“Este referendo é ilegal, mas não podemos deixar que nos neguem o voto”

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People carry a Spanish flag during a demonstration in favour of a unified Spain a day before the banned October 1 independence referendum, in Barcelona, Spain, September 30, 2017. REUTERS/Yves Herman TPX IMAGES OF THE DAY - RC1D2C5B6800

A Mafalda, tem 26 anos e mora em Barcelona há dois anos, hoje faz de metro e a pé o percurso de Barceloneta até casa de uns amigos para almoçar, passa pela Gran Via e está tudo calmo, sem muitas pessoas na rua, nem confusões. Um cenário que não faz desconfiar ninguém de que hoje é o dia em que a Catalunha está a votar pela independência num referendo proibido por Madrid.

As tensões começaram pela manhã nos colégios de voto que foram encerrados, levando a população a protestos e resistência, que apesar de aparentar ser pacífica na maioria dos casos, já levou a algumas detenções e vários feridos. Mas nas ruas nenhum sinal desta agitação: “está tudo calmo, nem vejo polícia aqui, mas também penso que não há nenhuma escola nesta zona. Mas nas ruas, no metro, em Barceloneta e aqui na Gran Via está muito tranquilo”, contou-nos Mafalda Fonseca enquanto caminhava pelas ruas de Barcelona.

Cenário que tem sido o mais frequente, pelo menos para esta portuguesa que trabalha perto das Ramblas e que apenas notou alguma agitação há cerca de uma semana e meia, quando às dez da noite começaram a ser batidas panelas, em forma de protesto pacífico. ” As panelas são batidas para as pessoas se manifestarem por não poderem dizer aquilo que querem, por não poderem fazer o referendo. Todos os dias das dez às dez e um quarto da noite vão à janela bater panelas, para mostrar que querem ter liberdade de expressão e que querem falar e querem puder dizer sim ou não à independência.” explicou ao Delas.pt

Mafalda revelou-nos ainda que do que pode observar no seu grupo de amigos catalães, composto por diferentes posições políticas é que o sentimento geral é que “não têm o direito de falar. Na minha opinião a situação não devia ter chegado a um referendo. Devia ter havido diálogo entre os dois governos. Os catalães querem ter o direito a falar e dizer porque é que não estão contentes com a situação. Até os independentistas dizem que a independência é uma utopia, mas querem ter o direito a mudar as coisas porque sentem que dão muito mais a Espanha do que aquilo que recebem.”

A proibição do Governo Central à realização do referendo tem sido muito contestada, levando alguns catalães que tinham uma posição neutra a dirigirem-se às urnas esta manhã. Foi o caso da amiga com quem a jovem portuguesa se vai encontrar para almoçar “a minha amiga tentou ir votar às nove, mas os sistemas não estavam a funcionar porque ontem invadiram o edifício das telecomunicações da Catalunha e hoje houve problemas para conseguir retomar o sistema. Ela esteve lá uma hora, mas estava muita gente e não conseguiu votar, vai tentar votar à tarde. Ela disse-me que estava muita gente mas estava tudo muito pacífico. Ela não ia votar mas com o que se tem passado nas últimas semanas ela decidiu ir, e o mesmo aconteceu com muita gente aqui porque sentem que não os deixam falar, que isto não é bem uma democracia.

A catalã de quem Mafalda nos falou, tem 29 anos, não se quis identificar mas aceitou falar com Delas.pt, revelando-nos que ” o que se passa hoje em Barcelona é uma petição pacífica de democracia, o que pedimos é para poder votar. Não estamos a pedir ser independentes, estamos a pedir que se cumpra o direito de uma democracia que é votar. Por isso as pessoas estão nas escolas para que elas não fechem. Obviamente entendemos que este referendo não é legal, não está aprovado pelo Governo Central por isso não é legal. Mas apesar disso não podemos deixar que nos neguem o direito de votar. Não quero a independência, quero uma mudança na economia catalã juntamente com a espanhola. Isto não quer dizer que toda a gente que vai hoje às escolas queira a independência, querem votar, querem poder decidir o que querem para o seu país.”

Apesar de se sentirem tensões em Barcelona sobretudo hoje, devido à intervenção policial, nenhuma destas duas jovens acha que exista a possibilidade de uma guerra civil, reconhecendo que é preciso agir com cuidado mas acreditando que os conflitos serão controlados sem maior gravidade.

Sair da Catalunha não é uma opção para esta portuguesa que vive pela terceira vez em Barcelona, depois de já ter morado nos Emirados Árabes e na Grécia “Nem pensei em sair da Catalunha. Sempre me senti muito bem recebida aqui e tenho muita qualidade de vida e oportunidades em Barcelona”.


Veja ainda como os cravos marcaram as manifestações na Catalunha.


Margarida Brito Paes

Imagem de destaque: Reuters