a bombeira voluntária de Castanheira de Pera, 25 anos, que ia perdendo a vida a combater as chamas naquele fatídico 17 de junho de 2017, em Pedrógão Grande.

Uma declaração feita em modo de alerta por esta mulher, que volta a temer o futuro das suas gentes e da terra onde vive. “Agora, arde tudo outra vez quando vier o verão… Se assim for, não vai atingir as proporções do ano passado porque não tem hoje a vegetação que tinha“, analisa.

Contudo, Filipa não duvida de que se nada de consistente for feito, a tragédia vai voltar ao pinhal interior e em maior dimensão. “Daqui a cinco anos vai ser pior”. E lamenta: “Eles [os responsáveis políticos] vêm inaugurar as casa, mas não veem a vegetação que está a crescer à volta.”

“Se a pessoa não limpa os terrenos ou é porque não pode, porque a idade e a saúde não permitem, ou é porque não tem dinheiro para isso”

E porquê? Porque as obrigações de limpeza dos terrenos, com multas associadas, não são garantia absoluta para o fim do problema. “São medidas de fachada“, reitera a bombeira. “Nem toda a gente tem a capacidade para fazer as limpezas que exigem. Se a pessoa não limpa ou é porque não pode, porque a idade e a saúde não permitem, ou é porque não tem dinheiro para isso, não tem condições. Se não paga a multa é porque não tem dinheiro para mandar limpar“, argumenta, lembrando que os terrenos dificilmente ficam limpos bastando que o façam uma vez por ano.

Na galeria acima, releia e recorde o testemunho deixado por Filipa Rodrigues ao Delas.pt

Falta gente no terreno que sabe do terreno…

A profissionalização dos bombeiros é outra realidade que preocupa esta voluntária, de 25 anos de idade, sete dos quais passados a fazer frente às chamas. “Nós, voluntários, já não chegamos para isto. Hoje pergunto-me: ‘Onde é que estavam os profissionais…'” E lembra que incêndios desta natureza – e até mais pequenos – não “se combatem com um jipe e uma sacola”.

Por isso, Filipa lembra que é importante que a informação, mais do que vir de um nível superior, deve incluir e ouvir todos. “Todos estamos abertos ao conhecimento. Quando fazemos as coisas, damos o nosso tempo pela vida e pelo país, queremos fazer bem. Mas, se calhar, o senhor de Lisboa, da Proteção Civil e que nem sequer cá pôs os pés, não conhece a área como nós, não sabe que, durante o resto do ano, andamos pela mata a reconhecer o terreno, com mapas na mão e a ver que no sítio onde está desenhada uma estrada, estão agora, na realidade, eucaliptos e mimosas.”

Imagem de destaque: Rui Oliveira/Global Imagens

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